CLAYTON CASTELANI E LUCAS BOMBANA
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Aplicações em renda fixa mantêm o retorno positivo a investidores com a elevação da taxa básica de juros nesta quarta-feira (16), segundo cálculos do buscador financeiro Yubb. O Copom (Comitê de Política Monetária) do Banco Central do Brasil aumentou a Selic em 1 ponto percentual, para 11,75% ao ano.
Apesar do crescimento dos juros oficiais do país, as projeções do Yubb mostram que o avanço da expectativa de inflação reduziu as possibilidades de ganhos da renda fixa na comparação com a última vez que o Copom subiu os juros, em 2 de fevereiro.
Essa desvantagem é resultado do aumento da expectativa de inflação da pesquisa Focus, do Banco Central, que subiu de 5,38% para 6,45% nesse intervalo.
A alta pressiona o rendimento real, que é o ganho após o desconto do IPCA (Índice de Preços ao Consumidor). A poupança, por exemplo, passou a ter um rendimento negativo de 0,26% ao ano. Antes, era positivo em 0,75%. O rendimento real do Tesouro Selic caiu de 2,98% para 2,70%. O CDB em bancos de médio porte passou de 5,41% para 4,01%.
Com o melhor retorno entre as aplicações simuladas, as debêntures incentivadas deixaram de ter um retorno projetado acima de dois dígitos. O rendimento real estimado passou de 10,16% para 6,42% ao ano.
Para a simulação do CDB de bancos médios, o levantamento considerou rendimento de 116% do CDI. Para o produto ofertado por bancos grandes, a taxa aplicada foi de 79%.
CDI ou taxa DI é o índice médio dos contratos de empréstimos de curto prazo negociados exclusivamente entre instituições bancárias. Apesar de tomar a Selic como referência, a taxa DI flutua diariamente, conforme as expectativas do mercado sobre o custo do crédito.
Embora as debêntures incentivadas apareçam no levantamento ao lado de produtos de renda fixa voltados a pessoas com perfil conservador para investimentos, essas aplicações são consideradas mais arriscadas.
Quem compra esse tipo de título no mercado de capitais está, na prática, emprestando dinheiro para a empresa que emitiu o papel. Em troca, o investidor recebe juros. A parte arriscada do investimento está justamente na capacidade que a empresa emissora terá de honrar o seu compromisso.
Bernardo Pascowitch, fundador do Yubb, destaca que o processo de elevação de juros, que já estava em curso no Brasil, ganha força como ferramenta de controle da inflação ainda mais pressionada devido à guerra entre Rússia e Ucrânia.
“O cenário internacional se agravou nas últimas semanas em razão da guerra na Ucrânia, o que tem impactado diretamente a commodity mais importante das economias modernas, o petróleo. Com a alta do barril, a pressão inflacionária se intensifica e renova as preocupações com a alta dos preços globais.”
Segundo Christiano Clemente, executivo chefe de investimentos do Santander Private Banking, a nova alta da Selic aumenta ainda mais a atratividade da renda fixa.
Em especial, acrescenta, no caso de títulos que ofereçam ao investidor a proteção contra a inflação, como os títulos públicos Tesouro IPCA negociados na plataforma online Tesouro Direto.
Os papéis Tesouro IPCA com vencimento para 2026 tinham rendimento de 5,62% nesta quarta-feira (16), enquanto os títulos para 2035 pagavam um juro real de 5,86%.
CRIs (Certificados de Recebíveis Imobiliários), CRAs (Certificados de Recebíveis do Agronegócio) e debêntures de infraestrutura que pagam um juro real, e são isentos de IR (Imposto de Renda), também são citados entre as preferências dentro da renda fixa neste momento.
Dados do Ministério da Economia mostram que as emissões de debêntures incentivadas alcançaram R$ 3,5 bilhões em janeiro, em operações voltadas principalmente para os setores de energia, transportes, saneamento e telecomunicações.
A remuneração média das debêntures ficou em IPCA mais 6,1% de juro real, com prazo em torno de 11 anos.
“Com os conflitos na Ucrânia e os impactos para os preços das commodities, entendemos ser prudente ter alguma proteção contra a inflação nas carteiras”, diz Clemente.
Em relação à Bolsa, o executivo afirma que é preciso que o investidor afeito às ações esteja preparado para enfrentar dias de intensa volatilidade, frente às inúmeras incertezas tanto no cenário externo, com a guerra na Ucrânia e a alta de juros nos Estados Unidos, como no Brasil, com as eleições no final do ano.
De toda forma, ele diz que tem indicado aos clientes que mantenham alguma alocação em Bolsa, em um espaço em torno de 10% das carteiras, de modo a conseguir capturar eventuais movimentos de alta nos preços.
Na carteira recomendada para março, os analistas da Santander Corretora indicaram a preferência por papéis de exportadoras de commodities, como Vale, Petrobras, Suzano e JBS. Os bancos Itaú e BTG Pactual também compõem o grupo.
“Com a alta nos preços das commodities, setores como o agronegócio acabam se beneficiando, mas nossa expectativa é a de que os papéis na Bolsa sigam sob intensa volatilidade de um modo geral”, diz Tatiana Nogueira, economista da XP.
Por outro lado, prossegue a especialista, empresas do setor de consumo e varejo, como companhias do ramo de vestuário, tendem a estar entre as mais afetadas negativamente pelo cenário de aumento dos preços das matérias-primas e dos custos para tocar a operação.
Ela lembra que a alta da Selic, e a perspectiva de que os juros permaneçam em níveis elevados ao longo de todo o ano, contrata um crescimento menor da atividade econômica e dificulta o repasse de preços aos consumidores, mesmo em um ambiente de inflação ainda pressionada.
“Desde a última reunião do Copom [no início de fevereiro], vimos uma perspectiva bem pior para a inflação, com o disparo nos preços das commodities desde que a Rússia invadiu a Ucrânia”, afirma Tatiana.
No relatório Focus, a mediana das projeções dos economistas consultados pelo BC aponta para um IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) de 6,45% em 2022, ante 5,50% quatro semanas atrás.
No entanto, a despeito da inflação mais pressionada, mesmo no setor de consumo é possível encontrar opções que devem apresentar uma performance mais resiliente que a média do mercado, diz a economista da XP, citando como exemplo as empresas farmacêuticas, bem como as de alimentação que atuam no atacado.
“Os investimentos em renda variável não devem ser deixados de lado, uma vez que são justamente em períodos de crise e de juros mais elevados que surgem grandes oportunidades”, diz Paloma Brum, analista na Toro, acrescentando que o investimento em ações precisa ser dosado conforme a tolerância ao risco de cada investidor, bem como deve ser observada a sua disponibilidade de capital no longo prazo, tendo em vista a volatilidade dos ativos de risco.
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COMO FICAM OS INVESTIMENTOS COM A ALTA DO JUROS
Rendimento em 12 meses com uma Selic de 11,75% ao ano, em %
Investimento – Rendimento bruto – Rendimento com desc. do IR – Rendimento após IR e inflação
Poupança – 6,17 – 6,17 – -0,26
Tesouro Selic – 11,65 – 9,32 – 2,7
CDB em banco médio – 13,4 – 10,72 – 4,01
CDB em banco grande – 8,74 – 6,99 – 0,51
LC – 13,98 – 11,18 – 4,45
LCA* – 11,42 – 11,42 – 4,67
LCI* – 11,77 – 11,77 – 4,99
RDB – 13,51 – 10,81 – 4,10
Debênture incentivada* – 13,28 – 13,28 – 6,42
*Investimentos isentos de Imposto de Renda
IR de 20% para aplicações com vencimento de 181 a 360 dias. Inflação anual de 6,45% prevista pelo boletim Focus de 14 de março
Fonte: Yubb