Fernando Valente Pimentel
A desoneração da folha de pagamentos, vigente até o final deste ano para 17 setores de atividade, volta à pauta do universo corporativo, do Governo Federal e do Congresso. O foco no tema é justificado, pois o desemprego no Brasil seria ainda maior hoje se não fosse esse mecanismo, pelo qual as empresas têm a prerrogativa de optar, no pagamento da Contribuição Previdenciária Patronal, por alíquotas de 1% a 4,5% sobre a receita bruta, em vez de 20% sobre o montante dos salários.
Por isso, foi muito importante a aprovação pela Comissão de Assuntos Econômicos do Senado, dia 13 de junho último, do Projeto de Lei 334, do senador Efrain Filho, que prorroga a medida até 31 de dezembro de 2027. Cabe salientar que por ter sido analisada em caráter terminativo, a proposta segue diretamente para a Câmara dos Deputados, na qual esperamos que seja votada o mais brevemente possível.
Além desse PL, tem-se sinalizado a possibilidade de inclusão da desoneração na reforma tributária. É animador observar que esta alternativa, que seria o estado da arte ao perenizar algo importante para a economia, parece contar com a simpatia de membros do Executivo. Contudo, há uma questão crucial: o governo já indicou que a essa matéria deverá entrar na segunda etapa da reforma tributária, depois de outubro de 2023, quando se prevê a conclusão da primeira fase, referente ao imposto sobre o consumo. Portanto, não haverá tempo hábil, considerando a agenda de final de ano do Parlamento, para a complexa aprovação de uma emenda constitucional em tempo de evitar o fim de algo tão importante para o País a partir do primeiro dia de 2024.
Assim, parece-nos lógico que se aprove agora um projeto que prorrogue a medida, enquanto tramita a parte da reforma tributária que tratará dos encargos sobre a folha de pagamento, a qual, em prevalecendo o bom senso, a tornará definitiva. É preciso dar previsibilidade às empresas, que, a partir do segundo semestre deste ano, começarão a fechar negócios para 2024, bem como preparar seus orçamentos futuros.
Ademais, o Brasil tem custos trabalhistas muito altos em relação à média global, fator que afeta a competitividade. Por isso, a desoneração contribui para a manutenção de empregos e estímulo à economia. Trata-se de instrumento eficiente. Dizemos isso com a experiência prática do setor que representamos, o têxtil e de confecção, que foi pioneiro, em 2011, no processo de pagamento da contribuição previdenciária patronal com base em um percentual do faturamento bruto das empresas, juntamente com as áreas de móveis, calçados e software.
Cabe lembrar que os 17 setores hoje contemplados pela desoneração são os maiores empregadores do País, somando mais de 8,5 milhões de postos de trabalho, sendo 1,2 milhão gerados entre 2017 e 2022. Exemplo é a indústria têxtil e de confecção, que mantém cerca de 1,3 milhão de empregos formais em todo o território nacional. São números expressivos, em especial num cenário de desemprego ainda elevado em nosso país, evidenciando ser temerário extinguir ou interromper/adiar por tempo indeterminado um mecanismo que colabora para a empregabilidade. Por isso, somos favoráveis à desoneração até que se encontre modelo mais eficaz, como agora se sinaliza no contexto da reforma tributária.
Entendemos que os impactos de eventual interrupção dessa sistemática de pagamento da Contribuição Previdenciária Patronal via faturamento seriam fortes e negativos no emprego e agravamento de custos das empresas, afetando toda a economia, dadas as externalidades dos 17 setores envolvidos. É importante observar, também, que esta opção de pagamento aumenta a competitividade de nossas exportações, por isentá-las do pagamento sobre o faturamento, reduzindo em parte o acúmulo de impostos que temos nas cadeias produtivas.
Não menos relevante é o fato de haver uma compensação parcial ao que seria a chamada renúncia tributária, pois os produtos importados referentes aos setores desonerados pagam um percentual de Cofins não restituível. Assim, a desoneração da folha também acarreta mais isonomia concorrencial com países que não têm marcos regulatórios e exercício da cidadania empresarial similares aos do Brasil em termos dos princípios da governança ambiental, social e corporativa (ESG). Outro fator a ser considerado é que a alegada perda de arrecadação decorrente da medida é mais do que compensada quando se calculam os custos do desemprego em termos de programas sociais e perda de conhecimento dos profissionais.
Também cabe refletir, num olhar mais amplo, a relevância de se testarem novos modelos de financiamento da previdência, à luz das presentes e futuras transformações referentes ao aporte de automação e tecnologia. Tais mudanças implicarão o surgimento de novos modelos de empregos e relações trabalhistas. Nesse sentido, a desoneração da folha tem se mostrado eficiente, numa experiência bem-sucedida, testada na prática há 12 anos, desde 2011.
É certo que o principal fator da empregabilidade é o crescimento robusto do PIB. Porém, custos menores dos encargos trabalhistas levam a uma resposta mais rápida do mercado de trabalho. Ademais, numa conjuntura de baixo crescimento econômico, menores ônus para empregar atenuam o fechamento de vagas. Trabalho de qualidade e digno é o melhor programa social que pode existir.
Ou seja, as atividades intensivas em mão de obra promovem a inclusão por meio do emprego, de modo congruente com a necessidade de o País propiciar oportunidades de ocupação e renda à população. Eis aí a pertinência de reduzirmos os custos trabalhistas no Brasil de maneira ampla e abrangente. Até chegarmos a essa solução, porém, não faria o menor sentido interromper o modelo bem-sucedido para o pagamento da Contribuição Previdenciária Patronal pelos 17 setores abrangidos pela medida.
*Fernando Valente Pimentel é presidente emérito e diretor-superintendente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit)