Não sou nenhum especialista em Dependência Química, de modo que nada posso comentar sobre ela com a autoridade de profissionais e estudiosos da área. No entanto, enquanto dependente químico, posso comentar a partir de experiências por mim vivenciadas antes, durante e após o meu processo terapêutico em busca da sobriedade!
A saúde é algo de grande importância para todo ser humano, ou seja, ele precisa estar bem de saúde para que possa dar bom andamento em outras questões da vida. A OMS (Organização Mundial de Saúde), definiu em 1948, saúde como sendo “estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não somente a ausência de enfermidade ou invalidez”, deixando o conceito saúde para além do corpo físico. A partir desta definição, em se tratando da Dependência Química, constata-se a sua catalogação na Classificação Internacional de Doenças da OMS (CID) da seguinte forma: “Conjunto de fenômenos comportamentais, cognitivos e fisiológicos que se manifestam após o uso recorrente de certa substância. De acordo com o CID, o código para a dependência química é o F19 sob o registro “Transtornos Mentais e Comportamentais Devido ao Uso de Múltiplas Drogas e ao Abuso de Substâncias Psicoativas”. Assim sendo, claro está que a dependência química é uma doença; e é crônica porque o doente pode necessitar de cuidados por muito tempo, anos até – é importante salientar que é uma doença incurável, motivo pelo qual a resultado eficaz de qualquer forma de tratamento dela é uma vida sóbria, livre da substância, porém com a necessidade de se tomar vários cuidados para evitar recaídas. A Dependência Química é doença porque, sutilmente vai roubando das pessoas o bem-estar físico, mental e social, e tornando-as escravas das substâncias psicoativas (drogas) sem que elas percebam; quando se dão conta disso, a doença quase sempre já se encontra num estágio muito avançado.
Na minha curta percepção, a dependência química é uma doença terrível, primeiro porque faz com que (a) doente não se considere (a) levando-o(a) a não procurar tratamento; segundo porque ao admitir estar doente, a maioria das pessoas se iludem achando que podem se curar sozinhas, a hora que bem entenderem, sem precisar de ajuda externa; e terceiro porque o estilo de vida que o(a) doente leva, às vezes por anos a fio, faz com que as pessoas mais próximas, aquelas que vivem ao seu redor, principalmente os membros da família também adoecem, de uma outra forma, mas adoecem e, infelizmente a grande maioria também não procuram ajuda para se tratar… muitas pessoas dependentes químicas morrem afirmando não ter a doença. Outro fator que na minha visão faz dela uma doença terrível é que devido à necessidade de mudança de vida por parte do doente, ou seja, o doente em tratamento precisa mudar comportamentos e hábitos, bem poucas pessoas conseguem se manter bem após o tratamento – querem estar bem mas não se esforçam para fazer as mudanças importantes na sua vida.
Eu sou alcoolista e tenho vivido com sobriedade desde 2001. No ano de 2000 fiz um processo terapêutico no Mosteiro Monte Carmelo – Associação Casas do Servo Sofredor (CSS), também denominada Reitoria Senhora do Carmo – Mãe dos Vulneráveis e dos Carmelitas, onde trabalho atualmente como coordenador da Regional Curitiba. A CSS é uma entidade nascida no seio da Ordem Carmelitana, a partir do empenho dos frades carmelitas e de leigos comprometidos com as pessoas que sofrem com a cruel realidade da dependência química, e desde 1994 vem prestando serviços para ajudar as pessoas a se verem livres da escravidão das drogas. Sua Equipe de Colaboradores, com base em elementos importantes do carisma carmelitano, criaram um programa de processo terapêutico que tem salvado vidas e famílias no decorrer dos anos. A Espiritualidade Carmelitana, uma espiritualidade que gera vida, muito tem favorecido a Associação Casas do Servo Sofredor a ajudar as pessoas na busca pela sobriedade. Após muito tempo usando drogas, o(a) dependente químico vai perdendo sua identidade; durante o processo terapêutico na CSS, ele(a) vai fazendo um grande esforço para, no silêncio se reencontrar, identificar seus limites, suas fraquezas, mas também seus pontos fortes, e nessa busca, quando feita com sinceridade, quase sempre faz com ele(a) tenha um encontro com o Ser Supremo, com o Poder Superior, que para mim é Deus! Esse encontro, gradativamente, na medida em que a pessoa vai se abrindo ao processo terapêutico, com a participação na psicoterapia, na escuta terapêutica, com a acompanhamento psiquiátrico, e a própria convivência comunitária, faz com que sua vida vá sendo transformada, as mudanças começam a acontecer, e o(a) dependente químico em tratamento vai se fortalecendo na sobriedade.
(Ir. Geraldino do Espírito Santo, OTC – 25/01/2022)