*Raphael Soré
Considerada uma prática essencial do programa de compliance, a análise de riscos de integridade se tornou um procedimento mais comum nos últimos anos. É notório que, normalmente, a maioria das empresas brasileiras realiza esse mapeamento voltado para as questões regulatórias de corrupção e integridade e até lavagem de dinheiro. Todavia, observa-se que há um fator que as organizações que operam no Brasil não costumam mapear e considerar que diz respeito às violações a normas de sanções econômicas.
Tais sanções são medidas implementadas por países ou organizações internacionais (como a Organização das Nações Unidas – ONU – ou a União Europeia) como mecanismos para pressionar, influenciar e punir países, pessoas ou empresas. Em uma primeira análise, isso pode parecer um tema pouco afeito ao dia a dia das empresas e mais ligado ao mundo da geopolítica. Porém, apesar de terem uma motivação no mundo diplomático, as organizações e negócios podem sofrer com os efeitos profundos dessas medidas.
Isso ocorre pois, para fazer com que as sanções efetivamente atinjam os alvos, países e organizações obrigam as pessoas e empresas a deixarem de fazer negócios com as partes sancionadas. No caso dos Estados Unidos, por exemplo, as penas pelo descumprimento das sanções econômicas podem levar a multas de 20 milhões de dólares por violação ou mesmo à prisão.
Além disso, não apenas empresas americanas ou com relações próximas com os Estados Unidos têm motivos para estarem atentas ao tema. A União Europeia e o Reino Unido têm aumentado o programa de sanções, assim como o Brasil que editou norma sobre o assunto, recentemente, tais como a lei nº 13.810/2019 e a resolução do Conselho de Controle das Atividades Financeiras (COAF) n° 31/2019.
Em geral, essas normas criam para empresas um risco regulatório relevante, à medida que podem ser punidas por transacionar diretamente com entidades sancionadas ou ainda por terem produtos e serviços indiretamente endereçados a elas.
No contexto geopolítico atual, esse risco é incrementado. Ao passo que as tensões entre os países aumentam, as sanções econômicas têm se mostrado como uma escolha dos governantes para exercerem pressão, fazendo com que diariamente novas pessoas e empresas sejam incluídas nas listas de sanções e que exista um maior investimento dos órgãos reguladores em fiscalizar e punir quem descumprir essas normas.
Sob a perspectiva reputacional, com o crescer das tensões e de situações de guerra conflagrada, a opinião pública passa a olhar para o relacionamento com certas pessoas, empresas e países com um novo grau de condenação, aumentando o risco reputacional para quem se engajar nesse tipo de relacionamento.
Sob a perspectiva operacional, o endurecimento da legislação de sanções também pode ter efeitos, na medida que instituições financeiras globais deixam de operar em determinados locais, dificultando operações financeiras para as empresas que fazem negócios na região.
Em conclusão, o momento atual reforça a necessidade de as empresas avaliarem os seus programas de compliance no que diz respeito ao possível impacto e probabilidade desse risco. É importante que seja feito o adequado endereçamento e mapeamento dessa ameaça e as matrizes de risco das empresas necessitam incorporar essa análise com urgência, assim como os programas de compliance em sanções econômicas precisam ser constituídos ou fortalecidos.
* Raphael Soré é sócio da área forense da KPMG