*César Silva
A meta 6 do Plano Nacional de Educação (PNE) visa oferecer educação em tempo integral em, no mínimo, 50% das escolas públicas, de modo que atenda a, pelo menos, 25% dos alunos da educação básica. Para tal, os estudantes devem ter, no mínimo, 7 horas de atividades escolares. Mas como toda meta, existe uma grande diferença entre a expectativa e a realidade. E, neste caso, o abismo é enorme.
O Censo da Educação de 2020, elaborado pelo INEP – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, em parceria com as Secretarias Estaduais e Municipais de Educação, demonstra que apenas, 6,9% (12.278) das 178,3 mil escolas públicas brasileiras possuem entre 20% e 50% dos seus estudantes matriculados em tempo integral. Além disso, 50,7% (90.487) das escolas não possuem nenhum estudante com jornada integral.
Com mais de 47,4 milhões de crianças e jovens matriculados na educação básica em todas as suas etapas, temos apenas 5,4 milhões de matriculados na educação em tempo integral, quando o esperado seria de, ao menos, 12 milhões de estudantes. Em poucas palavras, não atingimos nem a metade da meta estabelecida.
Mas, o cenário é ainda pior quando olhamos para outro quesito: a qualidade do ensino. Os recursos educacionais e as metodologias não são inovadoras e estimulantes para os alunos, o que pode tornar o tempo integral mais prejudicial que positivo, levando ao aumentando o desinteresse e a evasão. Além disso, a formação de professores é precária, uma vez que a carreira de docência não é valorizada em remuneração e benefícios e o investimento em recursos educacionais é pouco significativo e dissociado de novas estratégias de ensino. Assim, assegurar mais tempo dos alunos nas escolas acaba soando como uma “escola punitiva”, lembrando os antigos internatos usados para assegurar o controle dos estudantes em um “espaço confinado” que se denominava “escola”.
A pauta da melhoria da oferta de educação, da qualidade do aprendizado está associada a três variáveis importantes. A primeira é a seleção dos temas, que envolve a curadoria dos conteúdos a serem desenvolvidos à luz dos interesses dos estudantes pela sua faixa etária, pelo seu espaço geográfico e pela sua realidade social que se associa a história do aluno. A segunda está relacionada à metodologia e os recursos tecnológicos vinculados à proposta de tornar o desenvolvimento aprendizado mais atrativo, mais empolgante, mais aplicável e com sentido, nos níveis do saber, do fazer e do ser. Por último, temos a qualidade do tempo destinado ao estudo. Esta é a variável mais importante e derivada das duas outras destacadas. Não basta que seja destinado um tempo longo ao estudo, ou ao desenvolvimento de competências, habilidades e atitudes, é fundamental que seja adequado em quantidade, momento e intensidade.
É preciso associar e integralizar cargas horárias, saberes existentes, novos saberes e trazer a revisão contínua de todas as etapas do ciclo de aprendizagem. Aumentar o tempo sem respectiva atenção a à forma, aos recursos e, principalmente, às necessidades é desvalorizar um insumo importante como tempo. Desde a sua concepção, a proposta de oferta de educação integral é coletiva e ampla e assim deve ser assumida por todos os agentes envolvidos no processo formativo do estudante em qualquer da sua etapa de vida.
Nesse contexto, a escola se converte em um espaço essencial para assegurar que todos tenham garantidas uma formação integral em todas as suas dimensões. A proposta pedagógica precisa ser articuladora levando em conta as diversas experiências educativas que os alunos podem viver dentro da escola e fora dela, a partir de uma intencionalidade clara que favoreça as aprendizagens importantes para o seu desenvolvimento. É importante que aconteça a partir de uma proposta para o alinhamento do quantitativo com o qualitativo, da capacidade de entender o indivíduo e com ele construir uma trajetória de desenvolvimento da aprendizagem associada a objetivos combinados, estabelecidos e assumidos, de forma ser serem, verdadeiramente, atingidos.
O Brasil está perdendo a chance de formar jovens no momento histórico em que temos mais jovens em idade produtiva do que adultos. O momento é ou formamos bem estes jovens que podem produzir e gerar renda e estimular a economia com empreendedores ou profissionais qualificados, ou, em menos de 20 anos, teremos idosos incapazes de se sustentar individualmente e que dependerão do estado como provedor. Em outras palavras, o país que foi sempre considerado o país do futuro, terá envelhecido antes de chegar a produzir renda para sustentar a sua geração de melhor idade.
* César Silva é diretor-presidente da Fundação de Apoio à Tecnologia (FAT)