REINALDO SILVA
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“Comecei a ficar mais ansiosa e parecia que não dava conta de simples tarefas. No começo, foi bastante intenso, não sabia lidar com o que estava sentindo, descarregava aquela angústia nas pessoas ao meu redor. Comecei a passar mais tempo em casa. O que não me ajudava muito, a insegurança de uma nova doença.”
O depoimento é de uma mulher de 24 anos, moradora de Paranavaí, que manteve o nome em sigilo por razões médicas. A pandemia de Covid-19 mudou completamente sua rotina, e o que considerava características da personalidade se transformaram em transtornos psicológicos. “Quando percebi, não conseguia mais dormir, estava muito chorosa, parecia que todos os meus sentimentos tinham ampliado. Isso estava me atrapalhando muito no dia a dia.”
À época, ela trabalhava com atendimento ao público e “acabava sendo grosseira com os próprios usuários”. O convívio com a família e os amigos também ficou comprometido.
Não foram casos isolados. A coordenadora municipal do Programa de Saúde Mental de Paranavaí, Hellen Patrícia Zaine Matsumoto, afirma que foram identificados quadros recorrentes de cansaço, esgotamento físico e mental, sentimento de desmotivação e de desesperança. Os sintomas levaram ao desgaste e resultaram em ansiedade e depressão.
Assistente social e especialista em Saúde Mental, Hellen Matsumoto explica que as pessoas podem reagir de diferentes maneiras em situações estressantes. As manifestações acompanham diferentes fatores, por exemplo, a formação, a história de vida, a mudança na situação econômica, a rotina de trabalho e as relações afetivas.
Alguns grupos podem responder mais intensamente ao estresse de uma crise. No caso da pandemia, a coordenadora cita idosos, pacientes com doenças crônicas, profissionais de saúde que atuam na linha de frente da Covid-19 e pessoas com transtornos mentais, incluindo problemas relacionados ao uso de substâncias. “Esses cenários não são independentes. Uma pessoa pode ter sido exposta a várias situações ao mesmo tempo, o que pode aumentar o risco de desenvolver ou agravar transtornos mentais já existentes”, pontua Hellen Matsumoto.
Números – A Secretaria de Saúde vem acompanhando o agravamento da saúde mental em Paranavaí com bastante atenção. Para se ter uma ideia, no primeiro semestre deste ano, a procura por atendimentos cresceu mais de 76% em relação ao mesmo período de 2019, ano anterior ao início da pandemia de Covid-19.
De janeiro a junho de 2022 as consultas médicas nos serviços especializados ultrapassaram 4 mil atendimentos. Entre os diagnósticos mais frequentes, ansiedade, demência, depressão, estresse, transtorno obsessivo compulsivo (TOC), transtorno afetivo bipolar, transtorno hipercinético, pânico e fobias sociais.
Serviços de saúde – Diante da situação, a Prefeitura de Paranavaí realizou processo seletivo simplificado (PSS) para a contração de psicólogo e psiquiatra. Também implantou o Ambulatório de Saúde Mental e disponibilizou na Unidade de Pronto Atendimento (UPA) o serviço da médica visitadora, especialista em Psiquiatria, para avaliar casos graves e dar suporte aos pacientes em observação ou que aguardam leito hospitalar psiquiátrico.
Outro morador de Paranavaí, um paciente de 31 anos buscou o suporte oferecido pela Secretaria de Saúde. O nome também foi omitido por razões médicas. “Busquei saber como estava sendo ofertado o serviço no SUS. No início fiquei apreensivo, pois, infelizmente este estigma eu tinha: que o médico psiquiatra é o médico de louco. Mas, olha, foi a melhor coisa que poderia me acontecer naquele momento.”
Ele passou a fazer uso de medicamentos e percebeu que as emoções excessivas acalmaram. Voltou a ser produtivo e resolutivo. “Parei de ter os bloqueios, e aquela angústia que me sufocava cessou. É óbvio que o medicamento por si só não faz milagres. Além dele, segui as orientações do profissional médico psiquiatra. Com isso, obtive excelentes resultados na minha rotina.”
Rede de atenção – Todas as pessoas que apresentam queixas relacionadas à saúde mental podem procurar a Unidade Básica de Saúde (UBS). Os enfermeiros estão qualificados para fazer o acolhimento desses pacientes e os encaminhamentos necessários. Os casos são acompanhados pelas equipes dos Centros de Atenção Psicossocial (Caps).
Já o Ambulatório de Saúde Mental atende quadros moderados encaminhados pelas equipes dos Caps após verificar os pacientes atendidos nas UBSs. O público-alvo é composto por pessoas a partir de 12 anos de idade.
De acordo com Hellen Matsumoto, Paranavaí possui uma rede ampla e estruturada para atender pessoas em sofrimento psíquico ou transtorno mental. Além das UBSs e do Ambulatório de Saúde Mental, o município conta com o Caps Infantil (até 19 anos), o Caps II (adultos) e o Caps AD (usuários de álcool, crack ou outras substâncias).
São três médicos psiquiatras, dois especialistas e um clínico-geral; três enfermeiros; quatro assistentes sociais; seis psicólogos; um pedagogo; e um fonoaudiólogo. Todas as equipes são formadas por profissionais efetivos de nível superior e também de níveis médio e técnico, além dos terceirizados que realizam as oficinas terapêuticas organizadas de acordo com a necessidade de cada Caps.
Os atendimentos são gratuitos.
Orientações – A coordenadora municipal de Saúde Mental explica que é importante prestar atenção quando o estado emocional começa a prejudicar as relações interpessoais e traz prejuízos para atividades corriqueiras. “É nesse momento que devemos buscar ajuda profissional.”
Hellen Matsumoto informa que há emoções e comportamentos que indicam desequilíbrios e devem ser percebidos. Entre os sintomas estão insônia; mudanças de humor, taquicardia e palpitações, falta de apetite ou apetite em excesso, desânimo e irritabilidade.
Ela orienta: “Caso perceba que não vem se sentindo bem, com dificuldades para lidar com as emoções e com as rotinas do dia a dia, bem como tendo pensamentos negativos com recorrência, busque ajuda profissional. Se você já está fazendo algum tratamento para saúde mental, seja com psicólogo, médico da família, psiquiatra, com o uso ou não de medicamentos, continue seu tratamento”.
Algumas dicas podem ajudar a cuidar da saúde mental. “O primeiro passo é entender que dedicar um tempo para si não é egoísmo, mas, sim, autocuidado, pois se a mente está adoecida, o corpo também adoecerá”. De acordo com Hellen, é preciso estabelecer rotinas, praticar atividades físicas que proporcionem prazer, manter a alimentação saudável e respeitar os próprios limites.