Embalado pela discussão que tomava conta do cenário internacional desde 1959, o Brasil, na Constituição Federal de 1988, principalmente em seu artigo 227, e com o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), em 1990, passou a adotar a chamada doutrina da proteção integral para a proteção e promoção dos direitos de crianças e adolescentes, substituindo a até então vigente doutrina da situação irregular, que se baseava no tripé do assistencialismo, da repressão e da institucionalização.
Com o advento da nova doutrina a criança e o adolescente deixaram a condição de meros objetos da intervenção do público adulto (Estado, sociedade e família) para serem considerados sujeitos de direitos e, cabe o destaque, sujeitos de direitos “prioritários” de qualquer tipo de ação ou providência, especialmente no que tange à definição de políticas públicas.
Atualmente, antes de qualquer destinação de verbas orçamentárias, de definições de prioridades a serem enfrentadas, de decisões a serem tomadas, o agente público, no caso de atuação do Estado, necessariamente deve considerar a situação e as demandas dessas especiais parcelas da sociedade.
Essa nova realidade, mesmo em curto espaço de tempo – para a régua da história 35 anos “foi quase ontem” – já produziu bons frutos. Como exemplos, vale destacar: a) redução do trabalho infantil em mais de 70% entre os anos de 1992 a 2023; b) redução em 40% do índice de evasão escolar no início médio; c) redução em 60%, da mortalidade infantil, a partir dos anos 2000, isso em falar que o ECA foi seguido por diversas outras leis que reforçaram a necessária proteção de crianças e adolescentes no Brasil, como é o caso da Lei 12.594/12, voltada à execução das medidas socioeducativas, da Lei nº 14.344/2022, conhecida como Lei Henri Borel, que objetiva aumentar a proteção de crianças e adolescentes vítimas de violência doméstica, dentre tantas outras.
Apesar desses avanços muito ainda há de ser feito. São frequentes os casos de abuso e exploração sexual de crianças e adolescentes, inclusive no ambiente intrafamiliar, os casos de bullyng e cyberbullyng, os casos de assassinatos, especialmente de adolescentes negros e pobres, além de outras formas de violências, violações e exclusões.
É preciso reavivar o mesmo ambiente social e político que garantiu a aprovação do ECA em 1990 para que os avanços continuem e os retrocessos sejam enfrentados com coragem e firmeza, afinal, ainda estamos no meio do caminho.
A luta pela promoção e proteção dos direitos de crianças e adolescentes vai além de preferências ou antipatias ideológicas, partidárias, filosóficas ou religiosas. É uma causa que deve unir a todos, sem exceção, pois, do contrário, não só deixaremos de cumprir o que a nossa legislação estabelece, exigindo o empenho de todos neste campo, mas, principalmente, mostraremos que, como sociedade, falhamos e falhamos feio, deixando de “estender a mão” justamente para aqueles que, em razão da evidente vulnerabilidade, muito precisam de todos e de cada um.







