Deusdete Ferreira de Cerqueira, 92 anos, chegou a Paranavaí em 1952, vindo de Monte Alegre, Bahia. Como nunca fugiu de um bom combate, já na chegada enfrentou o desafio de ter a mala desviada, portanto, ficou sem os seus poucos pertences pessoais. Em outras palavras, literalmente chegou apenas com a roupa do corpo. Venceu. É agropecuarista consolidado, presidiu a Sociedade Rural e coroou sua trajetória se elegendo prefeito no ano 2000, comandando a maior cidade do Noroeste por quatro anos. Concluído o mandato em 2004, adotou a discrição, retomando a vida simples de sempre.
A dificuldade do distante dia da chegada virou estímulo. A coragem para trabalhar permitiu que Deusdete encarasse o serviço. Derrubou mato na foice e no machado, lavou roupa da peonada para ganhar um dinheiro extra. Também foi dono de bar e de açougue.
Voltou à Bahia para se casar com a Dona Raquel, sua companheira de tantas décadas. Voltou e encontrou o seu caminho profissional na pecuária. Comprando e vendendo gado, tornou-se fazendeiro. Foi além, viajando o Brasil inteiro como dono de animais campeões da raça Indubrasil e depois vieram tantas outras raças e tantos animais de elite.
Tem na sua casa uma sala para os troféus, conquistados em décadas na lida do campo. Viajou o Brasil todo em exposições agropecuárias, apresentando o seu rebanho de qualidade incontestável.
Em 1988 era vice-presidente da Sociedade Rural do Noroeste do Paraná. Nesta condição, assumiu o posto de presidente quando o titular Carlos Bergamini se afastou para disputar a Prefeitura de Paranavaí (o vencedor daquele pleito foi o empresário Rubens Felippe).
A Rural foi o grande trampolim para a sua popularidade. Deusdete é citado como o grande “fazedor”, tendo construído parte importante da infraestrutura do Parque de Exposições Arthur da Costa e Silva. Ele chama a atenção para a arena de rodeios e shows com arquibancada coberta. “Se o rico podia ficar no conforto, o pobre também tinha direito”, resume. Em outras palavras, o parque tinha de ser para toda a comunidade e por isso pensou na cobertura da arena.
Política – Deusdete ganhou fama nas suas gestões da Rural e foi “convocado” para ser candidato a prefeito. A primeira peleja foi em 2006, quando acabou perdendo para Teruo Kato. A revanche veio quatro anos depois. Numa disputa ferrenha, o “Negão” como era chamado pela própria campanha e admiradores, venceu Teruo por 148 votos.
Começa o desafio de administrar Paranavaí. Homem de poucas letras, mas com uma larga experiência, Deusdete administrou a cidade com os seus valores: honestidade e trabalho. Fez muitas coisas, com ênfase para a Educação.
Concluído o mandato, Deusdete voltou para a sua vida simples. Continuou a frequentar os lugares da vida toda e a conversar com “todo mundo”. Uma das suas alegrias é andar pelas ruas e ouvir o reconhecimento da população. Acredita ser natural que nem todos gostem do seu jeito de ser. Porém, uma coisa é certa para o decano da política paranavaiense: “Todos têm que me respeitar, pois eu sou honesto”.
A política passou na vida de Deusdete como algo sem grandes vaidades. Tanto que ele crava que não valeu a pena ser prefeito. Justifica que custou caro, pois gastou parte dos seus bens para viabilizar a candidatura.
Aconselha o jovem a estudar e exercer uma profissão com honestidade. Na política, antecipa, não há como ganhar dinheiro sem ser desonesto.
Na entrevista ao Diário do Noroeste, Deusdete fala das suas origens, da dificuldade do trabalho pesado na década de 1950 e da trajetória que o tornou um vencedor na vida pública e, sobretudo, em família. Entrevista concedida na residência da família, dia 16 de julho. Ele afirma que está bem e aos 92 anos continua a levantar 5h30 da manhã. Toda a entrevista, com detalhes da sua trajetória, está disponível no site do DN.
História – Em 1952, aos 22 anos, o pioneiro Deusdete Ferreira de Cerqueira deixou Monte Alegre, na Bahia, e viajou de trem de Mundo Novo até a divisa com Minas Gerais, onde subiu em um caminhão pau de arara que parava em qualquer lugar onde alguém acenasse com a mão. Mais adiante, entrou em outro trem na divisa com São Paulo.
Depois de nove dias de viagem, o pioneiro chegou a Paranavaí em 9 de julho de 1952. A ideia de sair da Bahia surgiu quando Cerqueira ficou sabendo que um irmão do seu cunhado estava morando em Paranavaí. Trabalhou derrubando mato.
Em 1958, Cerqueira deixou o trabalho na mata e usou as economias para comprar o Bar Continental, um dos pontos preferidos da população mais humilde de Paranavaí. O estabelecimento antes pertencia a uma família italiana que veio do Rio de Janeiro. No local o movimento era constante. Além do espaço amplo e das dez mesas de sinuca, a freguesia era atraída por cerveja, whisky, gim, Fogo Paulista, Cinzano, conhaque de alcatrão São João da Barra, cachaça Jurubeba, pinga Tatuzinho, refrigerantes Garoto, cigarros e charutos.
Com a experiência de quem se tornou comerciante na Bahia quando era criança, Deusdete ganhou dinheiro o suficiente para comprar uma casa na Rua Pernambuco e investir em pequenas propriedades rurais.
O casamento – Em 1960, depois de oito anos em Paranavaí, Deusdete Ferreira de Cerqueira foi para a Bahia rever a família. Conheceu a esposa Raquel. Após um mês de namoro, o vínculo de confiança entre os dois era tão forte que decidiram se casar na Bahia com a bênção das duas famílias. Deusdete tinha 30 anos e Raquel Reis, a primeira de uma família de 14 irmãos a sair da Bahia, tinha 18.
(O item “História” foi extraído de David Arioch.com)