THIAGO BETHÔNICO
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Empresas de transportes declaradamente alinhadas ao presidente Jair Bolsonaro (PL) estão liberando seus caminhoneiros de trabalharem no fim de semana da eleição para que eles consigam votar no segundo turno -que acontece no dia 30 de outubro.
Pelas redes sociais, companhias têm compartilhado publicações incentivando outras transportadoras a fazerem o mesmo e defendendo uma mobilização para ajudar a reeleger o atual mandatário, que aparece atrás de seu oponente, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), nas pesquisas de intenção de voto.
Em função do trabalho, muitos motoristas ficam longe de suas seções eleitorais no dia do pleito e acabam não comparecendo às urnas. A ideia das empresas é dar folga aos funcionários para que eles voltem para casa no fim de semana e consigam votar.
“Começou a maior mobilização do Brasil”, diz mensagem que circula em grupos no WhatsApp. “As transportadoras estão mobilizadas para pararem suas atividades no próximo dia 28/10/2022”, continua, sem citar diretamente o voto em Bolsonaro.
Os caminhoneiros foram importante base de apoio de Bolsonaro em 2018, mas o suporte da categoria refluiu nos últimos anos, principalmente com o aumento no preço dos combustíveis. Recentemente, o presidente anunciou a antecipação do auxílio pago aos profissionais autônomos, o que é visto como uma tentativa de impulsionar a campanha pela reeleição entre o grupo.
O governo também trocou a direção da Petrobras após criticar aumentos nos combustíveis e tem pressionado para que o preço do diesel e da gasolina não volte a subir neste mês, apesar da defasagem em relação aos valores internacionais.
Liberar caminhoneiro não configura ilícito, mas postagens, sim, diz MPT Adriane Reis de Araújo, procuradora regional do trabalho, diz que o direito eleitoral proíbe ações que causem embaraço ou inibam pessoas de irem votar. No caso das categorias que trabalham no dia do pleito, o que tem sido acordado é a criação de uma escala compatível com a possibilidade de o funcionário se ausentar para ir à seção eleitoral.
“Vimos que há esta mobilização para liberar os caminhoneiros para que eles votem no segundo turno. A liberação não tem problema, atende a lei eleitoral”, afirma.
O que não pode, ela diz, é a seletividade na hora de decidir quais funcionários terão folga e quais vão trabalhar. “Temos visto algumas falas reforçando que só serão liberados os trabalhadores que afirmam votar em determinado candidato e não em outro.”
Segundo Araújo, esse tipo de prática configura ilícito eleitoral, o que pode gerar proibição de empréstimos em bancos públicos, além de ajuizamento de ação pública com indenização por danos morais e individuais.
Araújo lembra que o MPT (Ministério Público do Trabalho) tem recebido uma enxurrada de denúncias de assédio eleitoral. Segundo ela, já são mais de 900 notificações, sendo que a grande maioria (mais de 700) são referentes apenas ao segundo turno das eleições. “Não sei dizer quantas específicas são de caminhoneiros, mas há denúncias também deste setor”, afirma.
Galeria Veja o que é o assédio eleitoral no trabalho e como denunciar Prometer vantagens ou orientar escolha de voto podem configurar coação de funcionário https://fotografia.folha.uol.com.br/galerias/1746708879071588-veja-o-que-e-o-assedio-eleitoral-no-trabalho-e-como-denunciar * Já as publicações em redes sociais fazendo alusão ou propaganda a determinado candidato, estas, sim, podem configurar irregularidade.
De acordo com a procuradora, a lei eleitoral estabelece que o local de trabalho constitui bem de uso comum. “Hoje não podemos ver a empresa apenas como o lugar físico, também temos que pensar a empresa nesse meio digital. Se há perfis institucionais de uma empresa fazendo propaganda política, isso é totalmente irregular”, diz.
Transportadoras usam redes sociais e apps de mensagem para incentivar folga Uma das transportadoras que tem atuado nas redes sociais para incentivar a folga aos motoristas no dia das eleições é a Rodojunior, localizada na cidade de Rio Verde (GO). Em sua página no Instagram, a companhia republicou diversos vídeos e fotos com referências diretas ao presidente Bolsonaro.
Em uma das publicações, um homem não identificado aparece com adesivos e cartazes de Bolsonaro e diz estar na sede da empresa. “Pessoal, aqui na empresa Rodojunior vão parar todos os caminhoneiros a partir de quinta-feira da semana que vem [27] para fazer a votação”, afirma.
Em outro post, a companhia republica uma imagem com as cores da bandeira do Brasil e os seguintes dizeres “Caminhoneiros com Bolsonaro” e “Vamos parar para votar”.
A mesma imagem também foi compartilhada por outras empresas no Instagram, entre elas a Transportadora Brasil Central e o Grupo Comelli –ambas com sede no município de Rio Verde.
Procuradas pelos telefones que constam no site das empresas, a Rodojunior, a Brasil Central e Comelli não atenderam às diversas tentativas de contato da reportagem nesta quinta-feira (20).
A Folha de S.Paulo procurou transportadoras que aparecem na lista que circula em grupos de WhatsApp para perguntar se pretendem parar as atividades no segundo turno das eleições. Boa parte das companhias é do Centro-Oeste do país, região onde Bolsonaro teve desempenho superior ao de Lula na primeira rodada eleitoral e segue com as maiores intenções de voto.
A Fribon, transportadora com sede em Rondonópolis (MT), confirmou que vai liberar seus 300 motoristas em função das eleições, mas negou que haja um grupo ou entidade organizando a mobilização.
Segundo Rony Cezar Frizon, sócio da Fribon, a companhia não está incentivando o voto em nenhum candidato específico. “Isso daí é livre e espontâneo, [os motoristas] vão votar em quem quiserem”, afirma.
A Transportadora Zaqueu, de Barra do Garças (MT), também aparece na lista e confirmou que vai dar folga a seus 110 motoristas no último fim de semana do mês por causa das eleições.
“A maioria dos motoristas nossos residem aqui no município de Barra do Garças, então eles passarão o fim de semana em casa mesmo”, afirma Diego Negreiro, gerente de RH na Zaqueu. Segundo ele, a empresa, que trabalha principalmente com transporte de grãos, não incentiva o voto em candidatos. “Vai de acordo com a opção e escolha do empregado”.
Também de Barra do Garça (MT), a Transportadora Martelli, citada na mensagem de Whatsapp, negou que vá participar da mobilização. À reportagem, uma funcionária disse que a empresa não coloca empecilho nenhum para que seus motoristas compareçam às urnas, mas desconhece qualquer orientação para dar folga aos funcionários do dia. No caso de caminhoneiros que votem em municípios distantes, ela diz, fica a critério do motorista se programar para comparecer à seção eleitoral.
Quem também está na lista mas afirmou que não pretende abrir exceção por causa do segundo turno é a Borgno, de Goiânia. Segundo Henrique Borges, diretor de controladoria da transportadora, não há nenhum comunicado formal com este tipo de orientação.
“Nós trabalhamos com cargas expressas e nossos compromissos, na verdade, são determinados pelos nossos clientes. Se o cliente determina que a carga tem que chegar determinado dia, o compromisso nosso é entregar”, afirma.
ONDE DENUNCIAR ASSÉDIO ELEITORAL:
Site do MPT: mp.br/pgt/ouvidoria Pelo aplicativo MPT Ouvidoria, para dispositivos Android Pelo aplicativo Pardal, que também se comunica com o MP Eleitoral, para IOS e Android No sindicato de cada categoria No Ministério Público Federal, neste link Nas procuradorias regionais; veja aqui os contatos no estados
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