LEONARDO VIECELI
DA FOLHAPRESS
Com a ampliação do Auxílio Brasil para R$ 600 às vésperas da eleição e a geração de vagas de trabalho, a desigualdade de renda entre ricos e pobres caiu em 2022 para o menor nível de uma série histórica iniciada em 2012, segundo dados divulgados nesta quinta-feira (11) pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
O abismo entre os extremos da população é medido pelo índice de Gini, que varia de 0 (igualdade máxima) a 1 (desigualdade máxima).
Em 2022, o Gini do rendimento domiciliar per capita (por pessoa) recuou a 0,518, o menor nível da série em 11 anos, após subir a 0,544 em 2021.
Apesar da queda no ano passado, o índice ainda segue em um nível elevado se comparado ao de outros países, segundo o IBGE.
O rendimento domiciliar per capita da metade da população mais pobre subiu 18% no ano passado, para R$ 537 por mês. Enquanto isso, o ganho médio dos brasileiros 1% mais ricos foi de R$ 17.447. O valor no topo da distribuição ficou 0,3% abaixo do registrado em 2021 (R$ 17.494). Todos os valores são em termos reais, ou seja, são ajustados pela inflação.
Mesmo com o leve recuo, os brasileiros 1% mais ricos (R$ 17.447) ganharam o equivalente a 32,5 vezes a renda da metade da população mais pobre (R$ 537).
Essa diferença é a menor da série histórica, embora o abismo siga existindo. Em 2012, ano inicial dos registros, a marca era de 38,2 vezes.
“A queda brusca dessa razão para o menor patamar da série histórica reflete um pouco tudo que observamos. Muitas pessoas voltaram para o mercado de trabalho, os muito pobres estão recebendo um auxílio que se compara ao auxílio emergencial em valor, e o 1% mais rico teve uma pequena redução no rendimento”, afirmou Alessandra Brito, analista da pesquisa do IBGE.
Os resultados integram a Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) Contínua: Rendimento de Todas as Fontes 2022. O rendimento domiciliar per capita corresponde ao ganho total de uma família dividido pela quantidade de pessoas na residência.
Segundo o instituto, a ampliação do Auxílio Brasil para R$ 600, às vésperas das eleições de 2022, no governo Jair Bolsonaro (PL), elevou os rendimentos dos mais pobres. Em paralelo, o mercado de trabalho deu sinais de retomada com o aumento de 7,7 milhões de pessoas na população ocupada.
Além disso, a base de comparação fragilizada de 2021 também influenciou os avanços nas faixas da população com renda menor, de acordo com o instituto.
De 2021 para 2022, a desigualdade medida pelo índice de Gini diminuiu em todas as regiões, com destaque para o Nordeste (de 0,556 para 0,517) e o Sudeste (de 0,533 para 0,505).
O Nordeste, contudo, manteve o maior indicador das regiões. O Sul seguiu com a menor marca (0,458).
O economista Marcelo Neri, diretor do centro de políticas sociais FGV Social, também avalia que o recuo da desigualdade reflete a ampliação do Auxílio Brasil no segundo semestre do ano passado, além da volta do mercado de trabalho.
“É um resultado que chama atenção. Tivemos um ciclo eleitoral forte, que se manifestou tanto no auxílio de R$ 600 quanto em medidas como o controle do preço da gasolina. Esses efeitos se concentraram no segundo semestre”, diz.
Para Neri, o movimento de redução do Gini tende a permanecer em 2023. Segundo o economista, um dos motivos que sustentam essa projeção é a manutenção de transferências do Auxílio Brasil, com previsão de adicionais, no governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O programa, contudo, foi rebatizado como Bolsa Família na gestão petista.
“Vamos ter um ano cheio do benefício em 2023. A sustentabilidade [da redução da desigualdade] terá como grande prova 2024, 2025”, diz Neri. “Em 2024, isso vai ficar sujeito a questões orçamentárias”, completa.
O IBGE também divulgou o índice de Gini específico do rendimento médio mensal de todos os trabalhos dos brasileiros. O indicador de desigualdade recuou de 0,499 para 0,486, a menor marca da série.
A renda média de todos os trabalhos teve queda de 2,1% em 2022. Já a massa de rendimentos, considerada a soma dos salários, avançou 6,6%.
Segundo Brito, do IBGE, a entrada de quase 8 milhões de brasileiros na população ocupada puxou a média do rendimento do trabalho para baixo, mas, aparentemente, essas pessoas ingressaram no mercado com vencimentos similares. A combinação teria resultado em uma distribuição menos desigual.
“Além disso, o rendimento médio dos trabalhadores sem carteira e por conta própria aumentou no período, também contribuindo para essa queda no índice de desigualdade”, disse a pesquisadora.
Com a redução de 2,1% ante 2021, a renda média de todos os trabalhos foi estimada em R$ 2.659 no ano passado. Trata-se do menor patamar da série histórica, iniciada em 2012, e da segunda retração consecutiva.
O valor do rendimento médio é calculado a partir da divisão dos recursos obtidos com o trabalho pelo número de trabalhadores ocupados em vagas formais ou informais.
A massa de rendimento mensal de todos os trabalhos, por sua vez, subiu para R$ 253,1 bilhões. Segundo o IBGE, o resultado representa uma recuperação do indicador, após as perdas de 3,2% em 2021 e de 5,6% em 2020.