Renato Benvindo Frata
Na frente da minha casa há um jasmineiro plantado há muito, desde o início do loteamento e que hoje serve de abrigo a vários pássaros. É o Grande Hotel Jasmim, denominação que dou pela quantidade de aves que abriga, enquanto o sol escorrega no horizonte. Digamos, um albergue da natureza.
Não saberia dizer a quantidade de hóspedes que recebe, nem suas espécies, mas há entre eles os que estão de passagem e os que fazem dela um lugar cativo como mensalistas – constroem seus ninhos e a ela permanecem ligados desde a postura, até o primeiro voo das crias no seguimento da vida.
Da maneira como chegam, à tarde, se vão pela manhã. Voam, mas não antes de ficarem um tempo em alegria canora como a saborear café quente na companhia de amigos, afinal, bom papo é aquele que se divide com a alma descansada depois de uma noite bem dormida; e mentiria se não contasse tudo: há ali também os que reclamam – não da hospedagem, mas resmungam como certas pessoas que se queixam disso e daquilo logo pela manhã, e pintam tristeza no dia. São maritacas que não se contentando com a alegria alheia, azougam a conversa com regougares estridentes que em nada afetam a alegria geral. E nessa toada, cada um dá ao microfone o que tem na goela. São vozes de pombas, rolas, pardais, bem-te-vis, canários da terra, um ou outro sanhaço e até trinca-ferros que satisfazem os ouvidos de quem sabe ouvir.
A rua não é muito de pedestres, de modo que os restos expelidos pelos peregrinos se espalham pelo gramado sem manchar as costas dos passantes, e o que mais me atrai nesse jasmineiro é sua capacidade de agradar: ele flore por mais de mês na primavera iniciando nos finais de setembro para varar outubro, época especial em que as aves chocam seus ovos de modo que, os filhotes, além de serem recebidos com flores magníficas a lhe enfeitarem o quarto-casa, ganham de presente um especial perfume: há quem diga que o olor de jasmim se aproxima ao de mirra, ingrediente nobre da perfumaria mundial tornado sagrado pelo Novo Testamento.
Tento descrever com simplicidade essa árvore cuja madeira não serve para encabar o machado que um dia possa lhe cortar o tronco, nem para móveis domésticos, cabos de raquetes, cochos, corpos de violinos ou forros de varanda, mas traz consigo aquilo que todos nós poderemos ter se pensarmos no coletivo: ela nos fornece amor como sombra fresca, folhas grandes e fáceis de varrer, de palco livre de onde expandem sons maviosos, e flores – muitas -, com o especial perfume do acolhimento a quem a procure, para proteção.
Ao humanizar essa árvore simples do nosso jardim, ouso dizer que ela tem um potente e arrojado coração, especialmente se compará-la aos homens que a cada dia mais se endurecem, se brutalizam, se isolam em mutismo a se esquecem da beleza das manhãs.