REINALDO SILVA
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Tramita na Câmara de Vereadores de Paranavaí um projeto de lei que assegura às mulheres o direito de se fazer acompanhar por uma pessoa de sua confiança em todas as consultas, cirurgias e procedimentos clínicos e laboratoriais que impliquem em sedação ou exposição do corpo, total ou parcialmente. O texto também prevê, nesses casos, a participação de profissionais de saúde do gênero feminino.
O vereador Delcides Pomin Junior, autor da proposta, justifica que a proibição de acompanhante gera desconforto às mulheres, que se veem expostas e desprotegidas com estranhos. Quando enfrentam situações de violência, podem se sentir inibidas diante da figura de uma autoridade, no caso, o médico. Por isso, deixam de denunciar.
Pomin Junior afirma que conversou com pessoas próximas e elas relataram que os constrangimentos se acumulam. Um gesto que vá além do que o procedimento exige pode ser considerado abusivo. “É um direito da mulher se proteger.”
O projeto de lei cita o caso registrado no Hospital da Mulher de São João de Miriti (RJ), no dia 10 de julho deste ano. As câmeras de segurança flagraram quando um médico anestesista cometeu estupro de vulnerável, uma mulher grávida, na hora do parto.
“Dados do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MDH), do Governo Federal, revelam que pelo menos 373 abusos sexuais foram denunciados por mulheres dentro de unidades de saúde, de 2020 a maio de 2022. Uma realidade assustadora de pelo menos um caso relatado a cada dois dias em unidades públicas ou particulares.”
Importância – A professora Isabela Candeloro Campoi, presidente do Conselho Municipal dos Direitos da Mulher, avalia que “o projeto de apresentado pelo vereador Delcides Pomin Junior contribui para assegurar às mulheres uma situação mais confortável quando da realização de procedimentos médicos mais invasivos”.
Ela também falou sobre o caso de São João de Miriti. “Chocou o País. Tudo indica que a conduta do médico, preso em flagrante, era recorrente e ali, na sala de parto, já se exige a presença de outros profissionais. Foram inclusive as profissionais de saúde, mulheres, as responsáveis pelo vídeo usado na denúncia: nem as cortinas do centro cirúrgico e a sala cheia impediram o abuso absurdo.”
Violência – Maria Inez Barboza Marques e Karine Aparecida Dias Almeida, respectivamente coordenadora e advogada do Núcleo Maria da Penha (Numape), da Universidade Estadual do Paraná (Unespar), câmpus de Paranavaí, consideram a proposição de Pomin Junior um instrumento de combate à violência contra mulheres.
“Em nossa trajetória no âmbito da luta pela construção de políticas públicas que visem a ampliar direitos para mulheres, é possível considerar que o projeto de lei é pertinente e necessário”, afirma Maria Inez.
Elas concordam que a violência de gênero e, consequentemente, a violência institucional fazem parte da realidade na sociedade brasileira. Como exemplo, mencionam a violência obstétrica, pauta que vem sendo discutida pelos conselhos de direitos em diferentes espaços em que as mulheres estão organizadas.
A legislação brasileira permite a presença de acompanhante durante o trabalho de parto, o parto e o pós-parto imediato para as pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS). Em algumas localidades, também podem contar com a companhia de alguém de confiança para outros tipos de procedimentos.
Rede de apoio – A coordenadora do Numape enfatiza que Paranavaí conta com uma rede de atendimento e enfrentamento à violência contra mulheres. “Entre as instituições, encontra-se a Coordenadoria Saúde da Mulher, que faz um importante trabalho que contribui para o apoio às mulheres em situação de violência, incluindo a violência sexual.”
A compreensão é que, para além da prevenção de possíveis abusos, é direito de todas as mulheres, independentemente da faixa etária e das condições socioeconômicas, se sentirem seguras e tranquilas quando passam por procedimentos que as mantêm sedadas.
Trâmites – A procuradora do Legislativo, Gisele Piperno Garcia, explica que o projeto de lei ainda não passou pela avaliação jurídica, o que deve acontecer na próxima semana. Ela emitirá o parecer e encaminhará à Comissão de Constituição de Justiça (CCJ). Um dos pontos a serem levados em conta é que o Legislativo não pode atribuir funções ao Executivo, afinal os poderes são independentes.
Caberá à CCJ decidir se a proposição do vereador Pomin Junior seguirá ou não para a votação em plenário. Em caso de contrariedade, o projeto poderá ser arquivado. Assim, o autor poderá apresentar recurso e buscar apoio de outros parlamentares, a fim de recolocar o texto em pauta na Câmara de Vereadores de Paranavaí.