A discussão sobre a irrigação no Paraná ganhou um novo patamar e deve ser permanente para superar obstáculos que surgem por falta de informação ou por um conservadorismo injustificável. Estes são alguns dos resultados da 1ª Jornada de Irrigação do Paraná, realizado na semana passada pelo Sindicato Rural de Paranavaí, Associação dos Produtores Irrigantes do Paraná (Apip) e Total Hidro Irrigação e Hidráulica.
O evento aconteceu de segunda a sexta-feira, das 18 às 20 horas, e foi totalmente online. Durante cinco noites, autoridades, lideranças do agronegócio, técnicos do governo, produtores rurais, empresários do setor, especialistas e outros interessados abordaram várias questões para impulsionar a agricultura irrigada no Paraná, que atualmente ocupa apenas 1% da área agricultável.
“Atingimos um novo patamar de discussão. A Jornada foi importante porque colocou às claras as necessidades do setor, esclareceu dúvidas em relação ao programa e mostrou pontos que precisam ser trabalhados para se chegar a um entendimento – neste quesito cito especialmente a questão da reservação de água. É uma forma inteligente de usar a água para a irrigação”, analisa o presidente do Sindicato e interino da Apip, Ivo Pierin Júnior.
Em setembro de 2019, atendendo reivindicação do Sindicato, Sociedade Rural do Noroeste do Paraná e da Sociedade Civil Organizada de Paranavaí (Socipar), o Governo do Paraná, através da Secretaria de Agricultura, lançou o Programa Estadual de Irrigação, anunciando várias ações, do subsídio ao financiamento, isenção de ICMS para equipamentos até a agilização nos licenciamentos ambientais e tarifa especial e melhoria da rede de distribuição de energia elétrica. “Alguns pontos avançaram, outros nem tanto”, aponta Pierin.
Ele destaca ainda a necessidade de o setor atuar fortemente para ter uma legislação moderna sobre o assunto. Lembrou que a deputada Aline Sleutjes, presidente da Comissão de Agricultura da Câmara, disse na abertura do evento que há dois projetos de lei tramitando para regulamentar o setor. “Temos que quebrar alguns paradigmas e mostrar a alguns agentes públicos e políticos que é possível irrigar sem agredir o meio ambiente, basta usar a água de forma inteligente”, diz.
É consenso entre especialistas que a irrigação é aliada do meio ambiente, pois quando se aumenta a produtividade numa mesma área não é preciso abrir novas fronteiras agrícolas para produzir mais.
Outorgas e licenciamentos – Considerados como principais gargalos do setor, o licenciamento e as outorgas para uso de água na irrigação ainda seguem padrões de muitos anos. Pierin disse que é possível mudar isso. “Estamos falando da agricultura 5.0, mais tecnificada e inteligente.”
Aponta as sugestões dadas durante a Jornada por Priscila Silvério Sleutjes, presidente da Câmara Temática de Agricultura Sustentável e Irrigação do Ministério da Agricultura, e pelo professor Everardo Mantovani, que criou e coordenou por 20 anos o Grupo de Estudos e Soluções para Agricultura Irrigada e é um dos maiores especialistas do assunto no país como alternativas.
Eles propõem a construção de barragens para reservação de água das chuvas e a autorização para captação de volumes diferenciados ao longo do ano, respeitando os períodos chuvosos e de escassez hídricas. “O Governo poderia usar as patrulhas rurais do Estado para construir estas barragens, que captariam a água das chuvas, que, na nossa região, acaba sendo um problema, porque gera erosão e provoca o assoreamento dos rios”, aponta o líder sindical. “O Governo teria controle da situação”, acrescenta
Mudança – Na avaliação de Pierin, a irrigação vai provocar uma mudança no perfil produtivo da região e é preciso incentivá-la e debatê-la. “É tudo muito novo ainda. Então é normal que haja divergências. Mas não podemos perder tempo. Temos que estudar e aprender rapidamente e cada um dos atores deste processo assumir sua responsabilidade. O que não podemos é ficar atrás de conceitos que já podem estar superados e não evoluir”, aponta ele.
Outra necessidade relatada pelo presidente é treinamento de pessoal na ponta do processo. “A Jornada mostrou que as informações não estão chegando claramente aqui na ponta para os produtores. E os técnicos do governo também têm dúvidas. Foi bom saber que na semana da Jornada houve treinamento de pessoal aqui na região. Mas é precioso treinar mais técnicos e mais rapidamente”.
Pierin defendeu um amplo acordo para destravar o processo que ainda é moroso, principalmente na área ambiental. “Temos que desatar os nós. Se o produtor é bem informado, ele faz um requerimento com todos os documentos, facilitando a análise. Se os técnicos estão bem informados, os projetos são mais bem elaborados, o que também facilita. Então é preciso um trabalho conjunto, todos buscando soluções e alternativas para os problemas”, sentencia.
Um bom exemplo desta falta de informação é que até a Jornada acreditava-se que o dinheiro aportado pelo Governo do Estado para o setor era para financiar os projetos de irrigação. A partir da palestra sobre o Banco do Agricultor, com Salatiel Turra, diretor do Departamento de Economia Rural (Deral/Seab), é que se soube que os recursos do Tesouro do Estado são só para equalizar os juros. “Nós não sabíamos disso. Até desconfiávamos. Mas esta informação não chegou claramente para nós”, exemplifica Pierin.
Para o presidente do Sindicato, o Estado deve investir na difusão da irrigação, lembrando que a técnica não é só para suprir a escassez de água. “Podemos programar e antecipar o plantio de algumas culturas. Isto pode significar três safras ao ano ou cinco em dois anos. O payback fica menor. Além disso, com os altos custos de produção, como sementes, adubos, defensivos etc., a agricultura não pode correr riscos de frustração de safra. A irrigação dá esta segurança”, ensina.
Marco – A mesma avaliação da Jornada é feita pelo diretor-secretário da Apip e sócio-diretor da Total Hidro, Leandro Friedrichsen Silva. “Institucionalmente, a Jornada foi muito boa. Foi um marco nessa nossa luta. Aponta para um novo cenário para o futuro da irrigação no Paraná”, diz.
O evento, na sua opinião, elevou a discussão sobre a irrigação a um novo patamar e acabou com uma visão minimalista que se tinha do setor. “A Jornada criou os parâmetros para a irrigação crescer e o programa estadual de fato acontecer”, avalia.
Ele lembra que a Jornada mostrou a necessidade de a informação sobre a irrigação chegar à ponta, onde está o pessoal de campo, produtor e técnico. Para Friedrichsen, o setor quer informação correta. “Ainda tem muita falta de conhecimento. E hoje há um cenário diferente. As pessoas estão buscando informação e checando aquilo que recebem”, diz sobre conceitos ultrapassados.
O agrônomo e empresário também aposta numa nova legislação federal, mais adequada à realidade e à necessidade de afastar amarras legais que impedem o Estado de adotar princípios mais modernos.
Graças à Jornada, ele vê com otimismo o futuro da irrigação no Paraná. “Estamos evoluindo. Estão descobrindo os benefícios que a irrigação, bem manejada, pode trazer. Ela não traz prejuízo ambiental se tiver manejo. E agora estão descobrindo isso. A irrigação vai continuar, sim, crescendo”, aposta Friedrichsen.