No mesmo ritmo que a pandemia se alastrou pelo mundo no último triênio, o debate sobre a saúde mental ganhou novas proporções e um olhar mais atencioso – permitindo que muitas pessoas fossem alcançadas por profissionais capazes de enfrentar problemas graves ligados à mente, e que muitas vezes estavam em segundo plano. Bem, mas o que se comprova no Dia do Psicólogo, celebrado neste 27 de agosto, é que mesmo no pós-pandemia o debate sobre a saúde mental precisa continuar acalorado para romper tabus, afinal, a proporção de pacientes que continuam com o tratamento não evoluiu.
Os novos dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) divulgados recentemente comprovam este cenário. Neste ano, a OMS realizou sua maior revisão mundial acerca da saúde mental desde a virada do século com o “Relatório Mundial de Saúde Mental: Transformando a saúde mental para todos”, e aponta que para a depressão as lacunas na cobertura dos serviços são amplas em todos os países. Mesmo em localidades de alta renda, apenas um terço das pessoas com depressão recebe cuidados formais de saúde mental e estima-se que o tratamento minimamente adequado para depressão varie de 23% em países de baixa renda para 3% em países de baixa e média-baixa renda.
“Aqui no Brasil, ao longo desses últimos anos de pandemia, realmente nós vimos uma maior procura da população por serviços ligados a saúde mental. Entretanto, da mesma forma existe essa busca, notamos também uma dificuldade dos pacientes seguirem com seus tratamentos. Essa falta, digamos, de engajamento em seguir com um psicólogo, psicanalista, ou mesmo tratamento psiquiátrico medicamentoso, mostra como a população precisa se aprofundar mais neste tema e entender que as ações ligadas a saúde mental necessitam de continuidade para se tornarem verdadeiramente eficazes”, avalia o psicanalista Sylvio Schreiner, de Londrina.
Neste cenário de descontinuidade das sessões e tratamentos, o estigma contra pessoas com problemas de saúde mental também continua latente. Mais do que isso: o relatório da ONU aponta que em todos os países são as pessoas mais pobres e desfavorecidas que correm maior risco de problemas de saúde mental e que também são as menos propensas a receber serviços adequados. Mesmo antes da pandemia de COVID-19, apenas um pequeno percentual das pessoas necessitadas tinha acesso a cuidados de saúde mental eficazes, acessíveis e de qualidade.
“Precisamos realmente fazer esforços para que os serviços ligados à saúde mental se tornem mais organizados e efetivos no Brasil. Os pacientes também têm dificuldade de seguir com os tratamentos porque não tem suporte adequado para isso. Essa mudança de chave na conduta do Estado em olhar para a saúde mental da população também é necessária, o que envolve a formulação de políticas e leis que fundamentem e aprofundem a importância do tema”, ressalta Schreiner.
Por fim, o psicanalista comenta acerca da importância da inclusão de pessoas com problemas de saúde mental em todos os aspectos da sociedade e que, também, sejam capazes de tomar decisões para romper o estigma e a discriminação que vivem. “Depois do que vivemos na pandemia e todo o debate que presenciamos acerca da saúde mental, não temos mais espaço para discriminação. Olhar para a saúde mental, definitivamente, é um pilar da sociedade e devemos cultivar para o futuro”, complementa.