Eu não sabia o significado de seus discursos ou de suas parábolas, até quando Ele não estava mais entre nós.
Mais ainda, eu não compreendi, até que suas palavras tomaram formas vivas diante de meus olhos, e se transformaram em corpos que caminham na procissão de meus próprios dias.
Deixai-me dizer o seguinte:
Uma noite, enquanto eu me encontrava pensando, e recordando suas palavras e seus feitos, para escrevê-los em um livro, três ladrões adentraram minha casa.
Embora soubesse que eles vieram despojar-me de meus bens, eu estava absorto demais no que estava fazendo para enfrentá-los com a espada, ou até mesmo dizer: “O que fazeis aqui?”
E continuei escrevendo minhas recordações do mestre.
Depois que os ladrões se foram, lembrei-me de seu dizer: “Aquele que vem para levar vosso manto, deixai que leve vosso outro manto também.”
E compreendi.
Enquanto eu permanecia sentado, registrando suas palavras, nenhum homem poderia ter-me impedido mesmo que me levasse todas as posses.
Pois, embora desejasse resguardar minhas posses e minha pessoa, eu sei onde está o tesouro maior.
* * *
As palavras inspiradas desse seguidor de Jesus nos fazem pensar sobre os tempos que vivemos no orbe terreno.
Num dia temos, no outro não temos mais. Momentos de abundância financeira alternam-se com os de escassez profunda.
O que é nosso realmente? O que nos faz possuidores de algo na Terra?
Tudo, por vezes, parece escorrer de nossas mãos tão facilmente!…
É difícil entender a posse, quando falamos dos bens materiais. Tudo aquilo que julgamos possuir, pode, de repente, pertencer a outro, ou a ninguém mais.
Estão aí as grandes calamidades levando tudo das famílias. Aí está a violência assaltando nossa vida. Tudo aquilo que despendemos tanto tempo para conseguir.
Tendo em mente apenas a visão material da vida, temos motivos para a revolta, para a indignação.
Porém sabemos que a vida não é isso, assim como sabemos que nós não somos o corpo de matéria bruta vislumbrado no espelho.
Somos muito mais… Assim como a existência o é.
Desta forma entendemos esta aparente despreocupação do Mestre, em relação ao Seu manto, quando afirmava: Aquele que vem para levar vosso manto, deixai que leve vosso outro manto também.
O manto era algo importante, um bem de necessidade básica, e mesmo assim a visão espiritual da vida diz: é apenas um manto.
Nosso tesouro maior está na alma, e este ninguém pode arrancar de nós.
As conquistas que fazemos no campo do intelecto; o alcance das virtudes; os amores que cultivamos ao longo do tempo – nada pode ser retirado de nós.
Evitemos assim apego excessivo às posses que o planeta oferece.
Se a violência bater à nossa porta, deixemos que leve tudo, sabendo que nossa dignidade sempre permanecerá intacta.
Não arrisquemos a oportunidade bendita da existência, por um veículo, por algumas joias ou por uma grande quantia em dinheiro.
Nada vale tanto quanto a chance de estar encarnado na Terra. Nada vale tanto quanto a convivência com quem amamos.
Redação do Momento Espírita, com citação do cap. Davi,
um de seus seguidores, do livro Jesus, de Gibran Khalil Gibran,
ed. Ediouro.
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