*Marcos Pavesi
Quando uma pedra é jogada na superfície de um lago, por exemplo, ela gera uma série de ondas em sequência, que se espalham em todas as direções e podem ser vistas por qualquer pessoa que esteja por perto do ponto em que ela caiu. Esse é um fato científico reconhecido e imutável. Uma pedra atirada sobre a água sempre terá essa consequência. Mas, assim como isso é verdade, também é fato científico que essas ondas são mais grossas, fechadas, rápidas e fortes imediatamente após a queda da pedra. Conforme as ondas se afastam do centro, elas se tornam cada vez mais finas, abertas, lentas e fracas. Por fim, acabam desaparecendo.
O mesmo acontece com um fato histórico da dimensão da pandemia de Covid-19. Significativo, suas consequências são inevitáveis em todas as direções, da saúde à economia, passando pela redução da qualidade de vida das pessoas e pelas demissões que atingem os mais diversos setores. Acompanhamos esses efeitos globais ao longo dos últimos dois anos, desde que os primeiros casos da doença foram identificados do outro lado do mundo. No entanto, assim como acontece com as ondas formadas sobre a água quando uma pedra é jogada, essas consequências também tendem a se tornar cada vez mais esparsas, até que possamos finalmente considerar que elas desapareceram.
Neste período de incertezas e adaptações, o mercado automotivo vem lutando bravamente e se preparando para uma retomada que, aos poucos, vem acontecendo, apesar das adversidades. As cadeias produtivas em todo o planeta ainda estão sofrendo os impactos de uma pandemia não totalmente controlada. Quando essa retomada começava a se tornar mais perceptível, novos eventos mundiais adicionaram novas ondas à superfície já conturbada desse lago. Com a guerra na Ucrânia, a crise de insumos que já tinha sido registrada devido à pandemia se tornou ainda mais preocupante. Os componentes são escassos e, quando existem, têm seus custos cada vez mais altos e uma logística cada vez mais complexa.
Diante de tantos desafios, as empresas que quiserem ser bem sucedidas precisarão aprender a lidar com incertezas e imprevistos, planejando e replanejando suas ações, tentando antecipar o reflexo dessas mudanças globais. Com esse plano de fundo, montadoras e concessionárias em todo o planeta foram compelidas a rever processos, enxugar quadros de funcionários, reduzir custos e, em muitos casos, paralisar suas operações. Embora esses não sejam tratamentos agradáveis para o problema, eles foram extremamente necessários.
No caso das concessionárias, os problemas globais aceleraram um processo que já vinha acontecendo. É uma realidade urgente o fato de que elas precisam renovar seus modelos de negócio, principalmente via digitalização. A barreira a ser rompida ainda é a resistência de um mercado tão tradicional. Entretanto, é notável que esse mercado está começando a entender essa necessidade. Em um momento de transição, como é o atual, é ainda mais fundamental que esses empresários se sintam seguros para fazer esse movimento. Isso só pode ser feito por meio de alianças com parceiros que efetivamente têm a experiência necessária para compor uma estratégia digital completa, especificamente desenhada para o mercado automotivo.
Para lá dos muros das empresas, que estão fazendo todo o possível para garantir uma recuperação mais robusta a partir de agora, também é preciso contar com um estofo que venha de outras áreas. Há, por exemplo, questões de foro político que poderiam dar um impulso tanto para a indústria quanto para o mercado brasileiro. Isso pode ser feito por meio da redução de impostos e encargos trabalhistas, mas também com um maior investimento em pesquisa e desenvolvimento, com a abertura de créditos para inovação e com a oferta de crédito para capital de giro.
Já sabemos que as ondas causadas pela pandemia de covid-19 estão cada vez mais fracas, finas e abertas. E, enquanto elas não desaparecem, podemos erguer barreiras para que nossa cadeia automobilística seja cada vez menos impactada por elas.