Desde que os produtores de mandioca passaram a ser remunerados pelo teor de amido (renda) e não pelo peso total da raiz – isto há uns dez anos –, indústrias e produtores discutem qual a melhor forma de tirar a renda do tubérculo. Nas últimas semanas esta discussão ganhou as reuniões do Sindicato das Indústrias de Mandioca do Paraná (SIMP), que vem trabalhando em busca de um modelo uniforme e que não prejudique nem o produtor e nem a empresa.
Pelo sistema atual, a renda por tonelada de mandioca é auferida através de uma balança hidrostática, onde se mergulha 5 quilos do produto seco. O resultado desta pesagem (que elimina quantidade de água existente na raiz) determina a renda, que geralmente varia entre 280 e 650 gramas. A remuneração ao produtor é feita com base nesta renda. Se a renda for de 500 gramas e o preço estiver, por exemplo, R$ 1,50/grama, o valor a ser pago é de R$ 750,00 a tonelada.
Como o teor de amido é muito variável, as indústrias costumam tirar a renda de mais de uma amostragem e pagar pela média. No entanto, como não existe um padrão, cada indústria aufere a renda de seu jeito, que pode variar de duas e sete amostragens.
O tema chegou a ser discutido em agosto do ano passado, na Câmara Setorial da Cadeia Produtiva da Mandioca e Derivados, onde o pesquisador Mário Takahashi, do polo de pesquisa de Paranavaí do Instituto de Desenvolvimento Rural do Paraná (IDR-PR), antigo IAPAR, apresentou uma proposta de normatização para determinação do rendimento industrial (renda) das raízes de mandioca.
Na sua apresentação, Takahashi lembrou que “no mesmo peso na água matéria seca poderá variar 39,43 a 46,43% (diferença de 17,8%)”. Esta variação acontece em razão da época de coleta e desenvolvimento das raízes, a variedade e ainda as condições e eventos climáticos, como geada, estiagem, chuvas, etc. Além disso, mostrou um estudo da grande variação entre as variedades entre raízes de primeiro e segundo ciclos.
Em sua palestra o pesquisador fez algumas propostas para discussão do setor, dentre as quais a padronização do peso inicial das amostras de 5 kg; amostragem aleatória (mecânica) das raízes independente do operador; uso de água limpa e raízes lavadas; não utilizar raízes podres ou azuladas; e raízes muito grossas e ocas devem ser cortadas.
O que dizem os industriais – De uma maneira geral, o modelo atual é contestado pelos industriais. Eles lamentam que na entressafra com a redução da oferta da raiz, como está acontecendo agora uma ou outra empresa aumenta artificialmente a renda para remunerar o produtor como ele deseja, como diz o conselheiro do SIMP, Roland Schurt, diretor da Amitec. A forma mais comum, é tirar a renda de várias amostras e desprezar as de menor teor de amido elevando artificialmente a remuneração ao produtor, promovendo uma concorrência desleal no setor.
“Quem garante que a indústria que hoje paga mais ao produtor não vai pagar menos quando houver excesso de oferta? Assim como hoje ele despreza a amostragem com a menor renda, amanhã ele pode desprezar a de maior”, diz a diretora da Amifec. Tatiane Lopes Alle.
Schurt relata que na sua indústria são tiradas duas amostragens de uma carga de até 15 toneladas para tirar a renda e acima desse volume três ou quatro amostras. “Pagamos pela média. Estas amostras são coletadas aleatoriamente. Ninguém escolhe as raízes. Na balança (onde geralmente é tirada a renda) tem um funcionário de confiança e a pesagem sempre é feita na presença do produtor”, diz.
O diretor da Amitec acompanha as discussões no SIMP sobre modelos diferentes de amostragem para tirar a renda. “Isto acontece por causa da escassez da raiz e pode uma indústria ou outra estar tentando atrair produtores fazendo esta manobra. Mas isso não é bom. Quem faz isso mostra falta de profissionalismo e gera desconfiança entre as indústrias e entre as indústrias e os produtores”, atesta o conselheiro do SIMP.
Ele diz que não conhece uma fórmula 100% eficiente de tirar a renda que possa ser adotada como modelo. Na sua opinião, mais importante que o modelo é encontrar o consenso. “Pode ser quatro, cinco amostras, não interessa. O importante é chegar num consenso”, diz. Ele se mostra particularmente preocupado com a perda de credibilidade do setor com estas divergências.
A solução definitiva, aponta Schurt, é um equipamento capaz de coletar as amostras de forma automática, sem a manipulação humana. “Já ouvi dizer que existe uma máquina assim. Temos que ir atrás dela. Vai ser vantajoso para todos os lados”, conclama.
“Maravilhoso” – Na Amifec, para tirar a renda da mandioca, são realizadas três amostragens com raízes diferentes (grossas finas, maiores menores) e o pagamento é feito pela média. “Assim é justo para os dois lados”, defende Tatiane Lopes Alle.
Ela lamenta que alguns produtores usam de má fé e misturam junto com raízes de alto teor de amido, outras comprometidas com doenças ou isoporisadas. “As vezes só 30% da carga são de mandioca boa. A diferença na renda média pode chegar 70 pontos. É muita coisa”, aponta.
A industrial defende uma padronização na aferição do teor de amido e indica tirar a renda de até sete amostragens e não fazer nenhum descarte. “A curto prazo vai ao menos minimizar a polêmica”, acredita.
Ela também defende a automatização do setor com a coleta das amostras sendo feita aleatoriamente e sem a interferência humana. Até porque, lembra Lopes, o responsável pela renda sofre uma grande pressão para melhorar a renda artificialmente, escolhendo raízes melhores como se a carga fosse uniforme e não raramente recebe ofertas de vantagens indevidas para dar um melhorar falsamente a renda”.
“Temos que dar o máximo de transparência e acabar com o conflito entre as empresas e com os produtores”, defende Lopes. Ela considera “maravilhoso” que o setor esteja fazendo este debate. “É boa esta discussão, ela vai nos levar a uma solução”, acredita.
O conselheiro suplente do SIMP, Alcides Yamakawa, também defende uma padronização para evitar a concorrência desleal. “Pagam mais sem aumentar o preço, só dando um jeitinho na renda”, diz. Ele considera o atual modelo antigo e acredita que a solução está na coleta das amostras aleatória e por máquina.
Yamakawa lembrou que algumas empresas já tem um sistema semiautomático de tirar a renda. Para ele é preciso que técnicos visitem estas empresas para servir de modelo para novas formas. “Tem que melhorar o sistema e acabar com esta forma artificial de elevar a renda”, defendeu.
Na última reunião do SIMP, quando o assunto era discutido, o presidente João Eduardo Pasquini revelou que foi encomendado ao Senai um estudo para buscar alternativas de auferir a renda de forma mais automatizada. “Não comentamos antes, porque ainda não temos nenhuma resposta do Senai. Mas estamos torcendo para que os técnicos consigam uma forma moderna e mais eficiente de tirar a renda da mandioca”, disse o presidente.