AS OVELHAS E O PASTOR…
Jo 10,1-11
O povo da Bíblia é um povo nômade, ou seminômade, que vai onde o leva o seu rebanho. Por isso é um “Povo em Caminho” ou do “Caminho”. Arma suas tendas em cada parada. Quando no período de seca se aproxima dos rios e suas margens; quando no tempo das chuvas se põe a caminho pelo deserto. Num determinado momento, provavelmente na primavera fica mais tempo no acampamento, por ser a época em que as ovelhas mães estão prenhas e nascem os carneirinhos; também é a época da tosquia em que os pelegos são tirados, é tempo de festa. O Deus de Abraão, Isaac e Jacó é também um “Deus do Caminho”, caminha com o povo de acampamento em acampamento. Arma “A Sua Tenda”. É neste ambiente que nasce a relação da ovelha e o Pastor. E a noção de Deus como o Pastor do seu Povo. As lideranças do povo são convidadas a conduzir o povo, nos caminhos, como pastores do povo. Ezequiel 34 nos mostra como é esta relação e dos maus pastores. É por isso, o anúncio de que Deus suscitaria um Pastor que conduziria o seu povo. (Ez 34,23)
O autor do Salmo 23(22) é Davi, é também pastor de ovelhas, filho de pastores, e que mais tarde seria conhecido como “Rei Pastor” de Israel, afirmou tacitamente: “O Senhor é o meu Pastor”. As maravilhosas imagens do relacionamento entre Deus e o homem, que repetidamente as Escrituras nos fornecem, são as de pai e filho, pastor e ovelha. No Salmo Davi está falando não como pastor, embora fosse pastor – mas como ovelha, membro de um rebanho. Ele disse com forte sentimento de orgulho, devoção e admiração. Era como se virtualmente estivesse se gabando em voz alta: “Vejam quem é meu Pastor – meu dono – meu administrador” “O Senhor”. Afinal, ele sabia por experiência própria, que a sorte de uma ovelha dependia grandemente do tipo de pessoa que fosse o seu dono. Alguns pastores eram bondosos, mansos, inteligentes, corajosos e altruístas em sua dedicação ao rebanho. Sob o cuidado de certos pastores as ovelhas teriam que lutar, passar fome, sofrer dificuldades sem fim. Aos cuidados de outro, elas se desenvolviam e cresciam satisfeitas. Portanto, se o Senhor é meu pastor, devo conhecer algo de seu caráter e compreender um pouco sua capacidade. O que Javé era para seu povo do Antigo Testamento (Sl 23), Jesus o é para os seus. A relação Pastor-ovelhas é sintetizada pelo mútuo conhecimento. Conhecer Jesus e ser conhecido por ele não se reduz a simples teorias sobre ele. Para o povo da Bíblia, conhecer se traduz em experiência e presença ao mesmo tempo. Conhecê-Lo, portanto, é experimentá-Lo como presença que liberta e dá a vida. Em Cristo ele demonstrou no Calvário, o profundo desejo de seu coração de tomar os homens sob seus cuidados. Ele próprio recebeu a penalidade devida à perversidade dos homens, declarando abertamente que “todos andávamos desgarrados como ovelhas: cada um se desviava pelo caminho, mas o Senhor fez cair sobre Ele a iniqüidade de nós todos” (Is 53,6) Eu pertenço a Ele, porque me comprou de novo e a um preço incrível – o de sua vida imolada e seu sangue derramado. Portanto, Ele estava capacitado a dizer: “Eu sou o bom Pastor. O Bom Pastor dá a vida pelas ovelhas”. Ele veio para libertar os homens de seus pecados, de si próprios e de seus temores. E as pessoas assim libertas o amaram com forte senso de lealdade. É Ele quem insiste em afirmar que é o Bom Pastor, o Pastor compreensivo, o Pastor interessado, que ama tanto, que vai ao ponto de buscar, salvar e restaurar os perdidos – Nunca hesitou em deixar claro que sempre que alguém se colocasse sob sua orientação e controle, haveria um novo e singular relacionamento entre ele e essa pessoa. Existe algo de muito especial em pertencer a este Pastor. Adquirimos uma marca que nos distingue do restante da multidão. Como Jesus, seus seguidores também estão chamados a ser pastores. A Igreja como Comunidade missionária experimenta que o Senhor tomou a iniciativa, precedeu-a no amor. (1Jo 4,10), e, por isso, ela sabe ir à frente, tomar iniciativa sem medo, ir ao encontro, procurar os afastados e chegar às encruzilhadas dos caminhos para convidar os excluídos. Vive um desejo de oferecer misericórdia, fruto de ter experimentado a misericórdia infinita do Pai e sua força difusiva. Com obras, e gestos, a Comunidade missionária entra na vida diária dos outros, encurta as distâncias, abaixa-se se for necessário – até a humilhação e assume a vida humana, tocando a carne sofredora de Cristo no povo. Os evangelizadores contraem assim “O cheiro de ovelha”, e “estas escutam a sua voz” (E.G. nº 24). “E haverá um só rebanho e um só Pastor”. Jo 10,16
Frei Filomeno dos Santos O.Carm.