Aleksa Marques / Da Redação
Passava das 9h da manhã quando um casal de amigos chegou em casa para me buscar: Davi Aquino e Gabrielli Aquino. Um dia de céu limpo, vento fresco e sol brilhante. Fomos a Maristela, distrito de Alto Paraná, para visitar uma propriedade muito especial. Passamos por uma estrada de terra com os famosos morrinhos que dão frio na barriga e o cheiro da natureza já dominava o interior do carro.
Chegando lá, batemos palma e chamamos dona Cida. Ela não respondeu. Resolvemos então abrir o portão e entrar, procurando pela proprietária. Ela estava nos fundos, passando querosene em uma das máquinas, com as mãos cheias de graxa. “Se você tem carência de avó, a dona Cida vai te agarrar com força”, falou Davi enquanto entrávamos. Dito e feito.
Aparecida Cândido, de 75 anos, nos cativa desde a primeira olhada: rosto amigo, carinhosa e com um sorriso largo. O abraço foi apertado em todos nós como se fossemos netos. Nos recebeu com alegria em sua casa muito aconchegante e organizada. “Entrem, meus filhos. Fiquem à vontade”, disse ela.
Enquanto batíamos um papo, “seo” José Cândido Filho, de 79 anos, chegou quietinho e nos cumprimentou. Eles, casados há 56 anos, são naturais de Mandaguari, moraram por mais de 40 anos em São Paulo capital e, quando os filhos casaram, resolveram fazer um “pé de meia” na chácara Recanto Feliz, onde moram atualmente. Sabe aquele casal de avós fofos que dá vontade de colocar no bolso e levar para casa? Pois bem, são eles.
Logo em seguida, dona Cida nos levou para ver o quintal e mostrar os incontáveis pés de árvores frutíferas. Chateada por não ser época de colheita, mas orgulhosa em ver sua criação. “Quando eu cheguei aqui não tinha nada. Absolutamente nada. Eu plantei todas as árvores que vocês estão vendo aqui: uma por uma, seja em forma de muda ou semente”, explica.
A lista é grande e nem todos foram lembrados com exatidão: jabuticaba, pêssego, manga, romã, várias espécies de laranja e limão, pés de café, mandioca, abacaxi, amora, framboesa, ora-pro-nobis, eucalipto, bambu, taioba, acerola, seriguela, figo, carambola, pitanga, maracujá, uvaia, caju, goiaba, gabiroba, atemoia, mamão, abacate e não para por aí. As mãos talentosas de dona Cida também cultivam uma horta com salsinha e cebolinha, couve, almeirão, quiabo, tomatinhos e feijão andu, além de lindas flores cuidadas com muito amor. Tudo isso, ela lembra, plantado quando se mudaram para a chácara em 2009.
Uma árvore em especial foi mencionada durante o passeio pela avó de 3 netos e duas bisnetas: a laranja “braba”, como nomeou para nós. Se você não a conhece, vou descrever: por fora ela lembra um limão siciliano com a casca porosa e bem amarelinha e, por dentro, tem o aspecto de uma laranja lima mais clara. Antes de eu experimentar, dona Cida começou a rir e duvidou comigo que eu não iria gostar. “Essa fruta é igual a um casamento: começa doce e termina amarga”, disse entre gargalhadas. E ela estava certa, o que tinha de bonita, tinha de azeda e amarga. Daquelas que só de lembrar a boca já saliva e amarra, sabe?
Dona Cida e “seo” Cândido tiveram três filhos Maxuel, Marco Antônio e Márcia Cândido. Todos moram longe e os dois, já aposentados, querem vender a propriedade para comprar uma casinha mais perto da família. “Estamos muito velhos e a chácara demanda muito trabalho. Já aproveitamos o que tinha aqui, agora queremos ficar perto dos filhos e dos netos”, afirmou “seo” Cândido com um olhar saudosista enquanto falava de suas “crias”.
Quando acabamos o passeio pelo quintal de 5 mil metros, carinhosamente dona Cida nos preparou uma mesa de café da manhã: tinha bolo, pão caseiro, bolinho de chuva, mandioca frita, um café passado na hora, chá mate e leite fervido no canecão com direito a nata cremosa. “É hora de encher o bucho dos meninos”, exclamou enquanto cortava algumas fatias de bolo, aquele com gostinho de casa de vó.
Papo vai, papo vem e já era quase meio dia quando conseguimos colher todas as frutas que conseguimos. Mesmo fora de época, segunda dona Cida, levamos para casa abacate, carambola, maracujá, limão rosa, laranja e romã. Sacolas e mais sacolas. A limonada daquele domingo estava garantida, pois não é sempre que podemos preparar uma bebida fresquinha com as frutas colhidas do pé. Um verdadeiro privilégio.
Quando pedi a eles para que se abraçassem para uma foto, dona Cida imediatamente foi ao banheiro pentear o cabelo com maestria e cuidado. Já “seo” Cândido brincou que seus cabelos estavam ofuscando sua visão, pois caíam nos olhos. Era brincadeira, já que o tempo se encarregou de levar boa parte de seus fios. Juntos, posaram para a fotografia como o casal de pombinhos que são. “Essa vai ficar para os registros”, disse o marido.
Um verdadeiro exemplo de amor e união, cultivando frutas no quintal e uma história juntos. E diferentemente da laranja lima-da-Pérsia, o casamento dos dois está mais para uma manga docinha, suculenta e sem fiapos, que deixa a vida mais alegre e nos lambuza com aconchego e carinho.