Natural da Síria, o patriarca Antônio Felippe desembarcou em Paranavaí vindo de São Sebastião do Paraíso, Minas Gerais, divisa com o Estado de São Paulo. Trouxe sonhos e esperança; trouxe também família
ADÃO RIBEIRO
Certa vez um integrante da família me disse de forma bem humorada que tinha Felippe para todos os gostos: com dois ou com apenas um “p”. Neste espaço padronizaremos como “pp”, na dificuldade de checar caso a caso. O despretensioso esclarecimento sobre o “p” no lugar certo é só o fio condutor de uma história longa que começa em solo paranaense na virada da metade do século 20, em 1955.
Da chegada de Antônio Felippe (o patriarca) a Paranavaí até a perda do último representante com imagem pública local e empresarial da chamada velha guarda, ou seja, filhos de Antônio, um longo percurso com vitórias, derrotas, alegrias, tristezas, e sempre com o mesmo espírito: presença na comunidade. Edson “Salomão” faleceu na sexta-feira, 24 de janeiro de 2025.
Nascido na Síria, no Oriente Médio, Antônio Felippe (a rua com o seu nome tem um “p” só) desembarcou em Paranavaí vindo de São Sebastião do Paraíso, Minas Gerais, divisa com o Estado de São Paulo. Trouxe sonhos e esperança. Fundou um hotel onde hoje funciona a agência do Bradesco.
Antônio casou-se com Isbela Ribeiro Felippe, constituiu família. Com o falecimento de Salomão, as irmãs Edmeia, 93 anos, e Marly, 83 anos, frutos dessa vida em comum, são agora as representantes dos nove filhos. Os demais já cumpriram as suas missões.
Detalhando: Antônio também foi pai de Ibrahim, nascido na Síria, já falecido e que se estabeleceu no Brasil vindo com o pai. O segmento familiar é radicado em Altinópolis, interior de São Paulo, perto de São Sebastião do Paraíso, Minas Gerais.
EMPREENDIMENTOS – A perda de Salomão representa o fim de um ciclo, pois ele era o último dos diretores da antiga Casas Felipe, rede que chegou a ter 41 lojas no Paraná, São Paulo e Mato Grosso do Sul.
A empresa foi constituída por Geraldo Felippe, pouco depois de chegar ao município em formação. Com Geraldo vieram para essa jornada de sucesso os irmãos José “Tequinha”, falecido em 30 de janeiro de 2007 aos 81 anos; Rubens, que foi prefeito de Paranavaí de 1989 a 1992, falecido no dia 16 de dezembro de 2024 com 90 anos; Jáber, morto em 14 de fevereiro de 2024 com 84 anos, além de Salomão, falecido aos 87 anos.
Diante dos novos desafios do mercado varejista, a rede de lojas foi vendida para o Magazine Luiza, uma das gigantes do setor no País, em agosto de 1996.
SEQUÊNCIA – Ex-prefeito de Paranavaí (gestão 1993/1996) e filho de Tequinha, José Augusto Felipe concorda que a recente perda do seu tio Salomão coloca fim a um ciclo da história familiar. Conclusão de uma etapa longa com militância na política, em associações sem fins lucrativos – Associação Comercial e Atlético Clube Paranavaí (ACP) -, entre tantas outras entidades, e muito trabalho na geração de emprego e renda. Da política aos negócios, passando pela responsabilidade social, há traços de Felippe por toda a cidade.
O fim de um ciclo representa também a abertura ou a continuidade de novas etapas. Por isso, José Augusto detalha que a história da família segue em frente, notadamente na forma de legado deixado para filhos, netos, bisnetos e para a cidade, muitas vezes espelhada nesses exemplos. São profissionais de diversas áreas. Já decano do seu núcleo familiar, José Augusto, por exemplo, é engenheiro civil.
Aliás, o recomeço é outra marca que envolve os irmãos de saudosa memória. Geraldo Felippe, por exemplo, fundou a avícola aos 70 anos de idade e participou de todo o projeto de implantação da avicultura no Noroeste. Inaugurado oficialmente em 1995, o frigorífico de aves pertence atualmente a um grupo empresarial do setor com projeção nacional, a exemplo do que houve com a rede de lojas.
“Tequinha”, numa avaliação de memória, era discreto e gentil. Alguém mais se lembra do seu andar sem pressa?
Rubens era homem de decisões rápidas. Ensinava que a pessoa pode até tomar um posicionamento menos adequado, mas precisa decidir e assim manter os impactos sobre controle.
Jáber foi narrador esportivo de destaque por 20 anos e cobriu o ACP por várias temporadas. Era fã de futebol e vestia a camisa do Vermelhinho. Consta que virou folclore na cidade o chamado “Gol Aleluia” narrado com bom humor e uma pitada de crítica ao time da época (década de 1980). Foi um gol marcado pelo ACP após o jejum de várias rodadas sem balançar as redes.
Salomão foi presidente do Vermelhinho e jogador profissional do clube. No Harmonia Country Club jogou bola por décadas. A principal característica era o cabeceio, quase um chute, diziam os colegas.
Certo é que a marca Felippe se tornou muito forte em todo o Noroeste. Na cidade de Paranavaí, uma derivação do nome virou coletivo de Felippe: quem já viveu cinco ou mais décadas vai se lembrar que era comum entre os anos 1980 e 2000 ouvir a expressão “Lá vem a felipada”. O termo era usado tanto de forma positiva pelos admiradores, quanto de maneira negativa por parte dos críticos (a política tem dessas coisas). Certo é que, em alguma medida, a marca ajudou a forjar Paranavaí com as suas carências e virtudes.