CIBELE CHACON – Da Redação
Em um cenário muitas vezes negligenciado pela sociedade, onde montanhas de resíduos desafiam a natureza e a sustentabilidade, um grupo de mulheres faz a diferença em Paranavaí. Na Coopervaí (Cooperativa de Seleção de Materiais Recicláveis e Prestação de Serviços de Paranavaí), elas não transformam apenas materiais descartados em recursos valiosos, mas também suas próprias vidas.
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Fundada em 2003, a cooperativa tem sido uma luz brilhante na luta pela preservação ambiental e inclusão social. Mas é o trabalho árduo e a dedicação dessas mulheres que merecem destaque, especialmente em uma indústria onde poucos desejam atuar.
Com uma força de trabalho composta por 40 funcionários, sendo metade mulheres, a cooperativa se tornou um símbolo de resiliência e determinação feminina. Entre elas está Rosimeire Martins de Melo, de 42 anos, que há uma década iniciou sua jornada nesse local e, hoje, compartilha a experiência com suas duas filhas mais velhas, que também se juntaram à equipe.
Meire, como é carinhosamente chamada pelas companheiras de trabalho, é uma mulher de força e superação. “Eu era alcoólatra e bebia muito. Às vezes eu não tinha pinga e eu bebia álcool, perfume, aí eu falei ‘senhor, tenha misericórdia, eu não estou aguentando mais’. Hoje faz 15 anos que eu não coloco uma gota de álcool na boca”, revela emocionada.
A história da Meire é um testemunho vívido da capacidade de transformação que o trabalho na cooperativa proporciona. “Muitas pessoas oferecem álcool, mas eu não quero, porque eu vejo quem fui e quem eu sou hoje. Agradeço muito à minha mãe, meu irmão, minha família, porque senão eu não estaria mais aqui para contar essa história”, acrescenta.
“Eu sofri muito, passei muita dificuldade, e foi minha família que me acolheu. Aí casei de novo, tenho dois filhos com meu marido e estou vivendo. Não tinha uma bicicleta para andar e com o serviço da cooperativa eu consegui comprar meu carro e ir pagando. Eu sou grata pela vida que eu tenho hoje”, afirma Meire.
Erica de Melo Pinto, de 24 anos, filha de Meire, trabalha há quatro anos na cooperativa e diz que a história da mãe é muito emocionante e inspiradora. “Aqui é um serviço muito bom e que faz toda a diferença na minha vida, principalmente por estar perto da minha família”, revela a jovem enquanto desempenha suas funções na esteira, onde seleciona os materiais. Com um filho de seis anos, ela encontra satisfação no trabalho e se orgulha de seguir os passos da mãe.
A história dessas duas mulheres é parecida com a de outras, permeada pelos desafios e devoção ao trabalho. Elas são mães, esposas, e também provedoras de seus lares, encontrando no ambiente de trabalho da cooperativa muito mais do que uma fonte de renda, mas também um espaço de realização pessoal.
Margarete Silva Moreira, de 49 anos, mora há 25 anos em Paranavaí e trabalha como balanceira na cooperativa. “Tive quatro filhos e moro com dois deles. Uma das minhas filhas é nutricionista em Maringá, a outra trabalha na RPC, e a outra é designer de sobrancelhas”, compartilha. Margarete acorda às 6h da manhã para trabalhar, não tem marido e precisa sustentar os filhos que ainda moram com ela.
Embora sejam apenas metade dos funcionários da cooperativa, as mulheres desempenham um papel fundamental em todas as etapas do processo de reciclagem, desde a triagem dos materiais até sua preparação para reutilização. O trabalho comprometido de cada uma delas acaba se tornando o coração pulsante da organização.
Maria do Carmo de Souza, de 60 anos, trabalha há 9 anos na cooperativa. Sua história é marcada por desafios, tendo ficado viúva aos 43 anos. “Meu marido morreu de tuberculose e eu precisei trabalhar na roça e como doméstica antes de vir para cá, para sustentar meus filhos”, relembra.
Quando o neto de Maria do Carmo adoeceu ainda bebê, também de tuberculose, ela precisou sair do trabalho para cuidar dele, já que todas as filhas eram menores de idade. Segundo ela, era necessário um adulto responsável para o tratamento. Faz cinco meses que o neto morreu, aos 10 anos, e o trabalho serve como um escape desses momentos. “Eu amo esse lugar de paixão mesmo, tudo o que faço é com carinho, gosto de trabalhar aqui”, explica.
Além delas, Rebeca Oliveira, de 22 anos, é uma mulher trans que iniciou o trabalho na cooperativa há uma semana. “Eu gosto bastante de trabalhar aqui, é um serviço muito bom”, diz. “Minha vida não é fácil, mas a gente tenta. A gente tem que trabalhar para conseguir o que quer, não é verdade?”, questiona.
Rebeca mora sozinha, mas tem o apoio de uma família próxima. “Sempre pensei que fosse sofrer muito preconceito e muita crítica, mas até agora foi tranquilo e nunca me abandonaram. Aqui também é muito bom, todo mundo me chama de Rebeca.”
Essas mulheres personificam a força de vontade e a resiliência característica de todos os colaboradores da cooperativa. Em um mundo onde este trabalho muitas vezes é subestimado, elas são verdadeiras protagonistas, cujas histórias de superação e conquistas merecem ser reconhecidas e aplaudidas.
Mulheres guerreiras que transformam lixo em riqueza. E mantém Paranavaí saudável. Orgulho de poder compartilhar a amizade de todas elas. Parabéns a todas essas mulheres que fazem a diferença. Feliz Dia Internacional da Mulher.