IDIANA TOMAZELLI E RENATO MACHADO
DA FOLHAPRESS
O governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) encaminhou ao Congresso Nacional um projeto de lei que autoriza a Receita Federal a deixar de punir contribuintes que tenham uma espécie de selo de bom pagador de tributos, caso eles deixem de cumprir momentaneamente alguma obrigação junto ao Fisco.
A iniciativa cria a chamada “classificação de conformidade”, baseada em critérios como regularidade do cadastro e do recolhimento dos tributos, exatidão das informações prestadas, entre outros itens definidos pela Receita Federal.
A classificação será adotada no âmbito do Programa Confia, que está em fase de implementação e deve começar a operar no segundo semestre deste ano. Quanto melhor for a nota e a reputação das empresas, mais benefícios elas terão. Um dos incentivos é a possibilidade de autorregularização, isto é, o contribuinte reconhecer que não pagou algum tributo devido e efetuar o recolhimento sem ser punido.
O projeto diz que a Receita pode “deixar de aplicar eventual penalidade administrativa” nestes casos. Hoje, a multa de ofício aplicada pelo órgão em caso de não pagamento de algum tributo é de 75% do valor do crédito. O percentual é dobrado em caso de fraude.
O texto traz os princípios de funcionamento da classificação dos contribuintes, que poderá ser aplicada a diversos programas de conformidade -incluindo algum eventualmente voltado a varejistas chinesas como a Shein, que estiveram no centro da recente polêmica em torno da tributação das remessas ao Brasil. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse em abril que essas companhias devem aderir a um “código de conformidade” da Receita Federal.
A proposta foi incluída no texto que busca substituir a MP (medida provisória) que retoma o voto de desempate no Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais). O tribunal julga disputas bilionárias entre empresas e a União em torno do pagamento de tributos. A mensagem presidencial que registra o envio do projeto de lei foi publicada nesta sexta-feira (5) no Diário Oficial da União.
A MP era um dos principais itens do pacote de ajuste fiscal apresentado por Haddad em janeiro. No entanto, o texto passou a enfrentar resistências de grandes empresas e do Congresso Nacional. Sua tramitação também acabou sendo afetada pela queda de braço em torno do rito de tramitação das medidas provisórias.
Por isso, o governo substituiu a MP do Carf (que tinha vigência imediata, mas precisava ser validada até 1º de junho) por um projeto de lei, que demanda menor urgência para a discussão e só passa a valer após a votação no Congresso. A troca ocorreu a pedido do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), que, por sua vez, se comprometeu a votar a proposta em um prazo de duas semanas.
Ao enviar o projeto de lei, o governo aproveitou para incluir o trecho que detalha a classificação de conformidade e a possibilidade de criar programas específicos, focados em incentivar empresas ou setores a manter relação menos litigiosa com a Receita.
O programa federal é inspirado no “Nos Conformes”, criado pelo estado de São Paulo em 2018, ainda na gestão de Geraldo Alckmin -hoje vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços.
A conformidade cooperativa entre empresas e Fisco existe países desenvolvidos como Estados Unidos, França e Portugal, e sua adoção vem sendo recomendada pela OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico) desde 2013.
Além da não aplicação de punições, o projeto prevê que os programas de conformidade poderão oferecer aos contribuintes orientação sobre o recolhimento de tributos e procedimentos aduaneiros, prioridade na análise de processos administrativos (inclusive quando há pedido de restituição ou ressarcimento de valores) e atendimento preferencial na prestação de serviços.
Para afastar a aplicação das punições, a proposta exige que o contribuinte apresente de forma voluntária “atos ou negócios jurídicos relevantes para fins tributários” antes do início do procedimento fiscal. Outra