REINALDO SILVA
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Oitenta anos separam dona Francisca e a pequena Manu. Os laços que unem bisavó e bisneta vão além da herança genética; entre elas há trocas de carinho e cuidados de quem ama e se deixa amar.
Francisca Inácio Ribeiro tem 85 anos. Emanuely Ricci dos Santos, 5.
Moram na mesma casa e dividem o espaço com outras duas mulheres: a filha de dona Francisca, Darci Gonçalo Coelho Ricci, de 50 anos, e a filha de Darci e mãe de Manu, Jhenifer Melissa Gonçalo Ricci, de 29 anos.
Sob o mesmo teto, no Jardim Panorama, em Paranavaí, diferentes experiências se entrelaçam para formar uma só história. Quatro gerações juntas, em choque e congruência. Entre embates e acolhidas.
Elas se sentam na área de casa para conversar com a equipe do Diário do Noroeste. Em uma cadeira de rodas, dona Francisca é trazida pela filha Darci. Desde que sofreu um acidente vascular cerebral, a matriarca octogenária ficou com algumas funções motoras comprometidas, por isso requer cuidados especiais. Darci, Jhenifer e Manu não os negam.
A vida foi dura para ela. De origem pobre, trabalhava na roça para conseguir sustentar a família. Muitas vezes não tinha o suficiente para alimentar os filhos. “Pedia a Deus que crescessem logo para acabar aquele sofrimento”, lembra dona Francisca.
Não teve acesso à educação escolar. Precisou fazer muitos sacrifícios. E foram as dificuldades que a ensinaram a se virar. “Não foi fácil para todos, mas isso me ajudou a crescer.”
Quando olha para trás, dona Francisca vê um mundo diferente do que vive agora. Lá não tinha energia elétrica ou o conforto de que desfruta agora. As condições de comunicação eram precárias e um recado poderia levar dias para chegar ao destino. Jamais poderia imaginar que três gerações à frente seria possível conversar com alguém do outro lado do mundo, instantaneamente, sem sair de casa.
Darci fez parte dessa realidade por 12 anos, até decidir sair de casa e ir morar com outra família. O tempo que passou com a mãe e os irmãos foi suficiente para fazê-la entender que a vida deveria seguir outros rumos. Ergueu-se sozinha e construiu por si só uma nova história.
Quando foi mãe pela primeira vez, viu em Jhenifer a chance de proporcionar condições diferentes daquelas que viveu na infância. “Procurei fazer o melhor que pude e acredito que consegui.”
Darci tinha medo de reproduzir com as filhas comportamentos que não aprovava na mãe, mas venceu essa barreira e descobriu uma nova forma de maternidade. Errou, aprendeu, se reinventou e, acima de qualquer dúvida, acertou muito.
Graças a Darci, Jhenifer teve a oportunidade de se dedicar aos estudos. “Sempre tivemos esse incentivo.” Foi justamente esse incentivo da mãe que levou Jhenifer ao ensino superior. Hoje é formada em Administração, uma das poucas da família a concluir um curso universitário.
Para ela é fácil perceber as diferenças de costumes entre as gerações. “O mundo está mais aberto”, resume Jhenifer. Os avanços tecnológicos trouxeram mudanças de comportamento, proporcionaram acesso à informação e transformaram a humanidade.
Se dona Francisca não tinha geladeira ou televisão, Jhenifer cresceu em um mundo de novidades seguidas: computadores, internet, telefonia móvel.
Sem se dar conta de tantas diferenças, a pequena Manu cresce em um ambiente em que os aparelhos celulares são comuns. Assiste a vídeos e gosta de jogos digitais. “Ela sabe a senha de todo mundo aqui em casa”, garante Jhenifer. Complementa: “Outro dia pegou o celular da minha mãe e mandou mensagem para as amigas pelo Instagram”.
A menina de 5 anos não quer falar. Tímida, se esconde no colo da mãe enquanto presta atenção na conversa. Talvez Manu não perceba, mas faz parte de um novo mundo, que se movimenta na velocidade das conexões 5G; um mundo em que parece impensável ter 18 filhos ou viver sem energia elétrica.
É difícil saber o que vem pela frente, mas ter o carinho de tantas mulheres de garra, com histórias tão diferentes e ligadas para sempre, dá a certeza de que vencer é o único caminho para a pequena Manu.