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Jerônimo no Albergue Municipal de Cachoeirinha
Jerônimo no Albergue Municipal de Cachoeirinha

INCLUSÃO

Invisíveis têm sentimentos e desafiam a solidão

Moradores de rua enfrentam suas dores que afloram mais no período natalino

Na época em que as ruas se enchem de luzes e vitrines lembram tradições familiares, há quem busque silêncio, abrigo ou apenas uma palavra. Entre eles, dois homens contam como enfrentam o Natal à margem do que muitos consideram normal.

Jerônimo Camargo tem 39 anos. Natural de Nova Prata (RS), vive atualmente nas ruas de Cachoeirinha, na região metropolitana de Porto Alegre. Pintor de profissão, ele se afastou da família após conflitos, que prefere não comentar, e depressão. Há três anos, quando uma grande rede fechou sua unidade física no RS, trocou o conforto da casa pelo chão da cidade.

Em datas como o Natal, Jerônimo tenta se desconectar. Descreve a noite como mais uma, embora o peso da ausência da família se torne mais evidente.

“Eu tento não pensar. Faço de conta que é uma noite qualquer. Já passei noites de Natal na rua, sem dormir, reciclando, bebendo. A bebida me ajudava a esquecer”, conta. Ele lembra que, mesmo nessas noites, ouvia buzinas, recebia saudações e doações. “Ganhava comida, ouvia um ‘Feliz Natal’. Ainda tem pessoas boas.”

Emerson “Salame” nas ruas da Guarda do Embaú

No ano passado, ele tentou se reaproximar da família. Viajou a Nova Prata para o Natal. Mas não se sentiu acolhido. “Fizemos a Ceia às 10 da noite e logo todo mundo foi dormir. Me senti como se estivesse na rua. Acabei voltando.” Pesou também a dependência de uma irmã por álcool. Já na caminhada para recomeçar a vida longe do vício, achou melhor retornar para as ruas de Cachoeirinha.

Desde então, busca tratamento e quer recomeçar. “Para o Natal de 2025, se Deus quiser, eu vou passar trabalhando. Eu estou voltando para Florianópolis. Trabalhei lá há 8 anos”, destaca. Jerônico ficou 21 dias internado em tratamento no Hospital de Tapes, no RS, para se desintoxicar e aprender a viver sem o álcool. “E foi muito bom”, afirma. Em Cachoeirinha, nos dias mais difíceis, sempre contou com o apoio do Albergue Municipal na cidade.

Do outro lado do Sul do Brasil, Emerson José Zabott vive outra forma de itinerância. Artesão de 51 anos, ele mora em Palhoça (SC), na Guarda do Embaú, praia paradisíaca conhecida mundialmente como a 9ª Reserva Mundial do Surf. Há 26 anos mora na rua e ao longo da vida percorreu o Brasil vendendo pulseiras, colares e peças feitas à mão. Desde que perdeu os pais, há quatro anos, passa o Natal longe da cidade onde nasceu.

“Minha mãe faleceu dia 22 de dezembro. Depois disso, não voltei mais para casa. Agora é eu, o Peter e a Cindy Lauper”, diz, referindo-se aos dois cães que o acompanham. Para Emerson, a rua também oferece laços. “A família de verdade é a que tu encontra na estrada. A gente se junta, faz um peixe, divide o que tem.”

É pelas poucas ruas do centrinho da vila da Guarda, que Emerson, conhecido como Salame, passa seus dias. O apelido veio da infância, quando pegou a produção dos pais e fugiu com amigos para um acampamento. Em setembro desse ano, a renda que obtém com a venda do artesanato e ajuda da comunidade, conseguiu alugar um espaço para ele os cães.

“Já tive carro, já tive casa, já tive um monte de coisa. Mas a vida que eu levo agora, por exemplo, eu estou a três quadras da praia”. Emerson diz que o Natal seguirá sendo vivido na rua. “Minha casa é onde eu e meus cachorros estamos. A rua é nossa. Ali é que a gente encontra outros iguais, e do nada vira uma festa.”

As histórias de Jerônimo e Emerson expõem a rotina de quem, apesar do abandono, não deixam de sentir. Entre rejeição, resiliência e tentativas de recomeço, seguem buscando algum tipo de conexão. No Natal, enquanto muitos buscam presentes, eles buscam presença. Às vezes, um aceno basta.

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