LUCIANO TRINDADE
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Condenado em última instância pela Justiça italiana a nove anos de prisão por estupro coletivo, Robinho está no Brasil, que não extradita brasileiros natos. Portanto, a não ser que viaje à Itália ou a algum dos países que têm acordo de extradição com a Itália, o jogador não cumprirá a pena no país em que o crime, segundo a Justiça italiana, foi cometido, em 2013.
O próximo passo do caso é a publicação da sentença, 30 dias após o julgamento de quarta-feira (19). Aí, como o atleta não está na Itália -assim como seu amigo Ricardo Falco, também condenado-, o sistema judiciário italiano poderá formalizar um pedido ao brasileiro para que a execução das penas se dê no Brasil.
Essa possibilidade se apresenta na Lei de Migração (13.445/17) do Brasil, que prevê a transferência da pena nos casos em que a extradição não é possível. Porém os advogados do atacante e os especialistas ouvidos pela reportagem veem como pouco provável a hipótese de essa transferência ser concretizada.
Pelo que está estabelecido na legislação, a solicitação seria recebida pelo STJ (Superior Tribunal de Justiça), que analisaria o cumprimento dos requisitos. Alguns desses requisitos são claramente atingidos, como citação regular, trâmite em julgado e similaridade nas leis -isto é, o que é crime no outro país também é crime no Brasil.
Onde a transferência da pena pode esbarrar é em um trecho do acordo de cooperação judiciária entre Brasil e Itália, firmado em 1989 e modificado em 1993. O acerto entre os países estabelece explicitamente que “a cooperação não compreenderá a execução de medidas restritivas da liberdade pessoal nem a execução de condenações”.
De acordo com André Ramos Rocha e Silva, advogado especialista em direito criminal, a Lei de Migração, de 2017, “não afasta os ditames do artigo 9º do Código Penal”. “O Brasil e a Itália não têm um tratado ou promessa de reciprocidade para a execução de pena privativa de liberdade, requisito objetivo do artigo 100, parágrafo único, inciso V”, disse.
O citado artigo do Código Penal estabelece as condições para a homologação de sentenças estrangeiras no Brasil. Há quem veja todos os requisitos cumpridos, como o advogado Davi Tangerino, especialista em direito penal ouvido pelo SporTV, mas os advogados de Robinho lhe disseram que o risco é mínimo.
Se o STJ entender que a sentença não deva ser homologada, o processo poderá ser reaberto do zero no Brasil. Aí o caso será remetido à primeira instância, na qual serão reexaminadas todas as provas e haverá novamente amplo espaço de defesa. É nisso que aposta Hindemburgo Chateaubriand Filho, subprocurador-geral da República.
“A possibilidade mais provável é que a Itália encaminhe todo o processo para cá. Aí nos analisaríamos todo o processo e as provas produzidas para verificar o que poderia ser aproveitado”, afirmou o procurador à reportagem.
“Começa do zero, em ação proposta por um procurador da República. Por vir de fora, isso passa a ser da Justiça Federal. Mas tudo tem de ser refeito no Brasil, com direito de defesa. Lá na frente, com a prescrição correndo, será julgado e poderá ser condenado na Justiça brasileira. Só aí teríamos uma condenação no Brasil válida para ele”, acrescentou Chateaubriand.
A contagem da prescrição, observam os especialistas, não seria simples. Há dispositivos na legislação que preveem a interrupção da contagem, complicada pelo fato de ter ocorrido um julgamento fora do país. Segundo Aline Prata Fonseca, especialista em direito penal e processual penal, haveria a necessidade de uma “analogia de datas”.
“Como a pena dele é de nove anos, pela nossa legislação, quando são oito a 12 anos de pena, o crime prescreve em 16 anos. Mas existem marcos que interrompem essa prescrição como a data da prescrição, por exemplo”, observou a advogada. Na contagem de 16 anos, a prescrição ocorreria em 2029.
Por ora, enquanto a Justiça italiana não publica a sentença e não entra em contato com o judiciário brasileiro pedindo a transferência da pena, Robinho deve permanecer no Brasil. Ele não pode ir à Itália, onde seria preso, nem aos países signatários da convenção europeia de extradição, as nações da União Europeia.
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