MÔNICA BERGAMO
DA FOLHAPRESS
Uma mulher da capital paulista está sendo processada pelo Ministério Público de São Paulo por ter sofrido um aborto após tentar cometer suicídio. Ela é acusada pelo órgão de interromper a gestação em si mesma, crime previsto pelo Código Penal que estipula detenção de um a três anos.
No processo que tramita junto ao Tribunal de Justiça de São Paulo, ela é apresentada como ré, e o feto, como vítima.
À época do ocorrido, a mulher relatou à polícia que sofria de depressão. Disse ainda estar psicológica e emocionalmente abalada.
Segundo o promotor Rogério Leão Zagallo, no entanto, ela teria assumido o risco de causar a morte do feto ao atentar contra a própria vida, “uma vez que sabia que estava grávida”. A tentativa de suicídio ocorreu no final de 2016, mas a denúncia só foi oferecida pelo Ministério Público em novembro de 2020.
No despacho em que recebeu a denúncia, o juiz Adilson Paukoski Simoni afirmou que o caso apresentado descrevia “suficientemente a ilicitude criminal irrogada” pela mulher. O magistrado solicitou máxima urgência para o andamento processual.
Nesta semana, ela foi ouvida pela corte paulista em uma audiência. O Ministério Público ainda tenta localizar uma médica que prestou socorro a ela para colher seu depoimento. Há a possibilidade de que o órgão leve o caso a júri popular, que aprecia crimes que atentem contra a vida.
Procurado, o advogado de defesa da ré, Renan Bohus, diz que ela não teve a intenção de praticar o aborto, mas de se matar, e, por isso, não deveria ser acusada pelo crime. O defensor afirma estar “estarrecido e preocupado” com a conduta do Ministério Público.
“Ela foi socorrida a tempo, a ponto de salvar a sua vida, mas cinco dias após ser internada acabou abortando o seu feto de sete meses”, diz o advogado.
“Entendo que isso é uma violência institucional contra a mulher. Ela já vai ter a punição por toda a sua vida por ter perdido o filho. O fato de responder uma ação penal é uma dupla punição. O Ministério Público não deveria mover todo o aparto estatal para processar uma mulher, mas dar auxílio e ajuda psiquiátrica. O Estado tinha que atuar com ela, não contra ela”, segue.
Atualmente, o aborto é legal no Brasil nos casos em que a gravidez é decorrente de estupro, quando há risco à vida da gestante ou quando há um diagnóstico de anencefalia do feto –este último foi garantido por uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) em 2012.
Em qualquer outra circunstância é considerado crime, previsto no Código Penal de 1940. A pena varia de um a três anos de prisão.
Como mostrou o jornal Folha de S.Paulo, o país registrou, nos últimos cinco anos, uma média anual de 400 novos processos judiciais relativos a autoaborto (artigo 124) ou aborto consentido (artigo 126).
O dado é de relatório feito pela Clínica de Direitos Humanos das Mulheres da USP em parceria com a Universidade de Columbia e com a Clooney Foundation for Justice
Pesquisa Datafolha divulgada em 3 de junho mostrou que o número de brasileiros que acreditam que o aborto deve ser proibido em qualquer caso caiu para 32%, em maio de 2022, ante 41% em outubro de 2018. Os resultados atuais mostram ainda que 39% acreditam que a lei deve se mantida como está.
ONDE PROCURAR AJUDA?
– Mapa Saúde Mental
Site mapeia diversos tipos de atendimento: www.mapasaudemental.com.br
– CVV (Centro de Valorização da Vida)
Voluntários atendem ligações gratuitas 24 horas por dia no número 188: www.cvv.org.br.
FIQUE ATENTO SE ALGUÉM PRÓXIMO DE VOCÊ…
– Mostrar falta de esperança ou muita preocupação com sua própria morte
– Expressar ideias ou intenções suicidas
– Se isolar de suas atividades sociais e cortar o contato com outras pessoas
– Além disso: perder o emprego, sofrer discriminação por orientação sexual ou identidade de gênero, sofrer agressões psicológicas ou físicas, diminuir práticas de autocuidado.