*Luiz Augusto Pereira de Almeida
Com grande frequência, leio, escuto e observo severas críticas ao mercado imobiliário. Ora dizem que está pouco se importando para as cidades; ora o classificam como um bando de especuladores, insensíveis aos problemas da população. Não sei bem onde e quando surgiu tamanha animosidade contra o setor, mas se trata de uma imagem muito distante da realidade dos fatos e da atividade, cuja atuação precisa ser melhor analisada.
É necessário esclarecer que o estigma da especulação imobiliária brota de uma interpretação equivocada da antiga e irrevogável lei da oferta e da procura no movimento de compra e venda de imóveis. O cálculo é simples: quanto mais unidades habitacionais puderem ser construídas num terreno e quantos mais empreendimentos puderem ser edificados em uma região, mais competitivos serão os seus preços unitários. O contrário também é verdadeiro.
Quem define o que, quanto e onde pode ser construído numa cidade é o poder público, através de planos diretores, nos quais zoneamentos e normas de uso e ocupação são definidos. Neste quesito, nosso histórico foi sempre marcado por políticas de ocupação restritivas, de baixo aproveitamento do solo. Em São Paulo, o Plano Diretor vigente representou alguns avanços, ampliando para um raio de 700 metros ao redor das linhas do metrô e trem e 400 metros dos corredores de ônibus a permissão para a construção de prédios residenciais mais altos, facilitando o adensamento populacional junto aos eixos de transportes. Se a estrutura da mobilidade na cidade está dimensionada para isso, é outra discussão…
As empresas imobiliárias dimensionam cada projeto a partir dessas regras, somando os valores da compra do terreno e da realização da obra. O total é dividido pelo número de lares ou escritórios cuja construção a lei permite em cada terreno. Chega-se, assim, a um custo unitário, ao qual se soma o lucro, determinando-se o preço final. O raciocínio também é válido para cada bairro e para cada cidade como um todo: nas localidades em que se pode construir pouco, os preços sobem; onde ainda é possível realizar empreendimentos em maior número, os preços são mais competitivos. Se leis impedem ou restringem a ocupação, os imóveis ficam cada vez mais caros e exclusivos.
Em todo esse processo mercadológico não se configura a especulação, cujo verbete no Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa tem a seguinte definição: “Negócio em que uma das partes abusa da boa fé de outra”. Obviamente, tal pecha não se aplica a quem empreende sob os ditames legais e tampouco a um mercado que atende à demanda da habitação, mantém milhões de empregos, recolhe impostos vultosos e cuja cadeia produtiva, a da construção civil, representa quase 12% do PIB brasileiro.
Há outro fator que também tem impacto nos preços, na satisfação dos ocupantes do imóvel e, claro, na imagem do mercado imobiliário: a qualidade da infraestrutrura urbana e dos serviços. Locais bem servidos nesses itens têm procura maior e, portanto, valores mais altos, além de um grau maior de satisfação das pessoas. Porém, quando falta isso, parece já ter transitado em julgado na opinião pública que a culpa, mais uma vez, é do mercado imobiliário. Ora, o setor não é o responsável por construir avenidas, pontes, viadutos, parques públicos, metrô, corredores de ônibus, trens, estrutura de atendimento médico-hospitalar, escolas e unidades policiais.
Como se vê, o que na realidade incomoda o cidadão e o faz pensar que a culpa é do setor imobiliário é o fato de as cidades crescerem sem planejamento, de ser cada vez menor o número de áreas disponíveis, as restrições nas regras de uso e ocupação do solo e a insuficiência dos investimentos públicos em infraestrutura, cuja evolução não acompanha a expansão das cidades. Este descompasso é mais acentuado nas grandes áreas metropolitanas.
A título de exemplo, tomemos a cidade de São Paulo, que cresce, todos os anos, cerca de 200 mil habitantes. Este contingente demanda moradia, escolas, transportes, água, esgoto, segurança, atendimento médico-hospitalar, comércio, serviços e entretenimento. Esta conta de investimentos públicos e privados não pode ser ignorada e precisa ser quitada todos os anos, sob pena de ocorrer um desequilíbrio crescente e piora na qualidade da vida.
Que bom seria se morássemos perto de casa, se não tivéssemos de tirar o carro da garagem, se pudéssemos ir a pé ao shopping, ao supermercado, à escola ou fazer jogging no parque público do bairro. E tudo isso sem medo de ser assaltado. Aposto que o leitor, ao vender seu imóvel numa área que proporcionasse esses benefícios ou parte deles, o precificaria em, no mínimo, 50% a mais. E, com certeza, não estaria fazendo especulação imobiliária!
*Luiz Augusto Pereira de Almeida é diretor da Sobloco Construtora e diretor-adjunto da FIABCI