PHILLIPPE WATANABE
DA FOLHAPRESS
O labirinto de canos que faz a água cair pela sua torneira é cheio de armadilhas, que levam embora litros e litros de líquido. As perdas no país chegam a mais de 40%, segundo o levantamento anual pelo Instituto Trata Brasil, divulgado nesta semana.
O percentual elevado se traduz em uma quantidade de água suficiente para abastecer cerca de 66 milhões de brasileiros, no período de um ano. É o dobro do número de pessoas que não têm acesso a água no país, aponta o instituto.
É também possível visualizar essa perda de água de outros modos. O sistema cantareira, reservatório de água essencial para abastecimento de São Paulo, teria os seus metros cúbicos totalmente perdidos sete vezes em um único ano, considerando o volume de perda de líquido total que ocorre no Brasil.
Mas o que significa exatamente “perda de água”?
É uma expressão mais ampla que pode estar associada a uma perda real em vazamentos (que é o que você deve estar imaginando no momento) durante a distribuição, mas também a erros técnicos de mensuração e ao uso não autorizado, como em ligações clandestinas (toda essa parte é tida como uma perda aparente/comercial).
O número inicial deste texto diz respeito ao índice de perda na distribuição considerando todo o Brasil, um percentual que vem crescendo ano após ano e diz respeito à relação entre o volume de água produzido e o consumido. De 38,1% em 2016, chegou aos mais de 40% em 2020, ano-base para os dados brasileiros da pesquisa.
Ao olhar para as taxas de extravio de água nas regiões do país, a Norte é a que tem a maior perda na distribuição, superior a 51%, seguida pela região Nordeste, com 46%.
“Além disso, essas regiões também são aquelas que possuem os piores indicadores de atendimento de água, coleta e tratamento de esgoto”, diz o relatório.
O Centro-Oeste é a região com menor perda, 34%. Sudeste e Sul têm, respectivamente, 38% e 36%.
O trio de estados que lidera a perda de água na distribuição é composto de Amapá, Acre e Roraima, com, respectivamente, 74%, 62% e 60% de extravio.
Em São Paulo e no Distrito Federal, os índices são de cerca de 34%, abaixo da média nacional (o que é positivo, considerando que se perde menos água).
O Rio de Janeiro, por sua, está acima da média brasileira de perda de água, com registro de 46%, ou seja, pouco menos da metade da água potável produzida pela empresa de abastecimento desaparece (além de vazamentos, estão computadas ligações de água ilegais, por exemplo).
Segundo os autores da pesquisa, é importante observar essas perdas porque, caso sejam, em parte, corrigidas, seria possível disponibilizar mais água sem exploração de novas fontes. Além disso, vale destacar que algum nível de perda de água é inevitável, segundo o relatório. Porém, há um padrão mínimo ao qual, de forma geral, os entes são capazes de chegar, como valores abaixo de 25% de desperdício, tidos como de excelências.
E algumas grandes cidades brasileiras conseguem isso, aponta os autores, como Petrópolis (RJ), Campinas (SP), Limeira (SP), São José do Rio Preto (SP) e Goiânia (GO), para citar algumas.
Segundo o plano nacional de saneamento básico, até 2033, a perda na distribuição deve atingir, considerando o país como um todo, 31%.
E sempre vale lembrar: a água é um recurso finito.
CRISE HÍDRICA – Reduzir perdas, logicamente, é uma forma de impactar positivamente ou mesmo ajudar a evitar momentos de escassez, como a grande seca que parte considerável do país viveu recentemente.
Além da quebra de safras, o impacta preços de alimentos e a economia nacional como um todo, diversas cidades tiveram limitações no uso de água em casa.
A cidade de São Paulo, especificamente, apesar dos níveis muito baixos registrados no Sistema Cantareira, não chegou, de fato, a entrar em esquema de racionamento.
Curitiba e outras cidades, inclusive do estado de São Paulo, precisaram racionar. No fim do ano passado, o Paraná anunciou que, devido à falta de água constante no estado, as empresas de abastecimento poderiam fazer racionamentos.
Não parou por aí. A falta de chuvas para encher reservatórios levou, em 2021, a momentos críticos com possibilidade de racionamento de energia pelo país.