O caminho de Jesus apresenta-se quase como uma única subida em peregrinação da Galileia até Jerusalém. Trata-se de uma “Subida” antes de mais nada, em sentido geográfico: o mar da Galiléia situa-se cerca de 200 metros abaixo do nível do mar, enquanto a altura média de Jerusalém é de 760 metros acima do referido nível. Como degraus dessa subida, cada um dos sinóticos transmitiu-nos três profecias de Jesus sobre a sua paixão, aludindo desse modo também à subida interior que se desenrola no caminho exterior: o caminhar para o templo enquanto lugar onde Deus queria “fazer habitar o seu nome”, assim o Livro do Deuteronômio descreve o templo. (Dt 12,11; 14,23).
A meta final dessa “subida” de Jesus é a oferta de Si mesmo na cruz, oferta que substitui os sacrifícios antigos; é a subida que a Carta aos hebreus designa como a ascensão para a tenda não feita por mãos de homem, ou seja, o próprio céu, apresentando-Se diante de Deus. (Hb 9,24). Essa ascensão até a presença de Deus passa pela cruz: é a subida para o “amor até o fim” (Jo 13,1), que é o verdadeiro monte de Deus.
Todavia a meta imediata da peregrinação de Jesus é Jerusalém, a Cidade Santa com o seu Templo, e a “Páscoa dos judeus”, como a designa João 2,13. Por motivo da celebração da Páscoa, memória viva da libertação do Egito, acorriam a Jerusalém multidões de judeus. Nestas ocasiões as expectativas messiânicas ressurgiam com força. Jesus pusera-se a caminho juntamente com os Doze, mas pouco a pouco se foi associando a eles uma turba crescente de peregrinos, Mateus e Marcos narram-nos que, à saída de Jericó, já havia uma “grande multidão” que seguia Jesus. (Mt 20,29; Mc 10,46). Nessa última parte do percurso, um fato veio aumentar a expectativa do que vai acontecer, e coloca Jesus de um modo novo no centro de atenção dos peregrinos. À beira da estrada, está sentado um mendigo, cego, chamado Bartimeu. Ora, tendo sabido que Jesus está presente entre os peregrinos: põe a gritar ininterruptamente: “Filho de Davi, Jesus tem compaixão de mim”. (Mc 10,47). Procuram serená-lo, mas em vão; por fim Jesus convida-o a aproximar-se. À sua suplica: “Rabbuni! Que eu possa ver novamente”. Jesus responde: “Vai a tua fé te salvou!”. Bartimeu vendo de novo, juntou-se à peregrinação para Jerusalém. De um momento para o outro, o tema “DAVI” e a sua intrínseca esperança messiânica apoderou-se da multidão: porventura este Jesus com quem estavam a caminho, não seria verdadeiramente o novo Davi esperado? Com a sua entrada na Cidade Santa não teria porventura chegado a hora em que Ele restabeleceria o reino de Davi?
A preparação que Jesus efetua com os seus discípulos, aumenta essa esperança. Jesus chega ao Monte das Oliveiras, donde se esperava a chegada do Messias, vindo da direção de Betfagé e Betânia. Manda buscar o jumentinho e depois monta nele para entrar em Jerusalém. Os textos são carregados de significados para os judeus. O principal deles Zacarias 9,9, este texto é usado no domingo de ramos: “Dizei à filha de Sião: eis que o Teu Rei vem a ti, manso e montado em um jumento, em jumentinho, filho de uma jumenta” (Mt 21,5; Jo 12,15). Ele é rei que quebra os arcos de guerra, um rei da paz e um rei da simplicidade, um rei dos pobres. E, por fim, vimos que governa um reino que se estende de mar a mar abraçando o mundo inteiro; isso faz-nos recordar o novo reino universal de Jesus.
Trazem o jumentinho a Jesus, e naquele momento acontece algo de inesperado: os discípulos colocam sobre o jumentinho as suas capas: “E Jesus sentou-Se em cima”. Essa expressão é usada no Livro dos Reis, quando se narra a subida de Salomão ao trono de seu pai, Davi. Lê-se que o rei Davi ordena ao sacerdote Sadoc, ao profeta Natã e a Banaías: “Tomai convosco os servos do vosso rei, fazei montar na minha mula o meu filho Salomão e fazei-o descer até Gion. Lá o sacerdote Sadoc e o profeta Natã o ungirão rei de Israel. O próprio fato de estender as capas está ligado a uma tradição na realeza de Israel (2Rs 9,13). A ação realizada pelos discípulos é um gesto de entronização na tradição da realeza davídica e conseqüentemente, na esperança messiânica, que se tinha desenvolvido a partir dessa tradição. Os peregrinos que vieram juntos com Jesus a Jerusalém deixam-se contagiar pelo entusiasmo dos discípulos; estendem agora as suas capas na estrada por onde Ele passa. Cortam ramos das árvores e gritam palavras do Salmo 118 – palavras de oração da liturgia dos peregrinos de Israel – que, nos seus lábios se tornam uma proclamação messiânica: “HOSANA! BENDITO O QUE VEM EM NOME DO SENHOR! BENDITO O REINO QUE VEM DO NOSSO PAI DAVI! “HOSANA NO MAIS ALTO DOS CÉUS” (Mc 11,9; Sl 118,25-26).
E entrando em Jerusalém, a cidade inteira agitou-se e dizia: “QUEM É ESTE? A isso as multidões respondiam: “ESTE É O PROFETA JESUS, O DE NAZARÉ DA GALILÉIA”. (Mt 21,10-11).
(Texto redigido a partir do Livro de Bento XVI – Jesus de Nazaré – da entrada em Jerusalém até a ressurreição – pgs. 15 a 23).