REINALDO SILVA
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Dona Alminda se apressa para nos receber. Abre o portão, dá as boas-vindas e ajeita algumas cadeiras na varanda. Convida-nos a sentar. Em seguida ajuda o esposo, “seo” Sebastião, que caminha com alguma dificuldade. Tão logo se acomoda, ele começa a contar a trajetória desde que saiu de Barra de São Francisco (ES) rumo a Paranavaí, na década de 1960, até agora.
A conversa é fácil e divertida, tanto que os mais de 60 minutos parecem ter passado em 10. Em pouco mais de uma hora, os dois detalham situações adversas, falam de amigos que estenderam a mão em momentos de dificuldade e relembram como foi investir no próprio negócio e ver o empreendimento crescer e prosperar.
Nesta edição especial em comemoração aos 70 anos de Paranavaí, o Diário do Noroeste estampa um pouquinho da história de Sebastião Andrade e Alminda do Nascimento Andrade, ambos com 88 anos de idade. Casados há 69 anos, têm quatro filhos, oito netos e oito bisnetos. São eles os responsáveis pela fundação da mais antiga empresa do setor de fotografias em atividade na cidade, Foto Paranavaí.
Tudo começou em 9 de outubro de 1961, uma segunda-feira, quando o casal e dois filhos entraram em um pau de arara em busca de uma vida melhor. O destino, o Noroeste do Paraná, mais especificamente Paranavaí, cuja fama da prosperidade advinda das plantações de café viajou quase 1.800 quilômetros e chegou ao Sudeste do Brasil, onde moravam. Os quatro enfrentaram cinco longos dias de viagem e desembarcaram na sonhada terra das oportunidades no sábado seguinte, dia 14 de outubro.
Sebastião e Alminda não lembram se o dia da chegada estava quente ou frio, se choveu ou não. “O que sei é que naquele dia o sol nasceu e se pôs”, brinca o marido.
Em Paranavaí – Assim que pisaram em Paranavaí, depois de vencer a desgastante viagem, tinham outro desafio para transpor: onde ficar? Procuraram um familiar que, sabiam, morava na cidade. Foram até o endereço indicado, mas quando chegaram lá, descobriram que ele havia se mudado para Guaporema, distante mais de 60 quilômetros. À época, o percurso que hoje pode ser feito em menos de uma hora levava mais de um dia.
“Seo” Sebastião insistiu com o dono da casa, então vazia. Ficaria apenas dois dias, até que conseguisse outro lugar para acomodar a esposa e os filhos. O diálogo terminou com a afirmativa do proprietário, “mas eu tinha que sair em três dias, porque o outro morador ia chegar”. Na segunda-feira, apenas dois dias depois, encontrou uma casa e conseguiu um emprego. Ele aponta para a máquina de costura que fica na varanda. Foi equipamento do primeiro trabalho exercido em Paranavaí, como alfaiate.
Depois atuou no Banco Noroeste, mas se desentendeu com o subgerente, um homem que não era bom no trato com os companheiros. “Eu disse: se ele é homem, eu também sou. Não aceitei.” Saiu da agência bancária e resolveu buscar uma nova perspectiva em Curitiba. Foi quando a fotografia entrou na vida de “seo” Sebastião definitivamente.
Fotografia – Fazia retratos das pessoas que passavam nas ruas, “sem compromisso”, e produzia monóculos. “Você se lembra dos monóculos?”, pergunta. Respondo que sim, e ele segue o relato. Para os que não se lembram, monóculos de fotografias são pequenas peças em formato cônico com uma imagem em uma extremidade e uma lente de aumento para a visualização na outra. Ao aproximar o objeto do olho, é possível ver o retrato ampliado.
Aos poucos, o empenhado fotógrafo foi reunindo recursos e comprou equipamentos para montar o próprio laboratório de revelação. O espaço em que morava, ainda na capital paranaense, era limitado, mas suficiente para entender que ali estava seu futuro e de sua família. O ano era 1969.
Voltou para Paranavaí e se manteve firme no propósito de abrir a empresa de fotografia. Ficou preocupado com o fato de haver cinco concorrentes, mas se sentiu motivado. Começou em uma sala pequena de 7,5 metros de cumprimento por 2,5 metros de largura. Mandou fabricar refletores e ali mesmo organizou o estúdio.
As circunstâncias o levaram para outros prédios. Foram pelo menos mais três endereços até chegar ao ponto onde a empresa está até hoje, na Rua Marechal Cândido Rondon, no Centro de Paranavaí. Dos menos de 20 metros quadrados da primeira sala, passou para uma área de quase 200 metros quadrados. A primeira foto ali foi tirada pela esposa, dona Alminda, uma 3×4.
Alminda – Ela foi professora. Lecionou por três anos. Saía da Vila Operária e caminhava até depois do Rio Surucuá. Levava com ela 15 alunos, que adoravam suas aulas, garante. Precisou concluir a carreira muito antes do que imaginava, em razão de um problema na garganta – se continuasse, poderia perder a voz.
A despeito do afastamento da sala de aula, dona Alminda se manteve firme e fiel aos sonhos do marido. Cuidou dos quatro filhos, mesmo durante a temporada de “seo” Sebastião em Curitiba. Administrou a casa e a família.
Feliz aniversário – Hoje, a poucos meses de completarem 89 anos, os dois seguem lado a lado e enfrentam juntos as limitações que o avanço do tempo impõe. A empresa fundada por “seo” Sebastião agora é administrada por uma das netas, que herdou do pai a tarefa de “tocar” o empreendimento– ele, filho de Sebastião, comprou a empresa do pai no final da década de 1990.
“Seo” Sebastião e dona Alminda têm um compromisso às 15h. O relógio marca 14h45. Não vimos o tempo passar. Precisamos nos despedir. Simpáticos e acolhedores, eles se levantam e nos agradecem pela visita. Saímos, mas não sem antes colher uma mensagem de feliz aniversário para Paranavaí. “Que o povo tenha sabedoria para escolher bons governantes, que administrem bem a cidade para crescer cada vez mais.”