O secretário de Educação do Paraná, Roni Miranda, tenta convencer deputados a alterar o projeto de lei do novo ensino médio encaminhado pelo governo Lula (PT) ao Congresso. Ele defende que a carga horária obrigatória das matérias tradicionais, como português e matemática, seja mais flexível para os cursos técnicos e profissionalizantes.
O projeto de lei prevê a ampliação da carga horária das matérias tradicionais e reduz o espaço do currículo em que cada aluno escolhe uma área de seu interesse para se aprofundar. Essa parte específica do currículo é atualmente chamada de “itinerários formativos” e, no projeto de lei, foi renomeada para “percursos de aprofundamento”.
Para o secretário do Paraná, essa ampliação das matérias tradicionais é bem-vinda nos cursos regulares, mas poderá acabar com os técnicos que exigem maior tempo para o aprendizado especializado. Ele deu como exemplo de cursos que podem se tornar inviáveis os de magistério, farmácia, enfermagem, jogos digitais, pecuária e agricultura, entre outros.
De acordo com Miranda, apenas cursos da área de gestão, como logística e administração, que exigem um tempo menor de aprendizagem especializada, enquadram-se na nova proposta. Segundo ele, o Paraná tem 77 mil alunos cursando ensino técnico, e o governo pretende ampliar esse número.
Encaminhado no mês passado ao Congresso, o projeto do governo federal altera o novo ensino médio, criado por uma lei de 2017, no governo Temer. Lula atendeu a críticas que estudantes e educadores têm do modelo atual, que reduziu a carga horária das matérias tradicionais de 2.400 horas, como era antes, para 1.800.
Como o novo ensino médio passou a ter 3.000 horas no total dos três anos do curso, 1.200 horas foram destinadas aos itinerários. A crítica é a de que o aluno deixa de aprender conteúdos essenciais e se perde em uma série de currículos confusos, com matérias novas e desconexas, para as quais a rede pública não tem estrutura.
O texto encaminhado por Lula retoma as 2.400 horas para as matérias tradicionais e deixa 600 horas para os itinerários. Isso no caso da educação regular. Já para os cursos técnicos, admite, como exceção, uma carga de 2.100 horas para as matérias tradicionais, deixando mais espaço (900 horas) para o aprendizado especializado.
Essa flexibilização, porém, é concedida somente àqueles cursos que não são ministrados em período integral. Além disso, define que, a partir de 2026, os cursos que precisam de mais tempo para matérias específicas devem ser ampliados para tempo integral.
O texto encaminhado ao Congresso foi resultado de uma consulta pública e de debates que envolveram entidades como o Conselho Nacional de Educação (CNE) e o Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed). Miranda admite que o projeto de lei foi praticamente consensual entre os secretários e que ele concorda com os novos termos, com exceção da carga horária obrigatória para os cursos técnicos.
Ele teme que as redes não terão como ampliar para ensino integral todas as escolas técnicas por falta de recursos e também porque muitos alunos precisam trabalhar e estudar. Miranda foi formado na rede pública do Paraná e conta que teve que estudar à noite e trabalhar de garçom durante o dia para ajudar a família financeiramente.
Formado em história, tornou-se professor da rede pública e diretor de escola, inclusive do período noturno, e depois dirigente de regional, até ser convidado por Renato Feder, em 2021, então secretário de Educação do Paraná, a atuar em sua equipe. Com a mudança de Feder para a secretaria de São Paulo neste ano, Miranda foi nomeado secretário de Educação pelo governador reeleito Ratinho Jr. (PSD).
“Nossa preocupação é que, no Brasil, apenas cerca de 15% dos estudantes que concluem a escola pública acessam o ensino superior”, disse Miranda à Folha de S.Paulo. “O ensino médio profissional é um oportunidade para que esses jovens possam ingressar no mercado de trabalho e buscar meios de fazer uma faculdade.”
O governo Lula admite que a vulnerabilidade socioeconômica no país é um entrave na ampliação de escolas integrais de ensino médio e anunciou que está elaborando um programa de bolsas para os estudantes das famílias mais pobres.
O projeto de lei também prevê que as redes de ensino tenham ajuda financeira e técnica do MEC para ampliar a jornada dos cursos técnicos no ensino médio. Menciona, ainda, a necessidade de garantir a oferta de ensino médio noturno para jovens que precisam trabalhar, com organização curricular e carga horária “compatíveis com diferentes contextos e necessidades dos estudantes”.
O Governo do Paraná, por sua vez, tem sido criticado pelo fechamento de escolas no período noturno, inclusive daquelas que ofertam cursos a adultos não alfabetizados.
Miranda diz que esse fechamento tem relação com uma redução da procura e com a necessidade de ampliação de escolas em tempo integral. Ele admite que há “um abismo entre o nível do aprendizado no período noturno em relação ao diurno”, afirma que a evasão dos que estudam à noite é até 200% maior do que a dos que estudam de dia e defende que esses cursos “devem ser a exceção, não a regra”.
LAURA MATTOS – SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)