REINALDO SILVA
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Era para ser uma noite de comemoração. Na segunda-feira (16), reuniram-se na Câmara de Vereadores diferentes categorias de servidores públicos municipais a fim de acompanhar a votação dos projetos de lei que concedem auxílio-alimentação para toda a categoria e aumento salaria real sobre os vencimentos dos professores. Casa cheia. Expectativas lá em cima.
A 15ª reunião ordinária começou com a leitura do expediente. Cumpridos os protocolos iniciais, a surpresa: a leitura de uma denúncia contra o vereador Roberto Cauneto Picoreli (Pó Royal), por quebra de decoro parlamentar. Pesam contra ele acusações de ameaça e perseguição a mulheres com quem namorou. São pelo menos três situações. O vereador também teria utilizado a posição política para chantagear a denunciante.
A denúncia cita boletins de ocorrência feitos em 2021. Entre outros tópicos, os documentos policiais discorrem sobre mensagens enviadas às vítimas pelo vereador, motivadas por ciúme. Também fundamentam o texto leis federais de proteção às mulheres, como a do stalking, que tipifica perseguição e comportamentos insistentes após o fim de relacionamentos.
Durante a leitura da denúncia, levada ao plenário pelo presidente Leônidas Fávero Neto, o vereador Pó Royal tentou se manifestar. Ensaiou uma tentativa de defesa. Disse que está sofrendo perseguição política e que estão tentando minar suas possibilidades de concorrer a uma cadeira na Câmara dos Deputados.
O vereador precisou esperar até que a leitura da denúncia fosse concluída. Somente então pôde se manifestar. A leitura acalorada da resposta informava aos presentes que não existe processo judicial contra ele e, portanto, não haveria razões para seguir com a apuração do caso na Câmara de Vereadores.
Pó Royal chamou a Constituição Federal para falar do direito de ter resguardadas a privacidade e a intimidade. “Querem denegrir minha imagem. Estou sendo exposto de maneira ilegal. Ofenderam minha honra e a das outras pessoas envolvidas.” Sem negar os relatos apresentados na denúncia, o vereador questionou: como tiveram acesso aos documentos?
Vencido o tempo de manifestação para a defesa de Pó Royal, o presidente da Câmara de Vereadores colocou a apuração da denúncia em votação. Nove parlamentares estavam presentes. Por questões médicas, Amarildo Costa acompanhou a sessão de forma remota. Todos participaram da decisão, exceto Doutor Leônidas, por ter levado a denúncia ao plenário, e Pó Royal. Foram oito votos a zero a favor do recebimento.
Veio, então, o anúncio: Pó Royal foi afastado das funções legislativas até que o processo seja concluído. O presidente pediu que deixasse imediatamente a Câmara de Vereadores, e assim o acusado fez, mas não sem antes se dirigir às pessoas que acompanhavam a sessão. Disse que a justiça seria feita e ficaria provado que ele, Pó Royal, está sendo vítima de um ardil para ser afastado da carreira política.
Comissão processante – O passo seguinte foi compor o grupo que avaliará a denúncia, através de sorteio. A comissão processante é composta por Maria Clara (presidente), Cida Gonçalves (relatora) e José Glavão. Recebendo o processo, serão cinco dias para iniciar os trabalhos, notificando o denunciado no prazo de dois dias úteis. Pó Royal terá dez dias para apresentar defesa prévia, por escrito, indicando as provas que pretende produzir e as testemunhas que serão ouvidas.
A comissão poderá optar pelo arquivamento da denúncia. Nesse caso, será necessário levar a decisão ao plenário, para que seja submetida a uma votação. O resultado se dará por maioria simples.
Caso entenda que é necessário dar prosseguimento ao caso, a comissão processante cumprirá uma série de etapas, buscando encontrar provas favoráveis ou contrárias ao denunciado: atos, diligências e audiências que deem base à decisão. Concluída a instrução, virá o parecer final, apontando a procedência ou a improcedência da acusação.
Por fim, o resultado será lido na sessão de julgamento, que poderá levar à cassação do mandato legislativo. O afastamento definitivo se dará se ficar provado que Pó Royal cometeu qualquer uma das infrações especificadas na denúncia. Caso contrário, o processo será arquivado e o vereador retomará as atividades normalmente. Todas essas etapas não podem levar mais do que 90 dias, período em que a cadeira do parlamentar será ocupada pelo suplente Delcides Pomin.
Pó Royal poderá recorrer judicialmente das decisões tomadas a partir de segunda-feira, desde o recebimento da denúncia e o afastamento até a cassação do mandato, caso assim seja decidido. Ele afirmou que recorrerá à justiça dos homens e à justiça divina.
Pó Royal – Esta não é a primeira vez que ele está no centro de uma polêmica. Em abril de 2021, os vereadores abriram investigação sobre a contratação de um assessor parlamentar, que teria sido contratado pela Casa por indicação de Pó Royal. À época, ele disse que agiu dentro da legalidade.
A apuração levaria em conta o acúmulo de cargos públicos, já que o então assessor tinha vínculo ativo com a Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD-MS). Ele foi exonerado do pelo Decreto 08 de 2021 e notificado para a devolução, aos cofres do município, de todas as remunerações recebidas.
Mandatos cassados – Em junho do ano passado, a Justiça Eleitoral determinou a cassação dos mandatos de dois vereadores de Paranavaí, Antônio Valmir Trossini e Luiz Aparecido da Silva (Mancha da Saúde), ambos do PSB, com base em denúncias de fraude à cota de gênero nas eleições municipais de 2020.
A saída de ambos trouxe nova configuração à Câmara de Vereadores, com a chegada de mais duas mulheres, as vereadoras Zenaide Borges e Maria Clara.
Servidores municipais – Era para ser uma noite de comemoração. Não foi para o vereador Roberto Cauneto Picoreli, mas sim para os servidores municipais, especialmente os que acompanharam a sessão ordinária de segunda-feira. Após o episódio de afastamento, os parlamentares retomaram os trabalhos de rotina, ocasião em que votaram a favor do auxílio-alimentação para toda a categoria e do aumento salarial real sobre os vencimentos dos professores.