“DÁ-ME DE BEBER” … JO 4,1-42…
Tudo se passa ao redor do POÇO – figura da Lei da instituições – no qual se acreditava estivesse A VIDA (ÁGUA). O poço era símbolo, sentido da vida que todos procuram. Para o povo da Bíblia. O POÇO ERA LUGAR DE ENCONTROS QUE MARCAM PARA SEMPRE A VIDA DAS PESSOAS. Foi junto a um poço que Isaac se apaixonou por Rebeca (Gn 24,10-27), Jacó se apaixonou por Raquel (Gn 29,1-14) e Moisés se encontrou com Séfora, sua futura esposa (Ex 2,16-22). A Samaritana, portanto, é a “ESPOSA” que Jesus procura. É por isso que o evangelho de João afirma: “Jesus tinha que atravessar a Samaria” (4,4). E no meio dos marginalizados (Samaria) que Jesus encontra sua “esposa”, e esta encontra o sentido de sua vida.
Cansado da viagem, Jesus senta junto ao poço. Nisso chega a mulher que representa todos os samaritanos e todas as pessoas que estão à procura do SENTIDO DA VIDA. Ela vai BUSCAR ÁGUA em hora imprópria. De fato, as mulheres costumavam ir juntas buscar água pela manhã ou ao entardecer. A samaritana busca água AO MEIO-DIA. E faz isso sozinha! Sinal de que SUA SEDE (E A NOSSA TAMBÉM) É MUITO GRANDE. E nós também teremos de ir “sozinhos” à procura daquilo que sacia nossa sede.
JESUS LHE PEDE DE BEBER = Para o povo da Bíblia, DAR ÁGUA a quem tem SEDE SIGNIFICA ACOLHER A PESSOA. Ao pedir água, Jesus começa a quebrar os preconceitos e as discriminações de raça (os judeus se julgavam superiores aos samaritanos) e de sexo (um homem não conversava publicamente com uma mulher desconhecida). A mulher tem consciência disso: “Como é que tu, sendo judeu, pedes de beber a mim, que sou samaritana? Quebrada a descriminação, Jesus PROVOCA A “SEDE” DA MULHER. ELE É O PRESENTE DE DEUS CAPAZ DE SACIAR A SEDE MAIS PROFUNDA: “SE CONHECESSE O DOM DE DEUS, E QUEM LHE ESTÁ PEDINDO DE BEBER, VOCÊ É QUE PEDIRIA. E ELE DARIA A VOCÊ ÁGUA VIVA” (V.10) A novidade de Jesus – ÁGUA CORRENTE EM OPOSIÇÃO A ÁGUA PARADA DO POÇO – suscita curiosidade e dúvida, de onde Jesus vai tirar essa água? Desde o início do evangelho ficamos sabendo que Jesus, vindo do Pai, é AQUELE QUE TRAZ VIDA PLENA. Ele supera tudo o que veio antes (poço do pai Jacó), e, é portador DA ÁGUA QUE MATA A SEDE PARA SEMPRE, a da Samaritana e a nossa também: “SENHOR, DÁ-ME DESSA ÁGUA, PARA QUE EU NÃO TENHA MAIS SEDE, NEM PRECISE VIR AQUI PARA TIRAR” (V.15).
“DÁ-ME DE BEBER”…
Ás vezes estamos cansados, dizemos para nós mesmos: alguém cuidará de nós; agora é tempo de receber.
E eis que “JESUS CANSADO DA CAMINHADA, SE SENTA, SEM MAIS NA BORDA DO POÇO”. (JO 4,6) E PEDE: “DAÍ-ME DE BEBER”.
No comentário do Evangelho de São João, Santo Agostinho escreve que o cansaço de Jesus quer nos revelar alguma coisa e garante: “É POR TI QUE JESUS SE AFADIGOU NA VIAGEM”. De fato, o texto começa com uma informação que precisa ser esclarecida. O narrador diz: “Tinha de atravessar a Samaria”. – É a missão junto aos dissidentes e as periferias, os filhos distantes.
– Mas agora Ele está cansado e SENTA-SE À BEIRA DO POÇO, ONDE NÃO SÓ A SAMARITANA, MAS TAMBÉM NÓS ACABAMOS DE CHEGAR. Uma imagem espiritualmente rara e que desafia o nosso olhar. Santo Agostinho comenta-a assim: = Queres ver como é forte o Filho de Deus? Tudo foi feito por meio dele, e nada foi feito sem Ele; e tudo realizou sem fadiga. Quem portanto, é mais forte do que Ele que criou sem fadiga todas as coisas?
– Querem ver agora sua fragilidade? O Verbo fez-se Carne e habitou entre nós (Jo 1,13-14). A força de Cristo criou-te, a fragilidade de Cristo te recriou.
– A força de Cristo chamou a existência o que não existia, a fragilidade de Cristo impediu que perdesse aquilo que existia. Com a sua força criou-nos, com sua fragilidade veio socorrer-nos. (Padre José Tolentino – Elogio da Sede).
= “O que tem sede aproxime-se; e o que deseja bebe gratuitamente da água da vida” (Is 55,1-2)
Junto ao poço de Jacó, o desejo de beber por parte de Jesus significava já o desejo de dar de beber da água viva. De fato, na cena com a Samaritana a sede de Jesus só parece ficar satisfeita quando ele se proclama a si mesmo como fonte de água viva e abre à promessa do dom do Espírito. O paralelismo com a declaração final na cruz leva-nos a compreender que a sede de Jesus é da mesma ordem: É SEDE DE ENTREGAR O ESPÍRITO, DE TRANSMITÍ-LO, DE COMUNICÁ-LO.
A SUA SEDE NA CRUZ DEVERÁ SATISFAZER-SE COM ESTE PENTECOSTES QUE SÃO JOÃO COLOCA ACONTECENDO NA HORA EXTREMA DA CRUZ.
No seu comentário ao Evangelho de São João, François Libermann escreve:
= “O QUE FAZ UM CONVITE AOS QUE TÊM SEDE, ELE MESMO ESTÁ DEVORADO PELA SEDE; A DIFERENÇA É QUE AQUELES A QUEM ELE CONVIDA TÊM SEDE DE BEBER DA SUA FONTE DE GRAÇAS…”
= “ENQUANTO JESUS TEM SEDE DE DAR A BEBER A SOBREABUNDÂNCIA DO SEU AMOR”.
Por isso o Evangelho de São João interpreta a morte como referência à sede daquele que dá a água viva.
Frei Filomeno dos Santos O.Carm.