THIAGO BETHÔNICO
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Estudo publicado pelo Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) nesta quarta-feira (15) mostra que apenas 23% dos entregadores e motoristas de aplicativo contribuem para a Previdência Social em suas ocupações.
Isso significa que a grande maioria dos profissionais, além de não ter o tempo de trabalho computado para a aposentadoria, estão sem proteção do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) em casos de doenças e acidentes.
O levantamento ainda mostra que o número de trabalhadores autônomos no setor de transportes cresceu, passando de 1,5 milhão no final de 2021 para 1,7 milhão no terceiro trimestre de 2022.
Os dados constam da Pnad Contínua, pesquisa do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
Como não há registro específico para o setor na Pnad, os pesquisadores usaram filtros para identificar os entregadores e motoristas dentro da modalidade de Gig Economy, termo que caracteriza relações laborais entre funcionários e empresas sem vínculo empregatício, como freelancers e autônomos.
De acordo com o estudo do Ipea, o aumento no número de trabalhadores por aplicativo foi acompanhado por uma diminuição no percentual de contribuintes para a Previdência. Em 2016, cerca de 40% dos profissionais tinham proteção do INSS.
Os pesquisadores destacam que tal fenômeno não se repete entre todos os trabalhadores por conta própria. Excluindo os entregadores e motoristas de app, os dados indicam maior estabilidade na proporção de contribuintes, que ficou em torno de 33% no terceiro trimestre de 2022.
“Ao comparar a trajetória dos percentuais de contribuintes, nota-se que, enquanto a dos trabalhadores da Gig Economy dos transportes está em queda, a dos demais conta-própria apresenta uma estabilidade considerável”, diz a publicação.
Os números sugerem um aumento da vulnerabilidade especificamente dentre os trabalhadores de transporte, que, conforme lembram os pesquisadores, são um grupo heterogêneo, formado por profissionais com alta e baixa escolaridade.
O recorte por região também aprofunda as desigualdades. A região Sul é a que tem a maior proporção de motoristas e entregadores contribuindo para a Previdência (37%). Já o Norte figura na parte oposta, com apenas 9,6% desses profissionais protegidos pelo INSS.
Expostos a riscos de acidentes diariamente, os trabalhadores de app encontram-se numa posição delicada em relação à proteção social.
Eles não são funcionários da companhia para a qual prestam serviço (Uber ou iFood, por exemplo), tampouco dos envolvidos na contratação de uma corrida ou de uma entrega (um restaurante ou farmácia, por exemplo).
A situação de informalidade ganhou mais atenção durante a pandemia e depois das manifestações batizadas de “Breque dos Apps”, em julho de 2020. Os protestos geraram uma onda de propostas para tentar dar alguma segurança a esses trabalhadores.
Desde a campanha eleitoral, o PT definiu que a inclusão de trabalhadores por aplicativo na Previdência seria uma das prioridades do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Os profissionais que hoje somam um contingente de 1,7 milhão de pessoas são habitualmente descritos por petistas como a maior categoria do Brasil.
O partido mira o exemplo da Espanha que, em 2021, aprovou lei para que trabalhadores por app passassem a ser reconhecidos como funcionários assalariados.
Embora plataformas como iFood e Uber defendam a inclusão de motoristas e entregadores na rede de proteção social e previdenciária, elas querem garantir que esses trabalhadores não sejam considerados seus funcionários, com o pacote de direitos e obrigações que essa relação implica (contribuição ao INSS, carteira assinada, recolhimentos ao FGTS e responsabilidade pela atividade).
Atualmente, cada entregador e motorista pode contribuir para a Previdência por meio do MEI (microempreendendor individual). O custo é de R$ 65,60 mensais (equivalente a 5% do salário mínimo mais R$ 5 de ISS).
No entanto, a condução voluntária do processo que também depende do bolso do próprio trabalhador abre margem para inadimplência nos pagamentos.
O modelo defendido por parte do setor é que cada plataforma faça o recolhimento da contribuição e deposite na conta do profissional, o que seria uma forma de evitar a descontinuidade do pagamento.
Atualmente, o governo Lula vem trabalhando numa proposta para regulamentar o setor. Há um grupo de trabalho sendo formado para debater o assunto, que deve ser concluído até maio de 2023.
O Ministério do Trabalho fará a mediação das propostas, que devem se tornar um projeto de lei a ser encaminhado e discutido no Congresso.
Recentemente, o ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho, disse que as condições vividas por trabalhadores de aplicativos beiram a escravidão.
Segundo ele, a regulamentação precisa ser discutida de forma aprofundada, pois há casos que se enquadram na CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) e há outros que não. No entanto, o governo destaca que é necessário algum tipo de proteção para esses trabalhadores.
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