MARCELO TOLEDO
DA FOLHAPRESS
Considerada a principal praga da citricultura, o greening avançou de forma acelerada nos pomares de São Paulo principal polo produtor de laranja no mundo, atingindo quase quatro em cada dez plantas e ameaçando ainda mais a oferta global da fruta.
Um estudo do Fundecitrus (Fundo de Defesa da Citricultura), sediado em Araraquara (a 273 km de São Paulo), aponta que a doença cresceu 56% em apenas um ano no cinturão citrícola formado pelo interior paulista e pelo Triângulo/Sudoeste Mineiro.
Enquanto em 2022 ela atingia 24,42% das plantas, neste ano já está presente em 38,06%, deixando 77,22 milhões de árvores doentes de um total de 202,88 milhões de laranjeiras existentes no parque citrícola.
Em cinco regiões, a incidência passa de 50%. Limeira tem o pior cenário, com 73,87% das plantas infectadas, seguida por Brotas (68,53%), Porto Ferreira (59,65%), Duartina (55,66%) e Avaré (54,79%).
É o sexto ano seguido de crescimento da incidência da doença, mas o de maior aumento percentual de toda a série histórica, iniciada em 2008.
A doença avançou tanto porque o psilídeo transmissor das bactérias do greening o inseto Diaphorina citri, que mede de 2 mm a 3 mm tem apresentado resistência a alguns grupos de inseticidas utilizados no dia a dia da citricultura.
Além disso, citricultores não têm erradicado árvores doentes que, mantidas nos pomares, contaminam outras laranjeiras.
A doença ataca todos os tipos de citros e não há cura para as plantas contaminadas. Árvores jovens afetadas não produzem, enquanto as adultas em fase produtiva enfrentam queda prematura de laranjas e definham com o passar do tempo. Um pé de laranja começa a produzir depois de dois anos, mas só atinge carga plena perto dos quatro anos, segundo produtores.
Dos químicos mais comuns, três grupos têm se mostrado ineficientes ao combate, de acordo com Guilherme Rodriguez, engenheiro agrônomo do Fundecitrus malationa (do grupo químico dos organofosforados), bifentrina (piretroides) e imidacloprido (neonicotinoides).
“Com isso, o psilídeo continua se multiplicando nos pomares e vai contaminar as plantas. Além disso, a citricultura está com plantios mais adensados e mais irrigados, o que faz com que a planta emita mais brotos. E é bem no broto que o psilídeo consegue transmitir a doença. Nossas práticas culturais estão aumentando a chance de contaminação da planta. Lógico que isso tem de ser feito, a gente tem de cuidar muito bem do pomar, fazer com que ele vegete, produza, mas toda vegetação que sai é uma porta para o inseto conseguir contaminar a planta”, disse.
O greening foi detectado pela primeira vez no Brasil em 2004, no interior paulista, e atualmente está em todas as regiões de São Paulo e em estados como Minas Gerais e Paraná, além de outros países das Américas, como Argentina, Paraguai, México e Estados Unidos.
Na região de Limeira, a alta incidência se deve à existência de muitas propriedades pequenas, de acordo com Rodriguez. “São muitos pomares antigos, a região de Limeira é o berço da citricultura, e quanto maior a densidade de citros, maior a chance de ter alguém que não faz a coisa certa e contamina a região inteira.
O problema de Limeira é porque você tem muito produtor, é disparadamente a região que tem mais propriedades e donos de propriedades, que foram sendo divididas na família ao longo do tempo.”
Emergência – Desde a conclusão do relatório do Fundecitrus, há pouco mais de um mês, a cadeia citrícola passou a debater de forma emergencial como combater a praga, já que a incidência cresceu em todas as regiões e em propriedades rurais de todos os tamanhos.
No fim de setembro, a ABCM (Associação Brasileira de Citros de Mesa) se reuniu com o secretário da Agricultura de São Paulo, Antonio Julio Junqueira de Queiroz, para discutir o avanço da doença.
Entre os pedidos emergenciais, a associação solicitou apoio do governo para ajudar na erradicação de pomares abandonados, a elaboração de um plano preventivo para áreas de baixa incidência e investimentos para o desenvolvimento de pesquisas referentes ao controle e combate do greening.
Num vídeo divulgado pelo Fundecitrus, especialistas como o diretor do Centro de Citricultura do IAC (Instituto Agronômico de Campinas), Dirceu Mattos Junior, qualificam o problema como uma “urgência”.
“Urgência porque a citricultura tem valores econômicos, sociais, ambientais e culturais muito importantes para São Paulo”, disse.
Já o diretor-executivo da CitrusBR (Associação Nacional dos Exportadores de Sucos Cítricos), Ibiapaba Netto, afirma que o setor é e precisa continuar a ser o maior exportador de suco de laranja do mundo.
O risco de o país ver a produção futura cair devido ao greening amplia o temor global em relação à oferta do suco de laranja. Os estoques de suco no país atingiram neste ano o mais baixo patamar já registrado, com queda de 40,7% em relação à safra anterior, graças à restrição de oferta interna e a problemas enfrentados em outros países, principalmente Estados Unidos o greening foi um dos motivos, além do furacão Ian.
Os estoques disponíveis atingiram 84,7 mil toneladas, ante as 143,1 mil toneladas da safra anterior, volume muito abaixo das 765,9 mil toneladas de 2013, até aqui o ano com maior estoque na série histórica iniciada em 2012.
A previsão do Fundecitrus para a safra 2023/24 é de queda na produção de laranjas no cinturão citrícola, com 309,34 milhões de caixas de 40,8 quilos cada, ante as 316,95 milhões de caixas estimadas pelo órgão para a safra 2022/23.
Além da reunião com o governo e a divulgação do vídeo de alerta, encontros foram realizados com produtores de cidades como Olímpia, Lucianópolis e Minduri (MG), além de estudantes de Aguaí.
Em Matão, cuja região tem incidência de 17,42%, uma parceria entre órgãos públicos definiu ações de conscientização como a proposta de substituir plantas de citros e murtas (conhecida como dama-da-noite) por outras espécies frutíferas não hospedeiras do psilídeo em áreas públicas de alguns bairros.
Além do greening, há outras doenças que atingem os pomares, como cancro cítrico e CVC. O estudo do Fundecitrus mostra crescimento na incidência de cancro, presente em 19,97% das plantas, ou 6,4% mais em relação a 2022. O índice retoma tendência de aumento que tinha sido interrompido em 2021, ano de forte estiagem.
Já o CVC atinge 0,56% das plantas, índice inferior ao do ano anterior, quando a doença foi detectada em 0,80% das plantas.