SAMUEL FERNANDES
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)
Um levantamento publicado nesta segunda (24) concluiu que o Brasil teve sua primeira queda na publicação de artigos científicos desde 1996. A redução foi de 7,4% em 2022 em comparação ao ano anterior. O índice é o pior entre 51 países analisados e é igual ao da Ucrânia, que esteve em guerra pela maior parte de 2022.
Os dados foram compilados pela Agência Bori, serviço que conecta a imprensa e a ciência brasileira, e pela Elsevier, uma editora de publicações científicas. De início, foi definido que entrariam no levantamento somente aqueles países que publicaram mais de 10 mil artigos em 2021 – no caso, 51 nações. Elas já representam cerca de 95% de toda a produção científica mundial.
Optou-se pela base de dados Scopus, da Elsevier, para acessar o montante de artigos e seus respectivos países de publicação. Além do Brasil, outros 22 tiveram queda na produção científica. A contração aconteceu também em países ricos e com fortes instituições de pesquisa, como EUA, Inglaterra e França.
Mas o que chama a atenção de Estêvão Gamba, cientometrista da Agência Bori e um dos responsáveis pelo levantamento, é que foi o primeiro ano que ocorreu uma queda na produção de artigos brasileiros. “Desde 1996, que é quando essa base da Elsevier foi criada, é a primeira queda do Brasil.”
Em 2020, primeiro ano da pandemia de Covid-19, foram cerca de 77 mil artigos publicados nacionalmente. Um ano depois, esse número subiu para 80 mil e, em 2022, caiu para 74 mil. Gamba explica que o país sofria uma desaceleração no volume de textos publicados nos períodos científicos, mas ainda não tinha registrado uma contração comparada ao ano anterior – sempre subiu, mesmo que pouco.
Outro aspecto preocupante é que a diminuição de 7,4% foi a maior registrada em todos os países. Somente a Ucrânia também chegou a esse percentual, mas o país do leste europeu esteve em guerra por quase todo 2022, o que pode explicar a queda.
No caso do Brasil, existem hipóteses diferentes para dar conta do encolhimento. Um deles, que também impactou outros países, foi a pandemia de Covid-19. Além desse, a falta de financiamento que a ciência brasileira passou nos últimos anos causa um efeito negativo no desenvolvimento de novos artigos. “Não se faz pesquisa sem dinheiro”, resume Gamba.
E a redução nacional pode continuar nos próximos anos. Isso porque a realização de uma pesquisa demora, juntamente com sua publicação. Gamba explica que a queda de 2022, por exemplo, é reflexo de pesquisas que deixaram de ser desenvolvidas em meados dos anos de 2019 e 2020.
Como a pandemia se arrastou por outros anos e também houve contingenciamento de verba, a produção nacional de artigos deve sofrer ainda. “A gente ainda vai continuar possivelmente observando a queda”, diz Gamba.
Mas em nível global a produção de artigos na totalidade cresceu. O aumento foi 6,1% em 2022 em comparação ao ano anterior. China, EUA e Índia são os três principais produtores de pesquisa – o Brasil ocupa a 14ª posição, mesma que já tinha em 2021.
Outros indicadores – A ciência de um país ou de uma instituição não é medida somente pela quantidade de artigos veiculados em periódicos. Outro indicador importante é a qualidade dessas publicações, que pode ser acessada, por exemplo, pelo volume de citações feitas em outros estudos. Quanto mais um artigo é citado, maior sua qualidade e relevância na área de pesquisa.
Por enquanto, o levantamento recém-divulgado não compilou informações sobre a qualidade, mas isso já está no horizonte da equipe, afirma Gamba. “A gente só está vendo a queda na produção, mas pode ter caído também a qualidade dos artigos”, conclui.