NATHALIA GARCIA
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – A greve dos servidores do Banco Central, que durou de abril a julho deste ano, fez a agenda de inovações da autoridade monetária ser reprogramada. Com isso, novas funcionalidades do Pix e testes pilotos do real digital ficaram para 2023.
A partir de 2 de janeiro, entrarão também em vigor novas regras do sistema de pagamentos instantâneos. Ainda estão na programação do próximo ano melhorias na segurança do Pix.
O desenvolvimento do Pix Automático, que tem como pilar a função de débito automático em conta, será prioridade do BC. A ideia é que o recurso facilite o pagamento por meio do Pix de faturas periódicas, como contas de luz e água, além de outros serviços -como mensalidades escolares, planos de academia e assinaturas de plataformas de streaming.
Ao longo deste ano, o BC investiu em uma fase de diagnóstico em conjunto com agentes econômicos. A partir disso, estabeleceu especificações preliminares do desenho do Pix Automático, envolvendo três etapas: autorização, agendamento e liquidação de pagamento, ou seja, quando a transação programada é efetivamente realizada. As linhas gerais de etapas seguintes, como eventuais cancelamentos, ainda estão em discussão.
Segundo Carlos Eduardo Brandt, chefe adjunto do departamento de Competição e de Estrutura do Mercado Financeiro do BC, o detalhamento técnico para o efetivo desenvolvimento da função de débito automático do Pix ainda não foi feito.
“A gente ainda não teve condição de ter segurança de quando vai conseguir percorrer todo o processo para lançar um produto que seja bem desenhado, maduro, que seja implementado por todos. Qualquer produto exige implementações por parte do BC e de todos os participantes do Pix”, afirma.
Brandt ressalta que o amadurecimento de novos produtos não é rápido e que “estar na agenda de trabalho de 2023 não significa lançamento em 2023”, mas que a equipe trabalhará intensamente para o desenvolvimento do Pix Automático no próximo ano.
O BC também começa a vislumbrar a criação do Pix internacional, ainda em uma etapa mais prospectiva. De acordo com o coordenador do Fórum Pix, ainda há uma incerteza em relação ao modelo que será adotado, dada a complexidade de adaptação da ferramenta para a realização de transações em diversos países.
“É um produto que exige compatibilidade do ponto de vista técnico, legal e regulatório com outras jurisdições, que exige uma coordenação e uma compatibilidade de movimentos. Qualquer esforço que nós façamos por aqui [no Brasil], a contraparte tem de fazer também do lado internacional”, diz.
Outro foco do BC em 2023 será o reforço da segurança do Pix com o objetivo de coibir fraudes e uso de contas laranjas -abertas por criminosos em nome de outras pessoas.
A autoridade monetária prevê um novo dispositivo para sinalização de fraudes. Hoje, as contas sob suspeita de uso indevido recebem uma marcação no sistema. Com a mudança, a identificação será aplicada sobre os CPFs e CNPJs dos titulares dessas contas.
A base de dados gerida pelo BC funcionaria como um “hub” de informações, de forma que as instituições financeiras tenham mais subsídios para coibir transferências suspeitas para determinadas contas e fortalecer seus mecanismos antifraudes.
No golpe do Pix, os infratores pulverizam o dinheiro das vítimas rapidamente em diferentes contas, dificultando o bloqueio e a recuperação dos valores.
Para tentar frear essa dispersão, consta na agenda de trabalho da autarquia o aperfeiçoamento do mecanismo especial de devolução do Pix, que tem como objetivo reaver valores desviados por fraude ou golpe. A ideia da “versão 2.0” do instrumento é ampliar o bloqueio de recursos a até cinco contas subsequentes ao destinatário inicial.
Segundo Brandt, ainda não há uma data prevista para o lançamento das duas medidas. Mas o chefe adjunto do departamento de Competição do BC antecipa que a marcação dos CPFs sob suspeita se tornará realidade antes da atualização do mecanismo de devolução do Pix.
O que já está certo para 2023 é a alteração de algumas regras do meio de pagamento. A partir de 2 de janeiro, as instituições financeiras não serão mais obrigadas a impor um limite de valor por transação via Pix, mantendo apenas a restrição por um determinado período de tempo -diurno ou noturno.
Está previsto também o aumento dos limites para a retirada de dinheiro por meio das transações Pix Saque e Pix Troco. Durante o dia, o limite de saque com Pix saltará de R$ 500 para R$ 3.000 e, no período noturno, subirá de R$ 100 para R$ 1.000.
REAL DIGITAL TAMBÉM SOFRE ATRASO
Não foi apenas o calendário de inovações do sistema de pagamentos instantâneos que foi impactado pela greve dos servidores do BC. Também sofreu atraso o desenvolvimento do real digital, que tem como objetivo ser a representação virtual da moeda brasileira.
O laboratório que estuda o desenvolvimento da moeda digital emitida pelo BC teve início em setembro -seis meses após a previsão inicial. Nele, diferentes casos de uso do real digital estão sendo estudados por nove projetos selecionados.
O término da fase de laboratório está previsto para fevereiro de 2023, quando a autoridade monetária irá selecionar os trabalhos mais maduros para testes pilotos.
Em seu quarto mês de operação, o laboratório começa a trazer respostas sobre o futuro desenho da moeda digital brasileira e da infraestrutura necessária para seu funcionamento. Também já estão sendo mapeados os obstáculos para que o real digital se torne realidade, como a difícil equação entre privacidade e descentralização das finanças.
“Por mais que a gente esteja falando de real digital, a gente está falando de vários reais digitais ao mesmo tempo e uma solução única integrada para isso não é simples de se fazer”, afirma Rodrigoh Henriques, diretor de Inovação da Fenasbac (Federação Nacional de Associações dos Servidores do Banco Central) e coordenador do laboratório.
A expectativa de Henriques é passar para a fase de testes pilotos no fim do segundo trimestre do próximo ano e ter os primeiros reais digitais emitidos em 2024.
Em um encontro com agentes do mercado dos criptoativos, em novembro, Fábio Araújo, coordenador do projeto de desenvolvimento da moeda digital do BC, reconheceu que o cronograma pode ser um pouco “dilatado”.
“Se estiver com tudo azeitado, provavelmente não vai estar, no fim de 2024 ou início de 2025 [o real digital] seria lançado. É muito desafiador esse cronograma. Se tudo der certo, isso acontecerá”, afirmou Araújo na ocasião.
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