CONSTANÇA REZENDE
DA FOLHAPRESS
O STF (Supremo Tribunal Federal) tem três votos a favor da correção do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço) pela remuneração da poupança a partir de 2025. O índice é mais vantajoso para o trabalhador.
O julgamento foi retomado nesta quinta-feira (9) e paralisado após um pedido de vista. O tema preocupa o governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que agora ganha tempo com a suspensão da análise do caso.
O presidente da corte, Luís Roberto Barroso, que é relator da ação, mudou seu voto. Antes, ele defendia a aplicação da correção pela poupança desde a publicação da ata do julgamento.
Segundo Barroso, não haveria tempo de adequar à regra ao Orçamento de 2024, além de citar o arcabouço fiscal em discurso. O ministro disse ter levado em conta argumentos da Caixa e do ministro da Fazenda, Fernando Haddad.
A poupança rende hoje 6,073% ao ano, enquanto FGTS é corrigido em 3% ao ano mais TR (Taxa Referencial). Seguiram o novo posicionamento os ministros André Mendonça e Kassio Nunes Marques.
Foi o ministro Cristiano Zanin, indicado por Lula ao STF, que interrompeu o julgamento. A paralisação já era esperada por Barroso.
AGU (Advocacia-Geral da União) estima que o pagamento retroativo custaria ao Tesouro R$ 660 bilhões. Além disso, por ano, o Ministério da Fazenda calcula desembolsar R$ 8,6 bilhões a mais com o FGTS.
Diante da sensibilidade da questão, o governo trabalhava nos bastidores por um pedido de vista em razão do impacto financeiro do julgamento. A AGU comemorou o voto de Barroso e a suspensão por Zanin.
A pedido de representantes da gestão Lula, Barroso já havia adiado uma primeira vez a análise do caso, do meio do mês passado para esta semana.
O governo e as centrais sindicais queriam mais tempo para chegar a um acordo e pediam ao menos 30 dias. A ideia é encontrar uma solução negociada para o impasse envolvendo depósitos dos trabalhadores.
Desta vez, Barroso negou adiamento, segundo ele, em “pedidos insistentes” feitos pela AGU (Advocacia-Geral da União).
O presidente do STF afirmou que não havia motivos para o prolongamento do debate, que já durava uma década e que tem gerado consequências negativas.
“Segundo a Caixa, são mais de um milhão de ações ajuizadas sobre essa matéria. Apenas em 2023, 637 mil processos foram ingressados na Justiça Federal”, afirmou. “A solução definitiva sobre essa ação é importante para o bom funcionamento do Poder Judiciário”, disse.
O relator também ressaltou que postergar a discussão poderia gerar um efeito potencial no planejamento de políticas públicas pelos quais os valores do fundo são importantes. O FGTS financia a habitação.
Ele disse ter recebido Haddad, Jorge Messias (AGU) e Jader Filho (Cidades) e representante da Caixa.
“Ouvi todas as considerações, examinei todos os números que trouxeram, pedi ao economista do Supremo [Guilherme Mendes Resende] que também produzisse os números, distribuí para os colegas e com base nesse conjunto novo de informações cheguei a essa modulação”, disse.
“Salto 2024 porque é o primeiro ano do arcabouço fiscal, com as circunstâncias de não ter havido a permissão dessa modificação e, a partir de 2025, todos os novos depósitos serão remunerados pela caderneta de poupança. Com isso, acho que nós corrigimos uma injustiça para frente e evitamos a existência de qualquer cadáver dentro do armário”, afirmou Barroso.
O ministro também votou pela divisão da totalidade dos lucros do FGTS como regra de transição para 2023 e 2024. Perdas passadas somente poderão ser tratadas por via legislativa ou mediante negociação entre centrais e Executivo.
Barroso frisou que a intenção do novo voto é que a medida produza o menor impacto fiscal possível.
No entanto, Zanin deu fôlego ao governo. Ele disse que pediu vista após receber informações complementares solicitadas ao assessor econômico do STF. Afirmou ter avaliado também “novos elementos” levados pela Caixa.
“Preciso ainda refletir, inclusive , à luz desses novos elementos que foram trazidos hoje ao colegiado. De forma, peço vista dos autos para melhor reflexão”, disse.
Em nota, o ministro da AGU disse que o órgão ficou contente “com a evolução do voto do ministro Luís Roberto Barroso” e mostra “que houve uma sensibilidade com a argumentação apresentada pela AGU e com os números levantados pela Caixa Econômica Federal”.
“Avaliamos que já temos uma vitória, ainda que parcial e preliminar, porque tudo indica que se caminha para a inexistência de passivo para as contas do Tesouro Nacional”, disse.
Ele acrescentou que as informações da Caixa encaminhadas ao ministro-relator mostram o impacto expressivo que eventual decisão do STF teria sobre o SFH (Sistema Financeiro de Habitação), caso prevalecesse na corte o entendimento manifestado no voto originalmente apresentado por ele.
“Estamos confiantes de que os ministros do STF estão atentos aos impactos de sua decisão sobre o SFH, sobretudo sobre as condições dos financiamentos habitacionais para as pessoas de baixa renda”, afirmou Messias.
O advogado-geral da União também disse que o pedido de vista de Zanin tem um aspecto positivo que é, “por um lado, permitir que o governo tenha mais tempo para apresentar uma proposta de acordo e, por outro, permitir que os ministros possam refletir um pouco mais sobre a melhor solução de base constitucional para um assunto tão importante para os trabalhadores”.
Os ministros devem decidir se a correção do FGTS é constitucional ou não. O pedido feito na ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) 5.090 é para que a taxa de 3% mais TR seja declarada inconstitucional.
Também sugere que ela seja substituída por um índice de inflação, que pode ser o INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor) ou IPCA-E (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo – Especial).
O FGTS é uma conta vinculada que acumula depósitos feitos pelos empregadores em favor dos trabalhadores.
O julgamento do tema começou em abril deste ano, mas foi interrompido após pedido de vista de Nunes Marques.
A proposta do governo era de garantir pelo menos a inflação para os valores depositados no fundo, o que agradaria pelo menos a parte das centrais sindicais. O problema está na correção dos valores retroativos, um desejo dos representantes dos trabalhadores, mas que o governo federal quer evitar.
Para as centrais, o pagamento dos retroativos poderia ser parcelado, o que aliviaria parte das dificuldades do governo.
O caso chegou ao Supremo em 2014, após estudo encomendado pelo partido Solidariedade e pela Força Sindical apontar perdas consideráveis ao trabalhador. Na época, o levantamento mostrou que a correção dos valores trouxe prejuízo de 88,3% ao dinheiro depositado no FGTS de 1999 até 2013.