Autor lança “O Evangelho segundo Odair” e faz pré-lançamento de “Ira! e a revolução psicoacústica” no evento que une som, palavra e cultura em Paraíso do Norte
Cibele Chacon
Da redação
A literatura vai ocupar espaço de destaque na programação do Paraíso do Rock 2025, que acontece de 16 a 18 de outubro em Paraíso do Norte, reunindo bandas nacionais e internacionais. No primeiro dia do evento, a Casa de Cultura recebe, às 19h, uma atração especial para os amantes da música e da escrita: o escritor e jornalista Leonardo Vinhas apresenta o lançamento do livro O Evangelho segundo Odair e o pré-lançamento de Ira! e a revolução psicoacústica.
Conhecido por seu trabalho na área cultural e por unir crítica musical e narrativa literária, Vinhas é uma das vozes mais consistentes na reflexão sobre a música brasileira contemporânea. Sua obra explora o universo sonoro como expressão de identidade, comportamento e transformação social — um gênero que cresce e se afirma dentro da literatura nacional, revelando como a música também pode ser lida, sentida e interpretada nas páginas de um livro.
Ao lado dele estará o também escritor e jornalista Jotabê Medeiros, autor de biografias de grandes nomes da música brasileira, como Belchior – Apenas um rapaz latino-americano e Raul Seixas – Não diga que a canção está perdida.
A seguir, o Diário do Noroeste conversa com Leonardo Vinhas sobre o novo livro, a relação entre música e literatura e o que o público pode esperar desse encontro entre palco e página.
DN – O livro “O Evangelho segundo Odair” resgata a trajetória de Odair José, um artista muitas vezes subestimado pela crítica. O que o motivou a escrever sobre ele e como foi o processo de pesquisa e construção dessa obra?
Leonardo Vinhas – Eu sou intrigado por discos que se tornam “malditos”, porque, na maioria das vezes, a lenda é maior que os fatos, e acaba encobrindo muitas coisas mais interessantes que estão soterradas debaixo de tanta mitificação. Quando a Editora Barbante me convidou para escrever um livro para a coleção Sound + Vision, dedicada a escrutinar um álbum específico, escolhi O Filho de José e Maria não só por gostar muito do álbum, mas por ter a forte impressão que a história original era mais interessante que o mito – como de fato é. Entrevistei todos os músicos que participaram do disco e ainda estão vivos, inclusive o Hyldon, cuja participação foi importantíssima mas é pouco citada, e o Alex Malheiros do Azymuth. Também falei com músicos que foram influenciados pelo Odair, jornalistas e produtores cujas histórias e carreiras se cruzam com esse disco, além do próprio Odair, é claro, e muita pesquisa bibliográfica.
DN – Você também está trazendo o pré-lançamento de “Ira! e a revolução psicoacústica”. O que esse novo livro revela sobre a importância da banda no cenário musical brasileiro dos anos 1980?
Leonardo Vinhas – Psicoacústica, de 1988, é um dos discos mais vanguardistas da geração 80 do rock brasileiro, em pé de igualdade com Selvagem?, dos Paralamas do Sucesso, e Õ Blesq Blom, dos Titãs. Mas desses, acho que só o dos Paralamas tem sua importância devidamente reconhecida. Pouca gente sabe que o disco foi decisivo no manguebeat, que ele abriu portas para muitas experimentações de estúdio, e que foi um momento único de uma banda importante, mas que tem uma carreira muito irregular. O Psicoacústica foi feito em condições que dificilmente se repetiriam hoje, com uma gravadora dando recursos e autonomia para uma banda jovem poder experimentar e ainda sair a público com boas condições de divulgação. Além disso, aborda temas e traz estéticas que seriam muito presentes dos anos 90 em diante, como a presença da religião de matriz africana no rock (antes só aparecia na MPB), influências do rap, marginalidade, pena de morte, autocrítica ao próprio rock, entre outros.
DN – O evento valoriza a cena cultural e musical do interior do Paraná. Qual a importância de iniciativas como essa para descentralizar o acesso à cultura no Brasil?
Leonardo Vinhas – São essenciais. Como diz o jornalista Marcelo Costa, editor do Scream&Yell, “mais uns 15 prefeitos como o Beto Vizzotto e esse seria outro país”. Beto poderia perfeitamente fazer o festival em outra cidade, mas acredita que é imprescindível fazer essa movimentação em Paraíso, e eu só posso concordar. O Brasil é muito “sudestecêntrico”, e excessivamente concentrado nas capitais. Iniciativas como o Paraíso do Norte, o Festival Se Rasgum (em Belém) e o Radioca (Salvador) são importantes não só para movimentar as cidades onde os eventos são realizados, mas para promover diálogo entre os artistas locais e os de fora, e assim potencialmente aumentar o alcance tanto de uns como de outros.