Renato Benvindo Frata
Depois de tempos visitei a escola que me ajudou crescer. Seus muros altos, o portão soberbo e a fachada reverente precisando de tinta nova, deu-me vontade de começar tudo de novo. Parado na esquina sob uma sombra, por momentos ouvi gritos, alaridos de mil vozes enquanto um nó apertou-me a gravata, mas foi impressão. Era domingo.
Não dei às pessoas que estavam comigo qualquer razão para se importarem, mas meus olhos se umedeceram. Era a saudade que entrava neles sem que percebesse e, tendo entrado, ficara ali a mexer nas glândulas para em seguida caminhar em gotas até o nariz e a garganta: a saudade se veste de lágrima.
Nada que um pigarrear e uma passada de lenço não resolvesse. E resolveu à vista dos outros. Para mim, contudo, se transformou numa vontade enorme de voltar ao pátio, de invadir seus corredores com passos curtos, rever as salas, apagar a lousa e de falar – muito – com a primeira professora pedindo-lhe a bênção. Desculpas pelas diabruras, birras, garranchos, malquereres e palavrões, e mais que isso: por sua dedicação não só a mim, mas também e por igual aos meus colegas, todos carentes. E feito isso, pedir-lhe desculpas por ter crescido e a abandonado sem lhe ter dito ao menos uma vez, obrigado! Pela preocupação com nossos piolhos catados à unha, nossos bichos de pés retirados com cuidado com agulhas fininhas. Obrigado, mestra, por tudo o que fez por mim pegando em minha mão para ajustar as letras nas linhas e me dar um Norte, e especialmente por ter sempre no semblante um perfeito rosto de mãe enquanto alicerçava meu amanhã.
Algo em mim, naquele momento, me fez distanciar do grupo por alguns passos afim de me compenetrar, e nessa conversa rápida com o íntimo, minha consciência fez um ato de constrição. O tempo de reconhecer erros chegara e, assim sendo, que eu cumprisse o que o coração pedia. Perguntei por ela, mas ganhei olhares furtivos, pontos de interrogação. Os mais novos não a conheciam e os mais velhos, preocupados com suas próprias vidas de problemas, não se lembravam, até que um deles, botando o dedo na testa como apontando para a lembrança, expressou entusiasmo. “– Sim, me lembro dela, claro. Também foi minha professora, mas não está mais aqui. Se aposentou, enviuvou e foi morar com o filho, fora do país.”
A emoção não se desfez, nem o sentimento de débito que ficará eternizado enquanto não puder substituí-lo por um instante de conversa franca e um abraço agradecimento, mas, enquanto isso não acontece, deixo registrado que a boa lembrança que a professora da escola primária deixa ao ensinar o B-A-BÁ, ganha placa de ouro em nossos corações. E essa não se derrete nem se perde diante da alegria e tristeza que a vida pode produzir.
A todas, o meu mais sincero e reconhecido respeito.