LUCAS BOMBANA
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Os impactos macroeconômicos globais como consequência da guerra entre Rússia e Ucrânia, com aumento nos preços internacionais das commodities e alta da inflação, devem contribuir para que a valorização recente do real prossiga nas próximas semanas.
Na avaliação de gestores de fundos, a pressão inflacionária importada pelo Brasil por conta dos conflitos e do choque de oferta de matérias-primas no Leste Europeu pode forçar o BC (Banco Central) a ser ainda mais agressivo no processo de aperto da política monetária.
Os juros cada vez maiores da taxa Selic, por sua vez, tendem a continuar favorecendo o Brasil no radar de investidores internacionais em busca de oportunidades em mercados emergentes.
Em especial, com os preços elevados das commodities e com a migração de recursos de investidores que devem deixar o mercado russo em resposta à invasão na Ucrânia.
Sócio da gestora de recursos Parcitas Investimentos, Bruno Leite diz que, no rastro dos impactos econômicos trazidos pela guerra, decidiu aumentar na carteira dos fundos a aposta na valorização do real, bem como a exposição aos juros prefixados de curto prazo, ante a expectativa de que o BC talvez precise ser mais duro no processo de aperto monetário.
Com o choque de preços originado pelo conflito na Europa, economistas passaram a prever um IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) mais alto do que o projetado anteriormente, com o índice de preços podendo testar patamares de até 6% neste ano e uma taxa de juros ao redor de 13%.
No mais recente relatório Focus, a mediana das estimativas dos economistas consultados pelo BC apontava para uma inflação de 5,65% em 2022, acompanhada de uma Selic de 12,25%. A previsão para o dólar no final do ano era de R$ 5,40.
O dólar fechou a semana cotado a R$ 5,053 para venda, com uma desvalorização de aproximadamente 9,4% da moeda americana frente ao real no acumulado do ano. “O dólar pode furar o piso de R$ 5 e experimentar níveis ao redor de R$ 4,80”, diz Leite.
“O BC terá dificuldades para interromper o ciclo de alta dos juros”, afirma o gestor da Parcitas. Ele acrescenta que o real também costuma se valorizar em momentos em que os preços das commodities estão em alta, devido ao impacto positivo para os termos de troca do país.
O preço do barril do petróleo tipo Brent vem em uma firme trajetória ascendente no mercado internacional desde que se iniciaram os conflitos na Ucrânia, com a cotação em torno de US$ 112,67 (R$ 566,15) na sexta-feira (11).
“Esse cenário de incerteza requer que as convicções sejam checadas. É preciso ser mais seletivo na escolha dos riscos assumidos”, afirma José Monforte, gestor da Vinland Capital.
Entre as teses que foram reforçadas por conta da guerra, Monforte aponta a necessidade do aumento dos juros nos Estados Unidos. Ele avalia que o banco central americano terá de agir de maneira mais firme para controlar a crescente pressão inflacionária trazida pela alta das commodities.
Por conta disso, o gestor afirma ter optado por aumentar as posições que se beneficiam da alta no mercado de juros nos Estados Unidos.
Já na esfera local, Monforte também aposta que o real irá continuar se fortalecendo frente ao dólar.
Mesmo com a previsão de um ciclo mais agressivo de aumento dos juros americanos que tende a atrair recursos para os Estados Unidos, o especialista também vê o nível atual de preços das commodities, e da Selic, exercendo um peso maior sobre o câmbio.
“Além disso, aumentamos a exposição da carteira ao universo de ações produtoras de commodities de energia, agrícolas e metálicas, que se beneficiam dos preços internacionais mais altos”, diz Monforte.
Sócio e gestor da Novus Capital, Luiz Eduardo Portella diz que as sanções contra a Rússia e o potencial impacto econômico transmitido para outros países do continente europeu têm um efeito recessivo global que pode levar a uma descompressão da inflação nos países desenvolvidos.
Nesse cenário, os bancos centrais desses países podem rever a postura quanto ao ritmo do ciclo de alta dos juros, prevê o gestor da Novus.
“Reduzimos bastante, mas ainda mantemos a posição tomada [que ganha com a alta] nos juros internacionais, principalmente nos Estados Unidos”, afirma Portella, acrescentando que, também por conta da expectativa de um juro menor lá fora, se desfez de uma posição conhecida no jargão de mercado como “vendida” na Bolsa americana, que se beneficia da queda das ações.
Em linha parecida, a gestora global BlackRock apontou em relatório recente que vê na invasão russa à Ucrânia um cenário mais favorável ao mercado acionário de países desenvolvidos, pela percepção de que o evento trará um impacto negativo para o crescimento econômico, com menor necessidade, portanto, de aumento dos juros.
“Os bancos centrais dos Estados Unidos e da Europa talvez tenham de ser mais comedidos no aumento dos juros, mas a alta vai ter que ocorrer. É uma crise inflacionária para preços e desinflacionária para crescimento”, diz Carlos Calabresi, sócio e diretor de investimentos da Garde Asset Management.
“Ainda acho que a posição que ganha com a alta de juros lá fora é boa. Só que, dada toda essa incerteza na Ucrânia, é preciso acertar o tamanho da posição”, acrescenta Calabresi.
Em relação ao câmbio, o gestor da Garde faz coro aos pares e entende que há espaço para os ganhos do real frente ao dólar prosseguirem, ante o fluxo que prevê que deve continuar em direção ao mercado brasileiro.
Dados da B3 apontam que os estrangeiros aportaram algo como R$ 67,5 bilhões no mercado de ações brasileiro em 2021, até 2 de março. No consolidado de 2021, esse volume foi de R$ 102,3 bilhões.
Analistas do Itaú BBA projetam que o Brasil pode receber um fluxo estrangeiro aproximado de R$ 7 bilhões, após a decisão da empresa MSCI de excluir a Rússia dos índices de referência dedicados aos mercados emergentes.
“Acredito que o fluxo de estrangeiros para o mercado local vai continuar. O Brasil tem tudo o que os investidores querem neste momento, que é juro alto e commodities. E agora sem a Rússia como um grande emergente no radar, o fluxo vai acabar transbordando para o Brasil”, afirma Portella, da Novus, que diz ter também em carteira posições no real e no índice Ibovespa dado o peso relevante de commodities e bancos, principal foco no radar dos bolsos estrangeiros.
“A guerra intensifica algumas questões que já estavam no radar, como a inflação, que é um problema no Brasil e no mundo”, afirma Philipe Biolchini, diretor de investimentos da Bram (Bradesco Asset Management).
Biolchini diz que as carteiras dos fundos já vinham com um perfil mais defensivo mesmo antes da guerra, em um ambiente de inflação pressionada e perspectiva de alta dos juros globais.
Com os conflitos na Europa, a postura cautelosa deve continuar até que seja possível ter uma clareza maior sobre como se dará o desenrolar desse evento e suas consequências econômicas, afirma o diretor de investimentos,
“Temos privilegiado posições pequenas e táticas”, diz Biolchini, que, ao contrário dos pares, já não vê tanto espaço para a valorização do real prosseguir por muito mais tempo. “Estamos começando a achar que já está em um patamar de sustentação em que não deveria ter muito mais valorização.”
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