LUCIANO TRINDADE
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)
Fernando Diniz e Paulo Turra terão um duelo de exceção na 17ª rodada do Campeonato Brasileiro. O confronto entre Fluminense e Santos, na tarde de sábado (29), no Maracanã, será o único dos dez deste fim de semana na competição sem técnicos estrangeiros à beira do gramado.
Embates entre treinadores de fora do Brasil se tornaram ainda mais comuns no torneio desde que o Internacional demitiu Mano Menezes e contratou Eduardo Coudet, há pouco mais de uma semana.
Com o argentino à frente do time gaúcho, pela primeira vez na história a competição nacional tem mais da metade das equipes sob o comando de profissionais oriundos do exterior. São 11 no total, o que representa 55% dos treinadores.
A porcentagem é a mesma, por exemplo, da vista no Campeonato Francês, mas supera o índice de outras importantes ligas da Europa, como a alemã (33%), a espanhola (20%) e a italiana (20%).
Considerando os cinco principais campeonatos do Velho Continente, de acordo com o coeficiente da Uefa (União das Associações Europeias de Futebol), o Campeonato Brasileiro aparece atrás apenas da Premier League, o Campeonato Inglês – 80% dos técnicos da primeira divisão inglesa são de outros países.
Somente quatro dos 20 clubes ingleses apostam em profissionais nacionais: o Newcastle, de Eddie Howe, o Everton, de Sean Dyche, o Crystal Palace, de Roy Hodgson, e o recém-promovido Sheffield, que tem no comando Paul Heckingbottom.
Os técnicos espanhóis são os que estão em maior número na Inglaterra, com cinco nomes, sendo o maior expoente deles Pep Guardiola, multicampeão com o Manchester City.
No Brasil, a predominância é de portugueses, em uma onda que ganhou força em 2019, quando o Flamengo contratou Jorge Jesus e, com ele, conquistou seis títulos, entre eles o da Copa Libertadores de 2019.
O sucesso de Jesus abriu portas para outros portugueses, e o Palmeiras foi quem mais obteve êxito com a sua escolha. Comandado por Abel Ferreira desde 2020, o clube já acumula oito troféus com o luso.
Sete dos 11 técnicos estrangeiros atuando na elite do futebol brasileiro são de Portugal: Abel Ferreira (Palmeiras), Bruno Lage (Botafogo), António Oliveira (Cuiabá), Pepa (Cruzeiro), Renato Paiva (Bahia), Pedro Caixinha (Bragantino) e Armando Evangelista (Goiás).
Paulo Rogério Pinheiro, presidente do Goiás, diz que desde a última temporada europeia já estava de olho em Evangelista, que fez um bom trabalho à frente do modesto Arouca, com o qual fechou o ano na quinta posição do Campeonato Português.
“Entendemos que ele seria o comandante ideal para o Goiás devido a todo o seu entendimento do futebol e à sua vontade de buscar novos desafios”, afirmou o cartola.
Além dos europeus, quatro argentinos completam a lista de estrangeiros na elite do futebol brasileiro: Jorge Sampaoli (Flamengo), Eduardo Coudet (Internacional), Ramón Díaz (Vasco) e Juan Pablo Vojvoda (Fortaleza).
A crescente presença de treinadores estrangeiros no Brasil divide opiniões entre profissionais do futebol e já foi alvo de críticas de técnicos brasileiros, como Renato Portaluppi, do Grêmio.
“O trabalho dos treinadores brasileiros é no sacrifício, muitas vezes não há o material humano necessário, e ninguém tem paciência”, disse Renato, logo após a saída do português Luís Castro do Botafogo -que o substituiu por outro português.
“Aí vem o treinador estrangeiro no Brasil, coloca uma multa alta, trabalha dois meses, pega a bolada toda e vai embora, e tem gente que acha maneiro. Queria ver se um treinador brasileiro fizesse isso lá fora.”
Renato Gaúcho também se mostrou contra a contratação de um treinador de fora para dirigir a seleção brasileira. Opinião semelhante já foi manifestada por outros profissionais do país, como Dorival Júnior, do São Paulo.
Para ele, a aposta em um comandante forasteiro deveria ser feita apenas em uma situação bem específica. “Só se for o melhor treinador do mundo, que na minha opinião é o Guardiola”, disse o paulista, que estava entre os candidatos à vaga após a despedida de Tite, ao fim da última Copa do Mundo.
A CBF (Confederação Brasileira de Futebol), no entanto, afirma ter um acordo para que o italiano Carlo Ancelotti, atualmente no Real Madrid, assuma o comando da seleção em junho de 2024, quando terminará seu vínculo com o time espanhol. Por enquanto, Fernando Diniz foi contratado para conciliar seu trabalho no Fluminense com a equipe canarinho.
Diretor técnico de futebol com passagens por times como Arsenal, Manchester United, Internacional e Red Bull Bragantino, Sandro Orlandelli acredita que a chegada de técnicos estrangeiros para o país pode ser uma oportunidade boa para os próprios brasileiros.
“Se olhar só pelo lado da frustração, não vai enxergar a chance que tem de crescimento e de preparação para o próximo passo. Quando se está na rotina de trabalho, treino, jogo, viagem, é difícil investir no processo de desenvolvimento. Novas oportunidades surgem, e será a chance de mostrar que houve uma qualificação neste tempo”, afirma.
Além do aspecto técnico, há também o comercial.
“Quando você traz um treinador argentino, como é o nosso caso com o Vojvoda, as pessoas na Argentina passam a conhecer mais o Fortaleza. Quando o clube traz um técnico português, as pessoas em Portugal falam mais daquele clube por lá”, destaca Marcelo Paz, presidente do Fortaleza.
“Esses técnicos podem ser excelentes pontes para que as equipes trabalhem suas marcas fora do Brasil”, aposta o especialista em marketing esportivo Renê Salviano. “Ações de marketing digital direcionadas para a região à qual o treinador pertence, por exemplo, são iniciativas que possuem relativamente um custo baixo e que, a médio e longo prazo, podem trazer excelentes resultados.”