Renato Benvindo Frata, advogado, contabilista, professor universitário aposentado e presidente de honra da Academia de Letras e Artes de Paranavaí
A vida é como a brisa matinal. Às vezes, nos parece suave, agradável, sugestiva, que nos incita ao fazer, ao sonhar e, enlevados nesses prazeres, imaginamos. Às vezes, nos parece rude, frívola e difícil como vento gelado em manhã molhada de inverno, a parecer que tudo à nossa volta se compõe de espinhos.
Somos, nos momentos de brisa leve, como jardins visitados pelos zum-zuns das abelhas em que o perfume das flores se mistura aos seus zumbidos, a fazer música.
Nos momentos maus, porém, – valha-nos Deus! – parece que tudo à nossa volta ganha ares de desassossego permeado de espirros, tosses, encolhimentos e mais sensações adversas.
Nessa relação flor-abelha (que faz os bons momentos), há um quase segredo: mesmo que possa parecer impossível, flor e inseto se comunicam e, nisso, ambos mantêm uma sintonia mutualística que os beneficia por igual. É o ganha-ganha na relação de troca: a abelha ganha o alimento provido pela flor e a flor ganha a tão necessária e sonhada polinização, feita pelas patinhas e corpo do inseto, a pisar em seu nectário. Dessa maneira, nessa sociedade de favores, ambas preservam os ecossistemas produtivos e a si próprias.
Mas, afinal, qual a relação flor-abelha com a nossa vida e a brisa matinal do verão, ou com o vento úmido e gelado de inverno?
Nada e tudo, eu diria.
Nada, se levarmos em consideração que tanto a nossa vida, como os ventos, são feitos de momentos, assim como as visitas das abelhas às flores; e que esses momentos, por serem tão rápidos, podem passar despercebidos como o ato da abelha ao sugar o néctar, ou a passagem do ar matinal em nossos rostos, quer em dia quente, quer em dia frio, a depender de nosso estado de ânimo ao olhar e aceitar ou gostar.
E tudo, quando esses momentos, pela nossa percepção, conseguem ser marcantes em sua passagem. Nela ficarão rastros como as pegadas de um ontem que guardamos nítidas e sintonizadas na memória, apesar do tempo que possa ter passado.
Da somatória desses momentos nascem nossas escolhas, mesmo que o sejam apenas pelo gosto momentâneo de um encontro, ou por interesse, a exemplo das abelhas que, ao saírem a beijar flores, buscam alimento.
No mais das vezes, porém, a sensação lúdica que a brisa matinal proporciona, mesmo que em lanços mais frios que os comuns de verão, põe-nos prazer quando a elas, em um relance, abrimos nossos braços como um abrir de pétalas a recepcioná-las, ao aguardo de sua visita.