Cristiane Gercina / Da Folhapress
As mudanças na pensão por morte do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) feitas pela reforma da Previdência de 2019 podem ser revistas pelo Ministério da Previdência Social, segundo o ministro Carlos Lupi.
Um grupo de trabalho do ministério estuda alterações na emenda constitucional 103, de novembro de 2019, e deve apresentar os primeiros resultados em 2024, afirmou Lupi em entrevista ao programa Bom dia, Ministro na manhã desta quarta-feira (22).
“Nós queremos discutir o que foi essa reforma e ver os pontos que precisam ser corrigidos para não piorar cada vez mais o sofrimento do povo brasileiro. Isso deve acontecer no próximo”, disse Lupi.
O foco principal é o cálculo da pensão, que sofreu redução e 40% com a reforma de 2019. A nova regra, no entanto, foi validada pelo STF (Supremo Tribunal Federal) em julgamento neste ano. Os ministros consideraram que as alterações no benefício são constitucionais ao julgar uma ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade).
A pensão por morte paga hoje uma cota familiar de 50% sobre o benefício do segurado que morreu, caso ele estivesse aposentado, ou sobre a aposentadoria por invalidez a que ele teria direito, mais 10% por dependente, até o limite de 100%. Antes da reforma, a pensão correspondia a 100% do benefício.
Uma viúva sem filhos recebe 60% e esse exemplo foi usado por Lupi para explicar o motivo de debaterem o tema no ministério.
“Eu dou um exemplo prático. Você, uma dama, se o seu parceiro morre amanhã você vai receber 60% da renda dele. Eu pergunto: é justo isso? Eu quero discutir isso, eu quero discutir se a Previdência Social é apenas um número frio, se ela não está lidando com o ser humano, com vida, com distribuição de renda”, afirmou.
O ministro não deu mais detalhes do que pode se revisto, mas disse que os pontos em debate devem ser levados ao Conselho Nacional da Previdência Social, hoje composto por representantes do governo, dos trabalhadores e de empregadores.
Na entrevista, Lupi prometeu para 2024 a implantação da teleperícia, que será a realização de exames periciais online, por meio de consultas por celular ou computador, conforme lei sancionada na semana passada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
A medida enfrenta resistência dos peritos médicos, que a chamam de ilegal e afirmam haver maior probabilidade de fraudes ou erros nos diagnósticos, resultando em negativas ou concessões indevidas.
“A telemedicina é o mecanismo que vamos usar a partir do ano que vem, o mais moderno do mundo. Com a pandemia a telemedicina foi uma luz para salvar muitos e muitos cidadãos no mundo todo.”
Na teleperícia, o perito médico poderá atender o segurado por meio de uma central, que será a própria agência do INSS, e fazer a avaliação online, em consulta por computador ou no celular. Se entender que há o direito do benefício por incapacidade, é feita a liberação.
“Esse é um mecanismo que veio para ficar”, afirmou.
FILA DO INSS
Sobre a fila do INSS, hoje com 1,635 milhão de segurados à espera do benefício, Lupi disse que a meta é reduzir a maioria dos pedidos para uma espera de até 45 dias, conforme prevê a lei. Ele citou algumas medidas adotadas pelo ministério, como o envio de atestado médico pelo Atestmed para liberação do auxílio-doença sem necessidade de exame presencial.
O ministro culpou a gestão anterior pelo número de segurados na fila, disse que hoje entram cerca de 900 mil a 1 milhão de pedidos de aposentadorias e pensões todos os meses no INSS e afirmou que a redução no quadro de funcionários tem prejudicado o andamento das análises.
Números apresentados por ele mostram diminuição de 50% no total de servidores administrativos e de peritos em cerca de 20 anos. Em 2003, no primeiro mandato de Lula, eram 40 mil administrativos e 7.500 peritos médicos, hoje, há cerca de 20 mil e 3.500, respectivamente, disse ele o ministro.
Lupi disse que pretende convocar em 2024 parte do cadastro de reserva de 1.800 aprovados no último concurso público, realizado em 2022. Segundo ele, ao todo, já foram contratados 1.250 novos servidores para o INSS.
“Já chamamos 1.250 concursados para iniciar. Ainda tem cerca de 1.800 neste cadastro de reserva. Só posso começar a mexer nisso a partir do ano que vem.”
Concurso para peritos – O concurso para peritos médicos deverão ter entre 650 ou 660 vagas, segundo Lupi, e deve ser feito no primeiro semestre do ano que vem. As chances, no entanto, serão destinadas a médicos em localidades longe das capitais, para suprir o déficit.
Segundo ele, no entanto, haverá uma trava para transferências, de no mínimo dez anos. Essa será uma forma de fazer o profissional ficar estabelecido na localidade escolhida, já que muitos prestam concurso indicando ter intenção de assumir em cidades menores, mas pedem transferência para capitais assim que possível.
“Quem fizer concurso da Previdência vai ter que ficar pelo menos dez anos no seu órgão. Ser médico é um sacerdócio. No processo da qualificação vai constar a necessidade do período que esse médico perito terá de ficar.”
Consignado – O ministro abordou as alterações nas taxas de juros do crédito consignado, que passaram ao menos por quatro mudanças neste ano. Três delas para reduzir o percentual cobrado. Segundo ele, as alterações nos juros do consignado lhe renderam inimigos.
“Quando eu entrei, estava 2,17% e hoje está 1,84%. Sei que ganhei muito inimigo poderoso quando eu baixo a taxa, mas a minha vida é luta. Deus protege quem gosta de pobre, eu gosto de pobre.”
Os juros do consignado têm caído quando há queda na Selic (taxa básica de juros da economia), o que desagrada quem trabalha com a modalidade.
O ministro afirmou, no entanto, que pode haver nova redução, mas não explicou se a queda será feita por meio do Conselho de Previdência ou se poderá cair ainda mais nos bancos, já que hoje há instituições cobrando juros de 1,45% ao mês, segundo ele.
Os bancos afirmam que, como a margem de lucro é pequena, o crédito tem sido reduzido, com menor oferta e mudança no perfil de liberações, deixando mais aposentados sem acesso.
Para Lupi, mesmo com juros mais baixos, é preciso ter cuidado ao fazer esse tipo de empréstimo. “Eu acho que o consignado passou a ser um instrumento para muita gente que conta com isso como renda; muita gente se ilude. Não tem ideia de que dinheiro fácil é muitas vezes o mais difícil.”
Reforma da Previdência – Questionado se uma nova reforma da Previdência poderia ser feita, o ministro afirmou que grupo de trabalho do ministério estuda mudanças na atual, mas seriam pontuais, e tem consciência de que alterações devem passar pelo Congresso.
Segundo ele, reformar para conter déficit não está nos planos do ministério, e criticou a forma como o déficit previdenciário é tratado.
“Sabe para mim o que é déficit? Sonegação. São trilhões que não foram pagos ao longo dos anos, que está no Supremo Tribunal Federal, e que ninguém consegue receber”, disse.
“Vamos discutir as isenções. O por que das isenções, quem recebe as isenções, quais as isenções previdenciárias e, principalmente, qual o resultado das isenções para a sociedade?”