REINALDO SILVA – reinaldo@diariodonoroeste.com.br
“Chegamos a Petra, na Jordânia, e estava sendo gravada a novela “Viver a vida”. Vi que tinha gente conhecida, mas, como não sou um grande seguidor de novelas, fiquei meio assim… Olhei para a mulher: ‘conheço, parece que é atriz’. Me aproximei, cumprimentei, conversamos e ela foi muito simpática. Estava indo tudo bem, mas quando fui me despedir, [disse:] ‘muito obrigado, Isabel Fillardis’. Era a Taís Araújo.”
Contada entre risos, a situação inusitada, divertida, tem lugar especial entre as lembranças de Cláudio Miguel de Souza, aposentado de 66 anos de idade, que já esteve em 101 países. (A Organização das Nações Unidas reconhece oficialmente 193.)
Claudinho, como é carinhosamente chamado, abriu as portas de casa, no Jardim Santos Dumont, em Paranavaí, para a equipe do Diário do Noroeste e falou de algumas experiências que teve pelo mundo. “Se eu fosse contar tudo, ficaríamos aqui o dia inteiro.” Olha, a ideia não seria ruim.
Na estante da sala, ele exibe dezenas de itens que adquiriu durante as viagens. Os mais recentes vieram da Grécia, mas também há objetos da Índia, da China, da Costa Rica e de outras nações africanas, americanas e europeias.
A cozinha revela outro costume de Claudinho, comprar ímãs de geladeira que estampam bandeiras e brasões dos países. As portas do eletrodoméstico expõem símbolos da Inglaterra, da Turquia, de Cuba e até da Síria, só para citar alguns exemplos.
Cada peça contém memórias, e o viajante não se furta dos detalhes. Fala das paisagens, das construções históricas, das refeições inusitadas, dos companheiros de viagens e, como não poderia ser diferente, dos perrengues.
Os relatos são repletos de observações bem-humoradas – aliás, bom humor é uma das marcas registradas de Claudinho. Pode perguntar para quem quiser.
Questiono como a jornada pelo mundo começou e a reposta sai com o conhecido tom de brincadeira. “Começou assim: em 1957 eu nasci no Brasil, já ‘matei’ um país aí.”
A primeira viagem internacional aconteceu aos 18 anos, em 1975, quando foi com o irmão para Assunção, capital do Paraguai. “O primeiro país estrangeiro em que dirigi, praticamente sem experiência. Naquele tempo era uma aventura. Meu irmão quase infartou (risos).”
Claudinho calcula que já tenha conduzido algum tipo de veículo automotor em 40, talvez 50 países, inclusive alguns de mão inglesa, “o que é um risco danado, porque sua cabeça pensa de uma maneira e você tem que fazer de outra – na rotatória você entra pelo lado contrário, sempre”.
Em tempo de guerra – Em 1982, esteve na Argentina. Chegou no dia 2 de abril, data que marcou oficialmente o início da Guerra das Malvinas, uma disputa de território entre argentinos e ingleses. O sentimento de amor à pátria ululava pelas ruas, as pessoas empunhavam bandeiras e cantavam o hino nacional.
Foi um sufoco. Não pelo conflito em si, mas em razão da preferência dos argentinos pelo dólar estadunidense ao cruzeiro brasileiro. “A informação que nós tínhamos, e era assim até dois dias antes, é que você podia pagar em qualquer lugar com dinheiro brasileiro. Tivemos certa dificuldade. As pessoas não queriam dinheiro brasileiro, queriam dólar, pois sabem que é uma moeda forte.”
A Guerra das Malvinas terminou em 14 de junho de 1982 com a vitória do Reino Unido – e Claudinho deixou a Argentina, ileso.
Objetivo cumprido – Com o tempo, viajou ao México, aos Estados Unidos, a países da Europa. Queria conhecer, mas sem metas estabelecidas, até que, em 2006, foi personagem de reportagem publicada em uma revista de Paranavaí. À época a lista tinha 53 países. Estabeleceu, então, um objetivo: chegar à marca de 100 até o ano de 2020.
A proposta audaciosa foi comprometida pela pandemia de Covid-19, que interrompeu os passeios por três anos. Com a situação sanitária global normalizada, Claudinho retomou o projeto em 2023 e chegou à marca de 101 países. Objetivo cumprido.
Maravilhas do mundo – Você certamente ouviu falar das sete maravilhas do mundo antigo, lugares com grande relevância para a história da humanidade. Trata-se de construções arquitetônicas e artistas, erguidas durante a Antiguidade Clássica.
Claudinho conheceu todas: Grande Pirâmide de Gizé, Jardins Suspensos da Babilônia, Estátua de Zeus em Olímpia, Templo de Ártemis em Éfeso, Mausoléu de Halicarnasso, Colosso de Rodes e Farol de Alexandria.
O mundo moderno também conta com sete maravilhas, todas visitadas por Claudinho: Cristo Redentor no Brasil, Grande Muralha da China, Taj Mahal na Índia, Machu Picchu no Peru, Chichén Itzá no México, Coliseu na Itália e Ruínas de Petra na Jordânia.
Belezas sem fim – Os países por onde passou reúnem cenários deslumbrantes, naturais ou construídos pelas mãos humanas. Claudinho deu detalhes que preencheriam páginas e mais páginas com histórias pitorescas e divertidas. Mesmo assim, garantiu, “não contei nem um por cento”.
Pincelamos alguns relatos que aguçam a imaginação e motivam a buscar informações e imagens disponíveis pelo vasto mundo da internet.
A Baía de Kotor, em Montenegro, é um fiorde entre montanhas, com mar azul, navios atracados, umas casinhas brancas. “Impressionante.”
Na Croácia, os lagos verdes. Nas montanhas do Tibete, a neve caindo. No Havaí, o vulcão mais ativo do mundo, o Kilauea. Na Islândia, o primeiro gêiser do mundo. No Camboja, o ritual de oferenda de alimentos para os monges.
Durante o safári fotográfico pela África, Claudinho se deparou com os big five, assim chamados os cinco grandes animais que habitam aquela região: leão, leopardo, rinoceronte, elefante e búfalo. Aliás, contou Claudinho, “o búfalo é o bicho que eles [os africanos] mais têm medo. Chamam de morte negra”.
Refeições inusitadas – Pergunto quais foram as refeições, digamos, mais diferentes que já teve. “A comida mais estranha foi escorpião, na China, e bicho da seda – não a lagarta, mas a casinha dele –, também na China.” Também teve o espetinho de austin, na Noruega.
E por falar em alimentação, sente-se, que lá vem história. “No Marrocos comi alguma coisa que não me fez bem.” Aqui usarei um eufemismo para falar do resultado: o sistema digestivo de Claudinho desandou. “A sorte é que eu estava no palácio de um sultão que tinha 50 banheiros (risos). Graças a Deus.”
Um peixe cru ingerido na Bolívia, quando visitou o Lago Titicaca, rendeu a Claudinho uma grave infecção alimentar. Passou mal durante quatro dias e recebeu os cuidados e a atenção dos companheiros de viagem.
Amigos – Ao longo dessa trajetória, conheceu pessoas com quem ainda mantém contato. É o caso da mexicana Diana, que encontrou em uma viagem à Índia, e do português Rafael, na Grécia. “Ficamos muito amigos.”
As novas amizades se somam às mais antigas. Claudinho fez questão de citar companheiros e companheiras com quem compartilhou tantas aventuras pelo mundo: Joana e Elvira (de Maringá), César e Jorge (do Rio Grande do Sul), Geralda (de Pernambuco), Cláudio e Heydi (de Umuarama) e os participantes do grupo Arretados do Iceberg, nome escolhido para um grupo de brasileiros que se encontraram na Groelândia. Há também homenagem póstuma aos saudosos amigos Mário e Clelci.
Não há limites – Claudinho garantiu que as viagens – tanto internacionais quanto nacionais – continuam nos planos de vida. Não há limites para quem sonha. E não há sonhos impossíveis para quem quer e faz valer a pena.
A próxima viagem de Claudinho deve acontecer ainda este ano. A dúvida é o destino: conhecer a Oceania e visitar a Nova Zelândia ou voltar à Ásia e fazer escalas em Taiwan, Cingapura e Butão? Os detalhes estão sendo discutidos com os amigos.
Observação – Ah! A novela “Viver a vida”, citada no comecinho desta matéria, foi exibida pela Rede Globo de setembro de 2009 a maio de 2010. No elenco também estava o ator Thiago Lacerda, que pediu a bandeira do Brasil emprestada a Claudinho para fazer uma foto com a equipe de produção – e o nosso viajante, claro, também está na imagem.
Sobre a Isabel Fillardis, quero dizer, Taís Araújo, Claudinho contou que um amigo chamou a atenção dele para a gafe, ao confundir os dois nomes: “Você errou”. Esse amigo, então, se aproximou de Taís Araújo e conversou com ela, que riu da situação e completou: “Ainda bem que a Isabel é amiga minha”.
Tive o prazer de conhecer essa figura na Grécia. Grande companhia para viajar. Rimos muito. Siga sempre em frente. Bj